O CUSTO DA VERTICALIZAÇÃO IRRACIONAL EM BH.

O Município de Belo Horizonte vem adotando medidas um tanto quanto controversas no que respeita à aplicação de leis que privilegiam o desenvolvimento da cidade, desordenadamente, em detrimento da qualidade de vida da população e, de resto, os administradores da capital subestimam o valor imensurável do meio ambiente ecologicamente equilibrado, para as presentes e futuras gerações, cujo dever de defesa e de preservação é de competência da coletividade e principalmente do Poder Público.

Ignorar os cuidados necessários aos processos ecológicos essenciais e fazer vistas grossas  ao provimento do manejo ecológico das espécies e ecossistemas é ferir de morte os dispositivos consagrados na Constituição da República.

O Belo Horizonte de outrora já não o vemos mais. Agora, embaçando nossos olhos, uma cortina de pó cinzenta chegada das construções executadas a toque de caixa, sob o simplório pretexto de desenvolvimento e de condições adequadas para sediar uma copa do mundo de futebol.

O custo da verticalização irracional em BH cairá sobre os ombros desta sociedade já  esmagada por uma das maiores cargas tributárias existentes no planeta, sem, por infelicidade da nação, o retorno básico  da qualidade nos serviços públicos. E este peso descomunal será suportado primeiramente pelo povo desta capital.

O desenvolvimento da cidade supostamente necessário, posto que assim alegado pelo Poder Público Municipal, não pode em nenhum momento ser efetivado sem antes ter passado por uma consulta à população. É o mínimo que se espera de uma Administração Municipal obediente ao Estado Democrático de Direito, que se acredita ainda estabelecido na vida social e política do país.

As leis e os projetos de lei originados da Prefeitura de Belo Horizonte, nesta gestão, no que pertine ao assunto em tela, teimam na desobediência da Lei Maior, que dentre outras, faz incumbência ao Poder Público para que este exija, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.

A publicidade acima referida está assegurada no artigo 37, caput, da Constituição Federal e, por certo, se configura como um dos princípios básicos da Administração Pública, visto que importa o dever da União, Estados ou Municípios de darem maior divulgação possível aos atos que praticam. É, sem nenhuma dúvida, o dever de transparência das atividades administrativas dos poderes constituídos.

Os atos administrativos do Município de Belo Horizonte, por estrito acatamento ao texto constitucional precisam merecer da Administração Pública a devida divulgação, seja pela publicação nos órgãos de imprensa oficial, seja pela comunicação pessoal. Portanto, o indivíduo tem o direito de acesso aos processos que tramitam nas vias administrativas, bem como tem o direito de ser informado do que se passa junto aos órgãos públicos. 

Assim, as mudanças radicais planejadas para as ruas e bairros desta cidade não podem ser levadas a efeito sem a participação popular, sob pena de estar a Administração Pública infringindo os consagrados artigos 5º e 37 da Constituição da República.

A Lei nº 9.952/2010 e o Projeto de Lei nº 1.692/2011 ( a lei é nova e o projeto de lei já lhe faz alterações) editados pela Prefeitura de Belo Horizonte vieram para acelerar o crescimento de hotéis, hospitais e centros culturais na capital, com expectativas na realização da copa do mundo.

Ocorre, caros leitores, que na busca pelo crescimento destes setores a Administração Municipal resolve encurtar o caminho e com estes dois novos textos abre lacunas na Lei de Uso e Ocupação do Solo de Belo Horizonte e não observa a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente e do patrimônio histórico, cultural, artístico e arqueológico.

A verticalização pretendida no Projeto de Lei 1.692/2011 não encontra guarida no seio das comunidades. O desenvolvimento a qualquer custo não enseja manifestação favorável da sociedade belo-horizontina. O descumprimento de leis, principalmente as ambientais, não pode e não deve ser aceito pela população.

A implantação de prédios com altimetria desproporcional à já estabelecida na cidade, ao arrepio de uma legislação de costume, não merece ser entendida como séria. Não interessa aos moradores desta capital o surgimento de construções gigantescas que atendam a interesses particulares e desatendam a observação de contenção de excessiva concentração urbana.

Os cidadãos não desejam que uma nova lei, criada e levada ao Legislativo às pressas, faça parte de suas vidas. E muito menos que esta lei seja permeada de facilidades. Ora, senhores, o novel traz em seus registros a possibilidade de uma construção ser conjugada no mesmo terreno com outras atividades senão aquelas para as quais foi sancionada a lei. Ou seja, um edifício pode abrigar um hotel e ter outra finalidade comercial paralela. Resumindo: a finalidade descrita na lei de 2010 foi superada pela intenção impingida no projeto de lei de 2011.

Estas leis e projetos votados açodadamente, sem a devida publicidade e sem a participação popular trazem à lembrança os resquícios da ditadura. Lamentavelmente!

Assim sendo, invoquemos o Princípio da Moralidade, com aceitação respeitosa no seio da coletividade, esta já esmagada pela indignação de ver atos lesivos de maus administradores que atendem unicamente a seus interesses particulares ou a de outros de sua proximidade, afastando-se dos administrados numa manobra contrária aos valores morais.

A moralidade imposta ao administrador público não o libera da rotina ética, não o exime da responsabilidade do cargo, não o coloca acima da lei e não o desobriga das ações justas em favor do administrado. 

A conduta abusiva de administradores públicos não deve ser aceita no mundo jurídico e a imediata correção deste rumo é a via administrativa ou judicial. Daí se afirmar que os administradores atuantes fora da legalidade são portadores do abuso de poder e essa forma autoritária de governo não deve ser admitida pela coletividade.

Há muito, o grande jurista Rui Barbosa em uma de suas memoráveis oratórias já dizia: "Solta Pedro I o grito do Ipiranga. E o caboclo, em cócoras. Vem, com o 13 de maio, a libertação dos escravos; e o caboclo de cócoras. Derriba o 15 de novembro um trono, erguendo uma república; e o caboclo, acocorado. No cenário da revolta, entre Floriano, Custódio e Gumercindo, se joga a sorte do país, esmagado quatro anos por Incitatus; e o caboclo, ainda com os joelhos à boca. A cada um desses estrondos, soergue o torso, espia, coça a cabeça, "magina", mas volve à modorra e não dá pelo resto".

Rui Barbosa àquele tempo identificou o fatalismo cego que acorrentava o caboclo à inércia e hoje ainda assistimos a mesma cena, estando o caboclo de cócoras perante os poderes político e econômico, que insistem em mandar na sorte deste povo e deste país. Tristemente! 

O tempo de servidão passou. Estamos vivendo uma era de reformulação dos direitos da pessoa humana. Então, povo de Belo Horizonte, levanta a cabeça e proteste pelo respeito que lhe é devido, sem temer e sem recuar.

A transparência, a honestidade e a ética são pilares estruturais exigidos na construção da boa Administração Pública e na posse destes, melhor será a vida dos administradores e dos seus administrados.

O custo da verticalização irracional em Belo Horizonte não pode ser debitado ao cidadão e jamais ser motivo de destruição do meio ambiente sob o pretexto pálido de desenvolvimento.

Wilson Campos (Advogado).
    

Comentários

  1. Este texo foi publicado no blog ComentaMinas.Segundo a Equipe deles,um leitor pediu para publicar esse texto.Muito interessante.

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