AMEAÇAS À MATA DO PLANALTO. ALTO LÁ!

Quando uns e outros voltam à tona com o assunto que estremece os cidadãos de bem, que respeitam a natureza e por óbvio Belo Horizonte, por certo é tempo de se retomar a vigilância. Ameaçar a vida íntegra da MATA DO PLANALTO é violar um direito sagrado das comunidades locais e no geral da sociedade civilizada. E é nesse sentido que transcrevo aqui a minha participação no Seminário em defesa da Mata do Planalto realizado nesta capital.

A EXTINÇÃO DA MATA DO PLANALTO E OS IMPACTOS AMBIENTAIS PARA A CIDADE - (30/08/2011).

“Saudação às autoridades da mesa e ao público presente”.

Atendendo ao convite da Diretoria da Associação Comunitária do Bairro Planalto e Adjacências, que me sugeriu falar a respeito da posição adotada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, que objetivou avaliar o pedido de licenciamento e o impacto ambiental decorrente da implantação do empreendimento imobiliário da empresa Rossi Engenharia, a ser pretensamente construído na área da Mata do Planalto, em primeiro, falarei relativamente à Recomendação 003/11 dos senhores Promotores de Justiça do Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo. Em segundo, tentarei lhes explicar, em linhas gerais, principalmente no que toca ao Laudo Técnico elaborado pelo Engenheiro Florestal, Analista da Central de Apoio Técnico do Ministério Público, também referendado pela Promotoria de Justiça do Ministério Público de MG.

Para falarmos com justiça em defesa da Mata do Planalto, precisaríamos não apenas de 15 minutos, mas de horas, dias, por imperioso e justo. Mas, como nosso tempo é curto, vamos aos tópicos e fragmentos principais da Recomendação e do Laudo Técnico.

Na Recomendação, o Ministério Público faz algumas considerações:

1ª) Considerando as Constituições Federal e Estadual;

2ª) Considerando as leis ambientais federais, estaduais e municipais;

3ª) Considerando que o empreendimento imobiliário apresentado é empreendimento de impacto e sujeito a licenciamento ambiental;

4ª) Considerando o primeiro laudo técnico do Ministério Público que concluiu pela inviabilidade do projeto de construção, tendo em vista a legislação em vigor e os aspectos ambientais, onde se identifica a existência de cursos d’água, nascentes, áreas de preservação permanente, tipo de vegetação, floresta estacional semidecidual, ecossistema em perfeita harmonia com seu entorno;

5ª) Considerando que a implantação do projeto provocará adensamento da população, implicando em consumo maior de água e no aumento de efluentes sanitários;

e

6ª) Considerando que a implantação do projeto provocará aumento de tráfego de veículos na região, o qual já se encontra intenso;

Após todas estas considerações o Ministério Público de Minas Gerais, RECOMENDA ao Conselho Municipal de Meio Ambiente de Belo Horizonte - COMAM, que não seja concedida licença prévia ao empreendimento em questão, da empresa Rossi Engenharia, em virtude do impedimento legal previsto no artigo 11, inciso I, letra “a” da Lei Federal 11.428/2006 (que trata da proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica), pela ausência de legislação municipal que defina parâmetros urbanísticos para a ADE de Interesse Ambiental e ainda em deferência aos princípios da precaução e da prevenção de danos ao meio ambiente.

No Laudo Técnico, este já o segundo Laudo emitido pelo MPE, agora a pedido da Rossi Engenharia, que solicitou novas análises e estudos complementares, pedido este que motivou a retirada de pauta do processo de licença prévia que seria votado no dia 08/06/2011. Então, este novo Laudo Técnico, com a devida vênia do Ministério Público de Minas Gerais, a meu ver, elimina a possibilidade de outra compreensão, senão a de que A MATA DO PLANALTO DEVE SER PRESERVADA, POR SE TRATAR DE VEGETAÇÃO COMPONENTE DO BIOMA MATA ATLÂNTICA, SITUADA EM ÁREA URBANA E DENTRO DE UM ECOSSISTEMA COM PRODUÇÃO ECOLÓGICA SATISFATÓRIA AO MEIO.

Particularmente, eu gostaria de destacar que vem a calhar aqui, o percuciente posicionamento da Central de Apoio Técnico do Ministério Público, ombreando-se à vanguarda da recomendação das Promotorias de Justiça anteriormente aduzidas.

Portanto, faz-se necessária a reprodução de alguns trechos do laudo técnico, principalmente quanto às argumentações da Rossi Engenharia, no sentido de que a vegetação existente no local do empreendimento não se trata de bioma Mata Atlântica, sendo a espécie dominante o Eucalipto (Eucaliptus sp) em área substancialmente degradada (estas são alegações do representante da Rossi Engenharia).

Tomei a liberdade de separar alguns trechos importantes do Laudo Técnico que derrubam as alegações da Rossi Engenharia. Vejamos o que diz o Laudo Técnico, da forma como está no documento, ipsis literis:

“Inicialmente cumpre reiterar a afirmação do parecer anterior que a cobertura vegetal onde se pretende a implantação do empreendimento é classificada como sendo do bioma Mata Atlântica”.

De se frisar, ainda, o combate da polêmica arguida pelo empreendedor, assim refutado pelo MPE:

“Neste caso, as espécies florestais do gênero Eucaliptus sp não carecem de serem suprimidas, pois contribuem para as interações ecológicas do local, desempenhando funções benéficas ao meio, deixando de serem vistas como plantas daninhas”.

Não destoa o parecer quando perfila pelo bom senso do respeito à longevidade da natureza:

“A presença das espécies exóticas, 50 anos após a implantação, e ainda propiciando um sub-bosque de espécies florestais nativas, não deve ser considerada característica de um ambiente degradado, não se aplicam ao contexto analisado e, portanto, não servem como justificativa para a supressão das espécies exóticas ali presentes”.

Noutro norte, não se esquiva o laudo à interpretação legal, procedendo legitimamente ao chamamento das esferas institucionais, uma vez que o representante da empresa informa que o projeto foi avaliado por órgãos administrativos e recebeu por unanimidade, manifestação favorável à concessão de licença prévia.

Ora, mais uma vez o laudo técnico discorda do empreendedor e argumenta da seguinte forma:

“Posteriormente, relaciona os órgãos que se manifestaram favoráveis à concessão da licença prévia, não constando nessa relação o órgão ambiental estadual competente, conforme dispositivos legais abaixo mencionados. Tais dispositivos mencionam a necessidade de anuência e autorização prévias do órgão ambiental estadual competente fundamentadas em parecer técnico. A Lei 11.428/2006 dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica e dá outras providências e os artigos 14 e 31 tratam da necessidade de anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico.

Mais adiante o laudo arremata, de forma imprescindível ao deslinde da controvérsia, em um relato técnico que prospera como melhor sinônimo de Justiça:

“Durante a vistoria foi possível constatar que houve a implantação de uma floresta de Eucaliptus sp que, depois de implantada e desenvolvida, proporcionou o desenvolvimento de uma floresta de espécies nativas típicas do bioma Mata Atlântica em seu sub-bosque, estando essa floresta hoje em estágio médio de regeneração natural. Essa floresta encontra-se tão bem desenvolvida que dificulta, hoje, o trânsito de pessoas em seu interior, constituindo um ambiente de refúgio para a fauna e de prestação de outros serviços ambientais que inviabilizam a supressão da vegetação para os fins pretendidos”.

Como visto, senhoras e senhores, em um primeiro momento o Ministério Público de Minas Gerais recomendou a não concessão de licença prévia para a implantação de empreendimento imobiliário na área da Mata do Planalto. E, agora, reiteradamente a Central de Apoio Técnico do MPE, emite parecer contrário à supressão da Mata do Planalto e ao licenciamento pretendido.

Para falarmos em defesa da Mata do Planalto, poderíamos ainda fazer uso do Plano Diretor de Belo Horizonte (Lei 7.165/96); da Lei de Uso e Ocupação do Solo de Belo Horizonte (Lei 7.166/96 alterada pela Lei 9.959/2010); da Lei Orgânica do Município de Belo Horizonte; do Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001); da Lei de proteção do Bioma Mata Atlântica (Lei 11.428/2006); da Constituição Federal; dentre outros textos legais que tratam dos direitos difusos à cidade sustentável e ao meio ambiente urbano equilibrado, da responsabilidade da União, Estados e Municípios, da proteção e preservação das áreas verdes.

Isto posto, caso teimosamente insistam na transgressão das leis e no não acatamento às recomendações e pareceres do Ministério Público, e, ainda, decidam contrariamente ao desejo e vontade soberanos da sociedade, os agentes públicos responsáveis pelo ato de improbidade administrativa, que dêem causa a danos ao meio ambiente natural e violem os princípios da administração pública, em especial, o Princípio da Legalidade, responderão em Juízo pela prática irresponsável e pelo crime cometido.

Assim, vejamos quanto ao crime previsto no artigo 67 da Lei 9.605/1998 (que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências):

“Art. 67 - Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público:

Pena – detenção de um a três anos, e multa”.

Desta forma, a expedição irregular de licenciamento ambiental, ignorando as normas vigentes e, por consequência, desrespeitando o ordenamento jurídico, torna réu o agente político, na medida em que a Promotoria de Justiça pode e deve ajuizar Ação Penal contra todas as pessoas que promoverem a concessão ilegal de licença ambiental, na proporção de sua culpabilidade e responsabilidade, por destruírem vegetação do Bioma de Mata Atlântica em estágio avançado ou médio de regeneração.

Neste sentido, o mesmo ilícito constituído em danos causados ao meio ambiente, autoriza o MPE ajuizar Ação Civil Pública Ambiental, com Pedido de Liminar, contra o Município de Belo Horizonte, na pessoa de seu representante legal, o Prefeito Municipal, por concessão de licença ambiental em desrespeito ao Princípio da Proteção, da Precaução ou da Cautela, basilar do Direito Ambiental.

Outro remédio jurídico que pode ser utilizado na defesa do meio ambiente é o Mandado de Segurança Individual ou Coletivo, dependendo da opção de legitimidade ativa que se adote. No caso de Coletivo, pode ser impetrado por partidos políticos, sindicatos, entidades de classe e associações. Tanto em um quanto no outro, o objetivo é a proteção de direito líquido e certo, no que diz respeito ao meio ambiente.

Outras medidas judiciais poderão ser adotadas, como Ações Populares e Ações Ordinárias, conforme a responsabilidade civil arguida, para reparação de dano, obrigação de fazer ou não fazer. E tudo, por óbvio, com amparo e na segurança da Lei, da Justiça e do Direito.

Os danos morais consistentes na perda de valores ambientais coletivos não podem ser esquecidos e são irrenunciáveis, pois apenas em assim procedendo, os administradores públicos pensarão duas vezes antes de autorizarem a destruição do meio ambiente. Este instrumento de indenização, na eventualidade de conflitos, deve ser requerido nas lides jurídicas ambientais, dada a sua importância para o chamamento das responsabilidades daqueles que brincam de agentes públicos ou políticos, em detrimento do sofrimento da coletividade, do desequilíbrio do meio ambiente e da degradação da qualidade de vida.

Portanto, senhoras e senhores, a mobilização das comunidades deve ser mantida e o espírito cívico desperto, para que na calada da madrugada os portadores do poder, seja político ou financeiro, não silenciem a nossa voz e não nos envergonhem perante nossos filhos, posto que seja para eles a nossa luta pela preservação total e absoluta da Mata do Planalto e de todas as áreas verdes, ecologicamente satisfatórias e amparadas por Lei, por Justiça e por Direito.

Vem-me agora à lembrança o maior jurista brasileiro de todos os tempos, o advogado brilhante, o pensador político, o constitucionalista e intelectual de primeira linha RUI BARBOSA. E o grande idealista Rui Barbosa disse:

“O QUE É O BRASIL:

O Brasil não é isso. É isto. O Brasil, senhores, sois vós. O Brasil é esta assembléia. O Brasil é este comício imenso de almas livres.

Não são os comensais do erário. Não são as ratazanas do Tesouro. Não são os mercadores do Parlamento. Não são as sanguessugas da riqueza pública. Não são os falsificadores de eleições. Não são os compradores de jornais. Não são os corruptores do sistema republicano.

Não são os oligarcas estaduais. Não são os ministros de tarraxa. Não são os presidentes de palha. Não são os publicistas de aluguel. Não são os estadistas de impostura. Não são os diplomatas de marca estrangeira.

São as células ativas da vida nacional. É a multidão que não adula, não teme, não corre, não recua, não deserta, não se vende.

Não é a massa inconsciente, que oscila da servidão à desordem, mas a coesão orgânica das unidades pensantes, o oceano das consciências, a mole das vagas humanas, onde a Providência acumula reservas inesgotáveis de calor, de força e de luz para a renovação das nossas energias.

É o povo, em um desses movimentos seus, em que se descobre toda a sua majestade”.

Assim sendo, senhoras e senhores, como dito por Rui Barbosa e como povo digno que somos, não temamos, não recuemos e vamos em frente na defesa firme de nossa convicção de estarmos abraçados a uma causa justa.

A nossa manifestação já se prolonga, num misto de Advocacia, Cidadania e emoção pessoal, neste ponto já inseparáveis, diante da importância do tema e do alto significado para todos nós, que é a Mata do Planalto, que gentil e gratuitamente envolve e embala em seu manto natural, a convivência harmoniosa da fauna, a exuberante e forte presença da flora, as nascentes de águas cristalinas, a purificação do ar, a melhoria do microclima do ambiente, a redução da velocidade do vento, a natural permeabilidade do solo, a rica biodiversidade presente e constatada, o tranquilo refúgio dos pássaros e a qualidade de vida tão humanamente necessária nos dias de hoje.

Para encerrar, invoco o artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil e lhes asseguro que, como Advogado, brasileiro, cidadão, contribuinte, munícipe e morador do Bairro Planalto, estarei com vocês, na certeza de estarmos buscando com esta defesa in continenti da Mata do Planalto, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

MUITO OBRIGADO!!!

Wilson Campos (Advogado).

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