VOTO DE QUALIDADE NO CARF.






A polêmica utilização do voto de qualidade pelo CARF - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, cuja finalidade é o desempate proferido pelo presidente do colegiado, tem sido severamente questionado na Justiça.

Embora os órgãos julgadores do Conselho sejam paritários, ou seja, compostos por representantes da Fazenda Nacional e do contribuinte em quantidades iguais, pelo regimento interno do órgão presidem as turmas de julgamento sempre representantes do Fisco. Assim, o voto com maior peso é sempre dado a um conselheiro representante da Fazenda.

Os críticos apontam que o modelo viola a paridade do órgão. Em março, dois processos tiveram o voto de qualidade anulado na Justiça Federal. As justificativas de dois magistrados do DF em suas decisões foi que o voto de qualidade não pode ser em sentido desfavorável ao contribuinte e nem ser utilizado de maneira inapropriada quando cabe a votação por maioria simples.

Alguns especialistas entendem que não há uma saída imediata do ponto de vista de estrutura para se alterar a forma como se dá o desempate no Carf; que em casos questionados na Justiça, tem-se interpretado de forma mais favorável ao contribuinte; que o voto de qualidade é fundamental para a manutenção da instância administrativa, já que, se for extinto, se abrirá margem para que as procuradorias da Fazenda possam judicializar demandas nas quais foram derrotadas em âmbito administrativo; e que assim, a alteração fomentaria a judicialização de demandas em desfavor do contribuinte.

Já alguns conselheiros do Carf, embora acompanhem o raciocínio dos especialistas, minimizam a polêmica de que o instituto desfavorece o contribuinte e dizem que, ao se questionar o voto de qualidade abre-se margem para que a matéria seja discutida pela PGFN na esfera judicial.

As mais recentes e polêmicas decisões do órgão, entretanto, têm levado a ações judiciais, que, regra geral, têm sentenças que determinam o cancelamento dos julgamentos do Carf que resultem como vencedora a Fazenda por voto de qualidade.

Um projeto de lei apresentado na Câmara propõe a extinção do voto de qualidade no âmbito do Carf. Proposto há dois anos, o PL 6.064/2016 aguarda parecer do relator na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público.

Para que não reste dúvida a respeito de como funciona o Carf, trata-se de um órgão colegiado integrante da estrutura do Ministério da Fazenda, tem por finalidade julgar recursos de ofício e voluntário de decisão de 1ª instância, bem como os recursos de natureza especial, que versem sobre a aplicação da legislação referente a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB). 

Seu regimento interno é estipulado pela Portaria MF 343/2015. As Seções são compostas, cada uma, por quatro Câmaras, que poderão ser divididas em até duas Turmas de Julgamento. Estas Turmas são integradas por oito conselheiros, sendo quatro representantes da Fazenda Nacional e quatro representantes dos Contribuintes.

A escolha de conselheiro representante da Fazenda Nacional recairá sobre os candidatos indicados em lista tríplice encaminhada pela RFB, e a de conselheiro representante dos contribuintes recairá sobre os candidatos indicados em lista tríplice elaborada pelas confederações representativas de categorias econômicas e pelas centrais sindicais.

Terão tramitação prioritária os processos no CARF que: I - contenham circunstâncias indicativas de crime, objeto de representação fiscal para fins penais; II - tratem de exigência de crédito tributário de valor igual ou superior ao determinado pelo Ministro de Estado da Fazenda, inclusive na hipótese de recurso de ofício; III - atendam a outros requisitos estabelecidos pelo Ministro de Estado da Fazenda; IV - a preferência tenha sido requerida pelo Procurador-Geral da Fazenda Nacional; V - a preferência tenha sido requerida pelo Secretário da Receita Federal do Brasil; e VI - figure como parte ou interessado, nos termos do art. 69-A da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, pessoa portadora de deficiência física ou mental e pessoa portadora de moléstia grave, mediante requerimento do interessado e prova da condição.

Contra as decisões proferidas pelos colegiados do CARF são cabíveis os seguintes recursos: I - Embargos de Declaração; II - Recurso Especial; e III - Agravo. 

Das decisões do CARF não cabe pedido de reconsideração. Cabem embargos de declaração quando o acórdão contiver obscuridade, omissão ou contradição entre a decisão e os seus fundamentos, ou for omitido ponto sobre o qual deveria pronunciar-se a turma.

Compete à Câmara Superior de Recursos Fiscais - CSRF, por suas turmas, julgar recurso especial interposto contra decisão que der à legislação tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra câmara, turma de câmara, turma especial ou a própria CSRF.

Cabe agravo do despacho que negar seguimento, total ou parcial, ao recurso especial.

As decisões reiteradas e uniformes do CARF serão consubstanciadas em súmula de observância obrigatória pelos membros do CARF.

Portanto, diante de todo o exposto, verifica-se que a função do Carf é de relevante importância para os contribuintes, notadamente contra os abusos da fiscalização tributária. Mas o desempenho do órgão há de ser transparente, justo, imparcial e paritário.

Uma destacada defesa da advocacia, relativamente ao Carf, dá-se no sentido de que seja criada uma única instância de julgamento, composta só por funcionários do Fisco, mas mantendo todos os direitos e garantias dos contribuintes­ como defesa oral, jurisprudência acessível e pauta pública, e sem o voto de qualidade (se acontecer, deve favorecer o contribuinte). Quando o contribuinte fosse derrotado, haveria o direito à automática suspensão da exigibilidade do débito (não seria exigida garantia) até que seja proferida a sentença judicial. E as causas originadas no Carf seriam julgadas por varas especializadas.

Outra defesa da advocacia, quiçá uma reclamação, é a de que hoje ocorre um uso indiscriminado do voto de qualidade em desfavor dos contribuintes. Tem demorado até cinco anos para um processo administrativo chegar ao fim e, depois disso, o contribuinte se vê na obrigação de apresentar garantia para discutir na Justiça débitos impagáveis. Isso também precisa mudar e melhorar, em favor do contribuinte, por óbvio.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).
 
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Comentários

  1. O famoso voto "Minerva" que sempre coloca o órgão público na frente dos demais interessados. Uma escolha errada esse de voto qualidade. Que qualidade? Somente valeria se fosse para beneficiar o contribuinte, aquele que carrega esse país nas costas de tanto imposto que paga mensalmente, durante décadas. Excelente o texto do advogado dr. Wilson Campos. Li outros textos e gostei muito, e está de parabéns (melhor, lemos, eu e minha esposa). José Carlos e Melanie Siqueira.

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