O IMPEACHMENT.

E o respaldo do Judiciário?

É certo que o governante não é senhor do poder que exerce, mas apenas um representante do povo, ao qual deve prestação de contas. O abuso de poder é punível. Todavia a punição do governante infrator é função do Poder Legislativo, dentro do processo da democracia representativa, cuja missão é sancionar a conduta da autoridade pública, destituindo-a do cargo e impondo-lhe pena de caráter político, ou seja, impingindo-lhe o impeachment.

Criação inglesa, do século XIII, o impeachment fundava-se inicialmente em crime, e seu objetivo era o afastamento definitivo da autoridade acusada, além da aplicação de pena corporal. Caiu em desuso essa prática, e o impeachment perdeu importância no decorrer do século XVIII, quando se estruturou o parlamentarismo.

No Brasil, o impeachment vem desde a Constituição de 1824. Todas as constituições republicanas o previram em medidas políticas muito próximas. A maior parte da doutrina brasileira entende que o impeachment é eminentemente político. Entretanto, a tese de que possui natureza penal conta com simpatizantes de elevado conhecimento jurídico, o que também ocorre quando o instituto é entendido como de natureza mista. Tais desencontros forçam uma análise pontual do tema antes de formar convicção.

Em primeiro lugar, o que mais se presencia na política brasileira são os comportamentos politicamente indesejáveis. Em segundo, a evidência de que a destituição deve ser acompanhada da inabilitação. E, por último, a garantia da ampla defesa, observando-se um rito jurídico legal. No entanto, quando se sabe que a Câmara dos Deputados deve examinar a procedência da acusação de forma política, enquanto o Senado deve agir pelo exercício do julgamento, essa prática se torna controversa e discutível, posto que retira do Poder Judiciário o caráter legítimo de decidir o que seja ou não crime de responsabilidade à luz do ordenamento jurídico vigente. Ora, a lição da Lei 1.079/1950 (Lei do Impeachment), que mede com régua milimétrica a responsabilidade criminal da autoridade acusada, bem como o artigo 85 da Constituição, são meios aplicativos da seara jurídica, e não política.

Via de regra, o impeachment é alavancado por motivações políticas, muitas delas por antagonismos partidários e interesses pessoais. As opiniões públicas são sublevadas, e as decisões judiciais, preservadas. Melhor dizendo, veja-se o caso do ex-presidente Collor, que, afastado da Presidência da República pelo Congresso, foi absolvido pela Suprema Corte. Portanto, não resta dúvida de que o julgamento do impeachment pelo Congresso é mais político do que jurídico.

No presente momento, para o processo ter legitimidade, melhor esperar as apurações da Polícia Federal, do Ministério Público e do Supremo Tribunal Federal, respeitar o contraditório e, depois, juridicamente, apelar para o dolo seguido da culpa, com requerimento do impeachment, mas sob os auspícios do Poder Judiciário e com o necessário respaldo popular.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG.

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de quarta-feira, 18/03/2015, pág. 23).

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