ESTELIONATO ELEITORAL, IMPROBIDADE E PREVARICAÇÃO ANDAM DE MÃOS DADAS.

 

Por certo que você, em algum momento da sua vida, deparou com alguém que prometeu e não cumpriu uma tarefa, um compromisso ou uma obrigação de fazer. Na política, lamentavelmente, esse fato ocorre às largas. Mas isso é um crime ou um fato social? Enquanto você pensa, permita-me enveredar por caminhos que facilitarão uma conclusão ou quase isso. Vejamos:      

O direito precisa acompanhar a dinâmica da vida social. A mudança no perfil da sociedade não pode restar à margem do direito. Se o ordenamento jurídico pátrio tipifica como crime o furto de um pote de manteiga e condena à prisão a infratora, fato verídico, também tem o dever legal e moral de tipificar como crime o estelionato eleitoral e condenar e mandar prender os culpados.

No mundo contemporâneo, não há mais como suportar situações inconcebíveis e absurdas de desproporção entre o delito e a resposta. No sentir da sociedade, mais grave do que cometer o furto de um pote de manteiga é cometer estelionato eleitoral. Porém, como o direito deve ser aplicável a todas as pessoas, sem distinção, aquele que se achar vítima de alguém deve buscar o poder do Estado para que o culpado seja punido e os prejuízos ressarcidos, independentemente da significância ou insignificância do dano.

Vejamos, então, o caso gravíssimo do estelionato eleitoral, que consiste na prática do candidato a cargo legislativo ou executivo, mediante pleito popular, fazer promessas durante campanha eleitoral, e, quando eleito, deixar de realizar o que prometeu, caracterizando dessa forma a má-fé na obtenção dos votos. Ou seja, trata-se de propaganda enganosa, fraude, falácia e ludibriação, posto que os ditos candidatos eleitos com uma determinada plataforma ideológica, depois da eleição, adotam um programa de cunho absolutamente contrário.

O estelionato eleitoral se configura ainda como aquele ato praticado pelo candidato que, além de não cumprir suas promessas, comete outros crimes contra o patrimônio público, devendo responder civil e criminalmente, e restando sujeito a perder a vaga para o próximo candidato com maior número de votos. Daí a necessidade da criminalização do estelionato eleitoral, por força de lei, como forma de combater a mentira e a desonestidade de políticos quando em campanha eleitoral. A mesma promessa atraente que rende votos, caso não cumprida, poderá render cassação do mandato, inelegibilidade e punição penal.

Enquanto projetos de lei contra o estelionato eleitoral dormitam nas gavetas do Congresso, o tema causa preocupação à sociedade, haja vista a nuvem de incertezas que paira sobre as cabeças dos eleitores, seja pela falta de lei concreta que coíba, pela perda de referencial da pena exigível ou pelo atentado violento em face dos princípios da administração pública.

Em que pese não existir ainda a conduta criminosa tipificada, é razoável afirmar que o estelionato eleitoral pode configurar concreta e efetivamente ato de improbidade administrativa, com grave ofensa ao artigo 11 da Lei 8.429/1992, ficando o responsável sujeito ao ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, entre outras penalidades.

Art. 11 - Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;

IV - negar publicidade aos atos oficiais;

V - frustrar a licitude de concurso público;

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.

VIII - descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas. (Vide Medida Provisória nº 2.088-35, de 2000) (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência)

IX - deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

X - transferir recurso a entidade privada, em razão da prestação de serviços na área de saúde sem a prévia celebração de contrato, convênio ou instrumento congênere, nos termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. (Incluído pela Lei nº 13.650, de 2018).  

Assim como o voto representa um instrumento poderoso nas mãos do eleitor, a depender do caráter de quem faz o uso, também o exercício da cidadania tem valor inestimável, posto que é uma ferramenta importantíssima na valorização dos indivíduos, que, cada vez mais, reivindicam o direito a uma administração pública sob controle social e a uma gestão compartilhada e participativa entre políticos e cidadãos. Ou seja, a sociedade exige uma gestão horizontalizada, com participação popular na gestão da coisa pública.

De nada serve ou a nada se presta uma pessoa que ingressa no setor público para tão somente se servir dele. A cidadania não admite e não aceita mais isso, uma vez que a nova tendência é que essa pessoa sirva aos propósitos da população. Ora, a administração pública requer gestão com resultado social positivo, responsabilidade fiscal, qualificação do agente público, transparência, eficiência e probidade. 

Nesse sentido, notemos o disposto no art. 319 do Código Penal, que trata da prevaricação:

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.  

Destarte, a sociedade brasileira não aceita mais a nociva política do estelionato eleitoral (prometer e não cumprir), assim como recrimina fortemente a improbidade administrativa, a prevaricação, os demagogos, os oportunistas, os apadrinhados da velha política e os premiados com os virulentos cabides de empregos. A população brasileira não aguenta mais sustentar políticos erráticos e militantes sanguessugas do serviço público. A rigor, os candidatos em campanha que fazem promessas, caso eleitos, têm a obrigação de cumpri-las, e basta de estelionato eleitoral, improbidade e prevaricação.

Mas, afinal, tratamos aqui de um crime ou de um fato social ao nos debruçarmos sobre a questão fraudulenta do estelionato eleitoral? Muito bem, você decide, ao seu talante, pelo menos enquanto os legisladores não aceleram o trâmite da tipificação criminosa, do logro, do ardil, da artimanha em enganar outrem.

Ao meu sentir, assim como a improbidade administrativa é um ilícito civil sujeito a sanções e a prevaricação é um crime sujeito a pena de detenção, o estelionato eleitoral também deveria ter definição legal tipificada.    

Em tempo, alguém sabe dizer por onde anda a proposta do Projeto de Lei 4.523/2012, que altera o art. 171 do Código Penal para tipificar como crime o estelionato eleitoral?

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG).

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Comentários

  1. Meu dileto Dr.Wilson Campos, o estelionato eleitoral é o roubo de um sonho,porque o danado do político vem e te promete melhorias para seu bairro, sua rua, sua comunidade. Depois não faz nada e se você cobra ele enrola e enrola e passamos 4 anos e eles não fez. E volta na maior cara de pau com a mesma promessa e pedindo votos.Eu já vi caso de candidato ser colocado pra correr quando apareceu de novo par pedir voto sem cumprir o que prometeu antes. Pra mim é crime isso e devia cassar o sujeito e processar pelo prejuízo que causou nas pessoas. Certo ou errado Dr. Wilson???? Abração do seu leitor Camilo Alvarenga.

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  2. Em todo lugar tem estelionato eleitoral pois os candidatos prometem e depois de eleitos não cumprem. Aqui em BH tem aos montes - na prefeitura, na câmara de vereadores, na assembleia legislativa...- ou melhor dizendo tem gente que depois de eleito dá uma banana para o povo e volta na próxima eleição com a mesma conversa mole e o pior é que tem eleitor inocente que ainda vota nos picaretas que não passam de estelionatários eleitorais, prevaricadores e improbos. É isso e é assim que vejo e penso, porque ninguém aguenta mais tanta mentira. Chega meu Brasil de mentirosos e falsos. Nas eleições vamos votar em gente que pensa em gente, no povo e vamos cobrar o que foi ´prometido de todos. Abração e gratidão dr. Wilson Campos por seus artigos cheios de verdade, honestidade e patriotismo pelo nosso Brasil amado. Sandra Maire.

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  3. Estelionato eleitoral, prevaricação e improbidade administrativa são crimes sim,não dentro da pobre e incapaz lei penal, mas dentro dos corações dos brasileiros enganados por esse sistema corrupto e podre que explora o povo, ano após ano. A vingança tem de ser nas urnas. Vamos nos vingar nas urnas pelo amor de Deus minha gente. Eu sou formado em dois cursos superiores e me sinto um inútil diante de tanta canalhice que esses cabras cometem nesse Brasil. Vingança nas urnas é a nossa resposta a esses pilantras que envergonha nosso povo. E ao Dr. Wilson Campos só meus cumprimentos pelo excelente texto como sempre escrito com primor. At. prof. Sinval M. R. Nogueira.

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