VINTE ANOS DE RISCOS



O temporal que atingiu Belo Horizonte no fim da tarde de sexta-feira, 12, causou morte e alagamentos. Mais uma vez as chuvas foram julgadas as culpadas pela leniência do poder público municipal. As causas são conhecidas, porquanto as obras estruturais de grande porte, inapelavelmente necessárias, não são realizadas.

Há algum tempo se registram incorreções no controle de enchentes e a prevenção de desastres na capital. Nem por isso medidas severas foram tomadas para que fatos tristes não voltassem a ocorrer. A tragédia se repete, e as desculpas soam como confissão do erro que poderia ter sido evitado.

Enquanto os investimentos tardam por excessiva burocracia da União, a administração municipal negligencia em sua capacidade de elaborar os projetos requeridos pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Ou seja, os recursos não são liberados por ausência de requisitos elementares para a composição dos custos, de cronogramas e projetos, nos termos das exigências do governo federal.   

A lentidão no enfrentamento da grave situação de risco imposta aos moradores da cidade chega a incomodar até os alienados, que, na mesma temperança de outros desavisados, jamais fazem o "mea culpa, mea maxima culpa" pelo sucedido, e as chuvas, que sempre são esperadas depois de um longo período de estiagem, acabam responsabilizadas pela falta de intervenção pública na defesa de interesses da coletividade.

Não bastassem a dengue, o zika vírus e a chikungunya para desesperar a todos, agora os belo-horizontinos terão que esperar por mais duas décadas até a solução das inundações que invadem ruas, casas, lojas, carros e, pior, tiram vidas de inocentes. A rigor, independentemente de quem sejam os culpados, uma coisa é certa: o povo está só!

Em que pese o direito ao contraditório, nada justifica o embelezamento de determinados locais quando o caos toma conta de regiões inteiras que sofrem com desabamento de prédio, queda de viaduto, inundações e enxurradas, deslizamento de encostas, sujeira nas ruas, entulhos por todos os lados, obras inacabadas e falta total de sintonia e diálogo com a população.   

Segundo noticiado pela imprensa, o prefeito afirmou que os alagamentos e as inundações em vários pontos da cidade poderão continuar por mais 20 anos. "As próximas quatro ou cinco administrações de Belo Horizonte terão que continuar investindo fortemente na prevenção de chuvas", disse. Ora, se em dois mandatos o nobre administrador não conseguiu imprimir ações efetivas na ampliação da capacidade de escoamento de águas pluviais, como transferir para os próximos a solução que não alcançou?

O cotidiano bucólico que a destacava entre as maiores cidades brasileiras não pode mais ser vivido na capital mineira, outrora cidade jardim, hoje verticalizada, de clima árido e solo impermeável. Com a palavra a opinião pública, os contribuintes e os eleitores, no democrático exercício da cidadania. 

Wilson Campos (Advogado e Ambientalista).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016, pág. 15).

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