O CAOS ANUNCIADO.

Nada me afasta dos princípios, os quais vejo como basilares da condição humana. A legalidade inquestionável que se busca é a pedra de toque para os anseios das multidões. E o Princípio da Legalidade, um dos sustentáculos fundamentais do Estado de Direito, em nada surpreende quando conclamado pelos submetidos. A majestade do exercício da legalidade faz com que os indivíduos encontrem o fundamento das suas prerrogativas, bem como a clareza solar de seus direitos e deveres.

O caos anunciado se revelou de fato quando as garantias conquistadas foram retiradas. A sociedade inerte se inquietou e passou a questionar. Os signatários do plácido poder do não sou mas estou, arregimentaram-se na tocaia da madrugada e simplesmente mandaram mudar. Trocaram o certo pelo duvidoso e o povo, boquiaberto, inquietou-se mais ainda. Mas a clarividência dos falsos poderosos não contava com a insatisfação coletiva e esta conta, quando muitos querem e por conseguinte podem.

A instalação do caos se avoluma e com ela a indignação da perda de espaço, mínimo, mas que querem diminuir mais ainda do pequeno quinhão do contribuinte. A arrogância do desmedido não tem tamanho quando se trata de povo que se submete, mas quando este sai de sua posíção de cócoras e se ergue e se agiganta, as posses perdidas se reapresentam. O povo não é povo simplesmente por ser. O povo é mais. O povo é cidadão, é contribuinte, é aquele que paga a conta.

A insanidade dos pseudo poderosos não os remete à realidade dos dias de hoje. E este hoje a que me refiro é a realidade dos fatos discutidos nas rodas, nas esquinas, nos clubes, nas reuniões, nas empresas, nos lares e em todos os lugares onde tenha no mínimo oito entre dez, que já não suportam mais tanta sujeira dos vendilhões do patrimônio público, este mantido com o suor do povo que já não treme e não teme.

O início do caos pode ser a indiferença pública com o infernal trânsito que aglomera veículos e seres humanos, amontoados aos milhares, à mercê de inúmeras obras espalhadas, não pedidas pelos contribuintes mas que, a rigor, foram pessimamente planejadas. Pode ser ainda a insegurança diuturna que prende em casa os cidadãos de bem e solta nas ruas os criminosos impunes, acobertados por uma legislação fraca e absurdamente complacente com o ilícito. Também pode ser o descaso com a vida humana quando chegam as chuvas e as desculpas esfarrapadas são sempre as mesmas. E pode ser ainda no péssimo transporte público, na insuficiente e deficitária rede hospitalar, nas quase nulas áreas de laser, na falta de investimentos na infraestrutura, no desperdício de dinheiro público com políticos de caráter duvidoso e por tantos outros motivos que ficaríamos aqui por horas a enumerar.

O meio do caos é a prática despudorada de desrespeito com as garantias conquistadas pela sociedade. A primeira, seja a Pampulha - área de contemplação e descanso das famílias e dos visitantes, de preservação em seu conjunto arquitetônico, de proteção em suas Áreas de Diretrizes Especiais e de manutenção em sua beleza natural aos moldes da referência de cartão postal. A segunda, seja o Mangabeiras - região abraçada pela Serra do Curral, importante marco histórico, cujo tombamento abriga no seu entorno o Parque das Mangabeiras, criado com a finalidade de conservar e proteger os espécies florestais e os mananciais de água ali existentes, além de situado em zona de preservação ambiental. A terceira, seja a Mata do Planalto - extensa área verde de convivência harmoniosa entre a fauna e a flora, presenteada com nascentes de águas cristalinas, num gentil ato de acolher de longe em sua forma de vegetação de Mata Atlântica, a qualidade de vida do ser humano. A quarta e as seguintes, sejam a venda da Rua Musas, a redução das ADE's do Santa Lúcia, o Parque da Lagoa Seca no Belvedere e tantas outras que, por mais inacreditável que pareça, sofrem com a falta de interesse do Poder Público.

Todas estas práticas relatadas representam a retirada de direitos em umas e outras, suprimindo o já conquistado ao invés de ampliar. Ou seja, o caos deste meio é o autoritarismo e o desrespeito inexplicável da Administração com os moradores, com as comunidades, com a sociedade e com a cidade como um todo. Aqui, o contribuinte paga mas não leva. Ou melhor, leva... a pior.

Ainda, o meio do caos retrata a distância cada vez maior entre o povo (contribuinte) e a política vigente. Mesmo sabendo que a coletividade é a proprietária dos bens e dos interesses públicos, o Poder Público exerce a titularidade e não se desincumbe bem em seu dever, uma vez que se deixa levar pelos escusos favores dos setores econômicos. A Administração Pública se esquece de que deve balizar toda a sua atuação sobre o fato de que controla temporariamente a propriedade de terceiros e que estes bens são todos os de interesse da coletividade. A mesma coletividade que paga os salários dos administradores e suporta o ônus dos seus mandatos políticos.


Falta-me paciência e estômago para aguentar tanta estultice, cometida pelos que não são mas estão. E vem-me à lembrança estas sábias anotações: "Na primeira noite eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e,conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada." (Eduardo Alves da Costa).


O fim do caos se dará por certo nas eleições. A retribuição será na mesma moeda. O contribuinte que é o morador, que é o eleitor, que é o munícipe, que é o cidadão alijado, que é o jogo de empurra dos interesseiros travestidos de administradores públicos, que é uma das peças fundamentais da democracia, com certeza saberá medir os políticos pelos seus atos. As eleições estão próximas e próximo está o direito do povo se manifestar civicamente.



O remédio para o restabelecimento dos direitos e garantias retirados é uma boa dose de indignação popular, misturada à atitude enérgica de que basta de desmandos e sacudida pela ação de retirar da inércia o Poder Judiciário, para que a justiça seja aplicada e as leis só sejam modificadas para restringir ainda mais e não para diminuir vergonhosamente as conquistas duramente alcançadas.

O caos anunciado requer providências urgentes da sociedade, na constante vigilância da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. O cidadão ético está só. Cabe-lhe sair da posíção em cócoras e se erguer. E de pé se agigantar na defesa efetiva de seus direitos constitucionais.

Wilson Campos (Advogado).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de 26/04/2012, quinta-feira, pág. 16).
 

Comentários

  1. Heloísa Fonseca Pinto2 de abril de 2012 às 21:10

    Diante do caos anunciado gritemos por socorro! É preciso lutar pelos nossos direitos, soltar a voz bem alta para que nos ouçam e possamos juntos, mudar as coisas que nos incomodam. Cantemos com Jota Quest:
    Vivemos esperando
    O dia em que
    Seremos melhores
    (Melhores! Melhores!)
    Melhores no amor
    Melhores na dor
    Melhores em tudo!!!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas