VOLTARAM AS INUNDAÇÕES E AS DESCULPAS DE SEMPRE.

Estão de volta os desastres e, com eles, as desculpas de sempre do poder público. Entender as chuvas, as enchentes e as inundações é, no mínimo, razoável para o ser humano. Agora, entender as desculpas daqueles que administram as cidades, na mesma toada de que a natureza é assim mesmo e contra ela não há quem possa, é demais, melhor dizendo, inaceitável por moradores e contribuintes que pagam para assistir o mesmo filme, repetidas vezes, ano após ano.

As chuvas são sempre esperadas e bem-vindas pela importância óbvia do fenômeno natural. Já sob a responsabilidade do homem, as enchentes exigem controle severo do desmatamento e dos rios, que, por sua vez, requerem limpeza e desassoreamento das suas margens e cabeceiras. As inundações, resultantes do desrespeito ao meio ambiente, cobram serviços públicos eficientes na execução de audaciosos projetos que incluam galerias celulares e drenagens de águas pluviais.

A verticalização irracional, as obras viárias, a expansão urbana sem planejamento adequado e a falta de sintonia com os moradores levam os gestores públicos a erros grosseiros, quando esses não se apercebem da necessidade preliminar de que a pavimentação de concreto ou asfalto seja acompanhada da respectiva obra de drenagem profunda. A execução de galerias celulares em pontos estratégicos também ajuda na captação de águas que descem das partes mais altas das cidades ao encontro dos rios. A solução é uma questão de engenharia, administração e vontade.

O crescimento desejado para a cidade, como defendido nos gabinetes executivos, requer obras de infraestrutura, e não apenas de superestrutura ou refinado acabamento. As ações de macrodrenagens nas cidades são mais urgentes do que operações urbanas grandiosas, mesmo porque o sossego, os bens, os lares e as famílias estão acima desses arremedos de desenvolvimento urbano.

A ocupação inadequada do espaço urbano causa impacto sobre a população e se revela ainda maior quando o poder público deixa à sua própria sorte os cidadãos de baixa renda. O desenvolvimento urbano só se mostra justo aos olhos da sociedade quando privilegia a segurança e a vida dos moradores, independentemente da região. A perda de vidas, o desabrigo das famílias e o abandono dos lares inundados por águas contaminadas representam a tragédia que poderia ser evitada, caso houvesse, de fato, investimentos públicos direcionados para os que mais necessitam.

A solução passa pelas providências inicialmente mencionadas e se completa com a educação ambiental estimulada junto à coletividade e aos órgãos públicos, a preservação integral das áreas verdes, a proibição do desmatamento, a permeabilização do solo com a criação de novos cinturões verdes, a melhoria do saneamento básico, a coleta sistemática dos resíduos sólidos, a colaboração conjunta, amistosa e recíproca do poder público e das associações de moradores, a fiscalização preventiva nas áreas de risco, a elaboração de planos, projetos e programas voltados para a sustentabilidade, e a consciência e ação cívicas da população e do poder público. 

Tomadas essas providências, não mais se ouvirão os lamentos pelos bens destruídos, o desespero das famílias desabrigadas ou o choro pela perda de uma vida. Basta vontade política e cobrança enérgica da sociedade.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de 26/12/2013, quinta-feira, pág. 15).

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