STJ ALEGA QUE PROCESSOS VÃO TRIPLICAR COM A REFORMA TRIBUTÁRIA.
A Reforma Tributária está preocupando os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), especialmente diante da possibilidade de a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), criados com a reforma tributária (EC 132/2023), triplicarem o contencioso judicial. A conclusão consta de um relatório produzido por um grupo de trabalho da Corte.
Além da preocupação com o provável grande aumento do contencioso judicial, o relatório também traz críticas à proposta da Advocacia-Geral da União (AGU) e do Ministério da Fazenda de unificação do contencioso judicial dos novos tributos em um único órgão, além da criação de dois novos tipos de ação, que seriam ajuizados diretamente no STJ.
No entendimento dos ministros, a preocupação e as críticas se dão em razão dos desafios administrativos e orçamentários intransponíveis e das dificuldades que poderão surgir para o contraditório e a ampla defesa, além de sobrecarregar a Corte.
Para alterar o cenário descrito no documento, os ministros do STJ propõem três mudanças: i) unificar a cobrança de IBS e CBS; ii) fixar um limite de alçada para a propositura de execuções fiscais; iii) e exigir que seja feito o requerimento administrativo antes do acesso à Justiça.
O grupo de trabalho que elaborou o relatório foi criado em 2024, sendo composto pelos ministros Regina Helena Costa e Paulo Sérgio Domingues, além do juiz federal Daniel Marchionatti Barbosa. O texto final foi aprovado pelos ministros da 1ª Seção do STJ, responsável pela análise de casos de Direito Público.
Um dos motivos pelos quais o STJ aponta o aumento no contencioso é o fato de que cada fato gerador dará direito a três créditos tributários, pela União, estados e municípios. O texto considera que a legislação não avançou o suficiente na unificação da cobrança e a previsão de integração é parca e depende de acordos bilaterais. Aponta, ainda, problemas com a fragmentação e multiplicação de execuções fiscais, e da multidão de sujeitos passivos nas ações de iniciativa dos contribuintes.
O relatório considera que haverá incremento na matéria tributária em 35%. De forma geral, o STJ projeta ao menos 28,7 mil novos casos de IBS e CBS, o que representa aumento de 10 mil casos e impacto em 2% na distribuição.
Apesar do baixo incremento no número total de novos casos, o relatório diz que é esperado que o STJ tenha grande demanda por decisões colegiadas, que resolvam os novos conflitos de interpretação sobre os novos tributos, além de uniformizar a jurisprudência em todo o país. Ao julgar a matéria em colegiados, a Corte evita decisões monocráticas e, consequentemente, entendimentos individuais e diversos sobre o mesmo tema.
Outro foco de projeção no relatório trata das execuções fiscais, especialmente se não houver integração e os litígios sobre CBS e IBS forem separados. No cenário em que sejam executadas em separado, por cada ente credor, no segmento da justiça competente, estima-se que haverá incremento em 26% de litígios, ou aumento em 412.584 processos. O número projetado de execuções com os novos tributos ultrapassa 680 mil.
Por segmento, o relatório aponta possível aumento na Justiça Federal na ordem de 107%, frente a 16% na Justiça Estadual. “Esse seria o pior cenário, desfavorável para todos os segmentos envolvidos”, conclui.
Com relação às ações propostas pelos contribuintes contra a Fazenda (ações antiexacionais), o STJ considera a possibilidade de 236.124 casos, o que representa aumento de 9%. Separados por segmento da Justiça, seria: 5% a mais na Justiça Federal e 11% na Justiça Estadual.
Enfim, percebe-se que o STJ está muito preocupado com o volume de trabalho e pouco com a burocracia que será gerada. Mas tudo ainda depende de adequação e de como se dará o processo de acompanhamento fiscal dos novos tributos. Por outro lado, o STJ deveria se preocupar também com a segurança jurídica dos contribuintes e com a desburocratização e a celeridade processual para os jurisdicionados. Justiça econômica e célere é a ideia do contribuinte.
As conclusões do grupo de trabalho do STJ foram as seguintes:
1 – A reforma tributária é um importante marco para a justiça fiscal e para o aperfeiçoamento do sistema tributário nacional. No entanto, até o momento, a atenção às implicações no contencioso judicial é insuficiente. A reforma tributária tem potencial de elevar o contencioso judicial tributário a parâmetros inéditos, esgotando os recursos do Poder Judiciário.
2 – A EC n. 132/2023 e os projetos de lei complementar em tramitação para sua regulamentação (PLPs 68/2024 e 108/2024) não dão resposta suficiente à questão da integração do contencioso judicial tributário. As disposições constantes dos projetos de lei complementar parecem indicar para um tríplice trabalho da burocracia estatal sobre a mesma realidade imponível e para a tríplice judicialização de cada conflito tributário, o que deve ser evitado.
3 – As propostas de reforma do contencioso judicial tributário focam apenas nas estruturas judiciais, mas a integração da atividade de lançamento de tributos e da representação judicial dos Fiscos é essencial para o sucesso da nova tributação do consumo. Se cada ente credor realizar seu próprio lançamento e cobrança de forma independente, o trabalho judicial será multiplicado, colocando em risco a organização do Poder Judiciário. No entanto, os avanços dos projetos de regulamentação (PLPs 68/2024 e 108/2024) são nulos ou tímidos.
4 – A falta de integração da cobrança e da defesa dos créditos do IBS e da CBS traz sério risco de colapso à infraestrutura do Poder Judiciário. Se cada fato gerador levar a lançamentos nas três esferas, com as consequentes execuções e ações de impugnação, o Poder Judiciário não terá condições de atender de forma adequada à demanda. Impõe-se o esforço concatenado dos Fiscos, para tratar em conjunto as hipóteses imponíveis.
5 – A tributação no destino faz com que cada contribuinte tenha relação com cada uma das administrações tributárias estaduais e municipais, potencializando o número de litígios.
6 – A tributação do setor de serviços é responsável pela maior parte das execuções fiscais atualmente propostas. Sua revisão deve ser o foco da nova estrutura de execuções fiscais.
7 – A introdução da Ação Declaratória de Legalidade (ADL) e da Ação Declaratória de Ilegalidade (ADIL) na competência do Superior Tribunal de Justiça apresenta riscos. Se, por um lado, a medida pode conferir rapidez à decisão, evitar a dispersão da jurisprudência, prevenir desequilíbrios competitivos e aliviar as instâncias ordinárias, por outro, eliminará o debate e a maturação da decisão nas instâncias ordinárias, o direito ao recurso (art. 5º, LV, da CF), à inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV), ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LV) e poderá sobrecarregar o Superior Tribunal de Justiça. Caso se opte por sua adoção, deve-se contemplar salvaguardas, como a adoção de número estrito de legitimados, a restrição do objeto e do parâmetro e, especialmente, a discricionariedade da Corte quanto à presença de urgência e de relevância para o conhecimento do pedido.
8 – A criação de um Tribunal Federal de composição mista – magistrados federais e estaduais – apresenta desafios administrativos e orçamentários intransponíveis. Uma providência teoricamente muito mais simples seria a unificação da atividade de cobrança do IBS e da CBS, na medida em que os procuradores envolvidos terão rigorosamente a mesma missão institucional – fazer valer a interpretação da legislação tributária uniforme estabelecida pelo órgão central (Comitê Geral do IBS e Receita Federal) e, nesses limites, exigir o crédito tributário.
9 – A criação de colegiados virtuais de julgamento formados por Juízes Federais e Estaduais não tem base nas normas sobre a cooperação judiciária nacional. Sua adoção tornaria o sistema judicial mais complexo e intrincado e não apresentaria ganhos dignos de nota.
10 – O direcionamento das execuções fiscais ou das ações antiexacionais do IBS à Justiça Federal apresenta riscos de esgotamento da Justiça Federal. A medida precisa ser acompanhada de uma adequada estratégia de financiamento. A Justiça Federal é premida pelas normas do regime fiscal sustentável (Lei Complementar 200/2023) e teria dificuldade em ampliar sua estrutura, pela impossibilidade de aumento de gastos. A criação do Fundo de Custas da Justiça Federal seria essencial para qualquer esforço de atendimento da nova litigiosidade.
11 – O estabelecimento de alçadas para a propositura das execuções fiscais (e eventualmente, para a contestação de ações antiexacionais) por cada ente da federação tem a vantagem de concentrar a cobrança e a discussão em um só processo, com apenas um ente representando os demais, e de diluir a litigância entre as Justiças Federal e dos Estados. Seu estabelecimento dependeria da de um marco legal a ser definido.
12 – A exigência de prévio requerimento administrativo para as discussões quanto aos novos tributos seria uma forma de valorizar a atividade administrativa e de aliviar a jurisdição. No entanto, essa alternativa gera preocupações com o direito à inafastabilidade da jurisdição - art. 5º, XXXV, da CF.
A meu sentir, o STJ tem razão em parte, mas é preciso entender que o mais preocupante é a burocracia que envolve essa Reforma Tributária. Os contribuintes terão de contar com a assessoria de advogados e contabilistas para fazer andar a carruagem da CBS e do IBS, sem maiores atropelos e com segurança suficiente a evitar autuações do fisco.
Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).
Doutor Wilson Campos pode me aguardar que vou precisar do senhor para ajudar na minha empresa a entender melhor essa burocracia toda da reforma tributária e suas implicações nas empresas principalmente no meu ramo. Valeu doutor. Abração cordial e fraterno. Odilon Grizal.
ResponderExcluirO STJ reclama do sistema da reforma tributária que pode aumentar o contencioso no tribunal mas o STJ não explica que agora, muito antes de estar vigente a reforma o STJ, o STF e os tribunais em geral já são muito difíceis de lidar e são caros e são excessivamente lentos. Não será a reforma tributária que vai triplicar o trabalho do STJ ou do judiciário em si mas a lentidão de julgar desde sempre. Dr.Wilson Campos eu já vivi essa situação de depender do STJ e de outros tribunais e digo que o judiciário todo é muito caro e muito lento. Perdão mas é assim que vejo isso. No entanto Dr. Wilson parabéns pelo seu trabalho, pelos seus artigos,por sua coluna no jornal e pelo seu blog super útil e interessante para todos nós brasileiros. Gracias. Vitória G.T. Hermes
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