TRAGÉDIAS MINEIRAS

Outra vez o meio ambiente.


Data venia dos honrados cidadãos mineiros, confesso ficar indignado ao ver as imagens e ler as notícias sobre os lamentáveis episódios que envergonham não a poucos, mas a muitos. O primeiro se refere ao recente Projeto de Lei 2.946/2015, criado pelo governo de Minas Gerais e enviado à Assembleia, sem a tempestiva, ampla e necessária oitiva da sociedade, promovendo radicais alterações na forma de concessão de licenciamentos ambientais. O segundo reflete o triste momento vivido pela população mineira, profundamente consternada com a tragédia que se abateu sobre os moradores da comunidade de Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana, com o lamentável rompimento das barragens do Fundão e Santarém, de propriedade da mineradora Samarco, causando a morte de pessoas e destruições patrimonial e ambiental.

O projeto do Executivo estadual retira da coletividade uma das poucas chances de assegurar o direito garantido no artigo 225 da Constituição da República, que dispõe no sentido de que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

A tragédia da enxurrada de lama prevista há muito pelos moradores poderia ter sido evitada. O descaso do poder público é gigantesco. A indiferença do setor empresarial, idem. O imediatismo político e a ganância por arrecadação ferem de morte a cidadania. Não existem explicações para os ouvidos moucos aos alertas de segurança tantas vezes comunicados. A indignação é geral. As mortes não podem ficar impunes. Os crimes ambientais precisam ser apurados. Os infratores, públicos e privados, por culpa, dolo ou omissão, têm de prestar conta à Justiça. O contraditório, nos termos da lei. O perdão, jamais.

As alterações impostas pelo projeto de lei do governo acarretam retrocesso ambiental e afastam da discussão a sociedade organizada. As mudanças no Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema), extensivas à política ambiental de Minas Gerais, além de negarem as garantias constitucionais, retiram, injustificadamente, da tutela do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) as prerrogativas de deliberações na defesa dos interesses difusos e coletivos. As razões alegadas de rapidez nos licenciamentos e prioridade aos empreendimentos tidos como estratégicos pelo Executivo estadual colocam sob risco iminente de destruição os atributos da natureza e fazem surgir a insegurança jurídica, os danos ambientais e os embates sociais.

Os dois episódios estão ligados pelas obrigações e pelas responsabilidades ambientais. Nos dois casos, se faz necessária a fiscalização proativa do governo do Estado e da respectiva Secretaria de Meio Ambiente. No primeiro caso, a negligência estatal está se prenunciando. No segundo, a incompetência causou tristeza, dor, sofrimento, perdas humanas irreparáveis e prejuízos que deverão ser indenizados ou buscados na esfera do Poder Judiciário.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de terça-feira, 10 de novembro de 2015, pág. 17).

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