PLANOS DIRETORES REGIONAIS DE BH.

Na realidade, o Brasil nunca teve uma política de desenvolvimento urbano até o advento da Constituição da República de 1988, o que incomodava muito pelo tratamento solitário e desigual dado aos fatores sociais, econômicos e ecológicos. Atualmente não se considera esta possibilidade isolada, uma vez que existe entre estes fatores um vínculo e este torna possível a ideia de desenvolvimento sustentável.

A Lei 10.257, de 10/07/2001 (Estatuto da Cidade), regulamentou os artigos 182 e 183 da Constituição e entregou ao Município a execução da política de desenvolvimento urbano, bem como lhe entregou ainda o dever de garantir o bem-estar dos seus habitantes e cuidar das funções sociais da cidade e da propriedade, nos seus declarados direitos, desde que respeitados os fins ético-sociais das comunidades.

Os Planos Diretores Regionais de Belo Horizonte que visam teoricamente direcionar o desenvolvimento das regiões do Barreiro, Centro Sul, Leste, Nordeste, Noroeste, Norte, Oeste, Pampulha e Venda Nova não tratam objetivamente de um ponto crucial e de suma importância para a sociedade nos dias de hoje: o exercício da cidadania ambiental, que não pode ser dissociado do meio ambiente urbano e da sua inerente qualidade de vida.

Da forma como estão divulgando os Planos Diretores Regionais, fica caracterizada a truculenta gestão da cidade por pessoas pouco afeitas à liberdade democrática, apenas interessadas na prevalência de seus métodos, contrariamente aos anseios da sociedade.

As Secretarias encarregadas de apresentarem à população os objetivos  dos Planos Diretores Regionais, ao invés de o fazerem paulatinamente, insistem nas assertivas nada convincentes e sempre rebuscadas de termos técnicos, açodadamente, com isto causando pouca compreensão do que realmente pretende a Administração Municipal para a cidade.

Quando as comunidades interpelam os apresentadores, estes sempre tergiversam e deixam sem explicações temas importantes para as diversas áreas da cidade. E quando as lideranças exigem maior transparência, como resposta recebem comentários jocosos de que estão tumultuando. A participação democrática pedida pela sociedade é chamada de tumulto por alguns "colaboradores" da claque patética da apresentação.

As respostas para pontos polêmicos e principalmente para aqueles relativos à verticalização desordenada, supressão de áreas verdes e adensamento são mais que exigíveis pela sociedade. Para tanto, se apresenta como dever da Administração Municipal prestar de imediato este trabalho e responder com eficiência e sem estrelismos.         

O caráter de obrigatoriedade do Plano Diretor, que envolve o Poder Público Municipal e por óbvio o Prefeito, reveste-se de considerável seriedade, pois é dele que surgirá a possibilidade da condição digna de vida dos cidadãos. Daí a Administração Municipal e a Câmara de Vereadores terem o encargo de garantir a participação das comunidades e a transparência na elaboração e na implementação do Plano Diretor.

O papel das comunidades locais é o de severa vigilância sobre os rumos do Plano Diretor e a sua aplicação, não deixando entregue à boa vontade de quem o propôs a execução dos planos, programas e projetos em geral. O acompanhamento e controle é inegável direito do cidadão.

A falta de clareza somada aos curtos diálogos entrecortados por rudeza dos administradores públicos desacredita os Planos Diretores Regionais assim como estão, haja vista que o exercício da cidadania não é apenas uma virtude social e política da pessoa humana, mas também a sua força que impulsiona a sociedade para frente, mediante o estabelecimento de foros de negociação e grupos de pressão autênticos e legítimos, quando se sobressai a importância dos movimentos sociais.

O destaque dado pelo Poder Público Municipal, pontualmente, no que se refere à verticalização, outorga onerosa, operação urbana simplificada e operação urbana consorciada, não merece, em absoluto, o aval das comunidades, mesmo porque os recursos nunca voltam para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos e jamais são aplicados na defesa intransigente do meio ambiente sadio e, antes do mais, não são direcionados a prevenir e evitar, dentre outros efeitos indesejáveis, a deterioração das áreas urbanizadas, a poluição e a degradação ambiental.

Não mais são admissíveis os acobertamentos de aparência de legalidade, das licenças e autorizações que apenas visem a verticalização sem a preocupação com as vítimas do dano ambiental. Daí a necessidade da busca de instrumentos legais mais eficazes, além dos já postos no Direito Civil.

O Direito Penal, a partir de meados do século XX, passou a cuidar também do meio ambiente, que coerentemente cresceu no conceito de valores da sociedade contemporânea, compondo o rol de direitos fundamentais reconhecidos como de terceira geração e inseridos nos textos constitucionais democráticos.

Onde houver risco de dano ao patrimônio ambiental, não resta dúvida de que todas as esferas de responsabilidade devem intervir de modo a evitar a sua concretização, ou seja, faz-se necessária a garantia de tutela integral do bem jurídico, através da legislação civil, administrativa ou penal.

Segundo o Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Herman Benjamin, "se o Direito Penal é, de fato, ultima ratio, na proteção de bens individuais (vida e patrimônio, p. ex.), com mais razão impõe-se sua presença quando se está diante de valores que dizem respeito a toda a coletividade, já que estreitamente conectados à complexa equação biológica que garante a vida humana no planeta" 

Mediante o exposto, estando o ambiente elevado à categoria de bem jurídico essencial à vida, à saúde e à felicidade do homem, integra-se, em verdade, em um conjunto de elementos naturais, culturais e artificiais, de modo que possibilite o seguinte detalhamento: meio ambiente natural (constituído pelo solo, a água, o ar atmosférico, a flora, a fauna, enfim, a biosfera); meio ambiente cultural (integrado pelo patrimônio artístico, histórico, turístico, paisagístico, arqueológico, espeleológico, etc.); e meio ambiente artificial (formado pelo espaço urbano construído, consubstanciado no conjunto de edifícações e nos equipamentos públicos: ruas, praças, áreas verdes, ou seja, todos os logradouros, assentamentos e reflexos urbanísticos, caracterizados como tal).

Todos esses elementos estão definitivamente protegidos pelo Direito Penal, como se vê da nova arquitetura tipológica da Lei 9.605/1998 - base do ordenamento ambiental penal. 

Nos delitos ambientais, o sujeito passivo direto será sempre a coletividade, por ser o bem ou o interesse tutelado considerado de uso comum do povo, segundo o disposto no artigo 225 da Constituição Federal.   

E para encerrar, embora seja este um assunto para muitas páginas, de se ressaltar em alto e bom som que o Ministério das Cidades precisa sair de sua inércia e ao público dizer a que veio. Afinal, a sua competência ministerial atribuída pela Lei 10.683/2003 vai no mesmo sentido do Estatuto da Cidade, numa jornada amistosa de proteção aos requisitos básicos de qualidade de vida em nossas cidades, sob pena de aplicação da Lei 9.605/1998 na tutela penal do ordenamento jurídico ambiental.

Wilson Campos (Advogado).

(Este artigo mereceu publicação do jornal HOJE EM DIA, edição de 03/06/2012, domingo, pág. 13).
 

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