JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA NA COMPRA DE IMÓVEL FINANCIADO.

 

Quando a compra de um imóvel é realizada junto a uma incorporadora, imobiliária ou construtora, mediante financiamento realizado por essas empresas, costumam surgir inúmeras dúvidas sobre as taxas cobradas nos contratos.

Pergunta-se: 1) As empresas do ramo imobiliário podem cobrar determinados valores ou estipularem certas cláusulas, multas, juros, correção monetária? 2) Qual índice poderia ser usado?

Essas duas perguntas são as mais feitas por parte dos consumidores. E há razão para os questionamentos. Ora, nem sempre essas informações estão claras no contrato e o comprador pode ou não estar acostumado a lidar com esse tipo de problema.

Daí a orientação para que você consulte um advogado que possa assessorá-lo na hora de adquirir um imóvel. A análise preliminar ao fechamento do negócio pode evitar-lhe muita dor de cabeça e alguns prejuízos.

Vamos atentar agora sobre a correção monetária mensal em contratos imobiliários e vamos às explicações, a saber:

Existe certa liberdade para que as empresas realizem a correção monetária dos valores dos contratos imobiliários, podendo escolher o índice que mais lhes agrada e a periodicidade de aplicação dessa atualização, incluindo isso no contrato de forma clara.

De maneira geral, as empresas adotam o INCC (Índice Nacional da Construção Civil) enquanto durarem as obras de construção do imóvel, caso se trate de incorporação imobiliária (imóvel na planta), e o IGP-M quando houver a entrega das chaves.

Agora, quando se trata de contrato de comercialização de lotes, a praxe é a aplicação do IGP-M desde o início do contrato, por não haver obra a ser entregue, presumivelmente.

Mas a grande dúvida surge em relação à aplicação dessa correção monetária. Ela pode ocorrer todo mês ou apenas uma vez ao ano? A resposta vai depender do prazo de duração do contrato. Se o contrato tiver uma quantia determinada de parcelas, a correção monetária poderá ser mensal. Porém, se o prazo for outro, apenas será possível a correção em periodicidade anual.

Destarte, vamos direto aos prazos:

a) Contrato com prazo de duração maior que 36 meses – nos contratos com prazos maiores do que 36 meses é permitida a correção monetária mensal. Assim dispõe o art. 46 da Lei 10.931/2004:

Art. 46 - Nos contratos de comercialização de imóveis, de financiamento imobiliário em geral e nos de arrendamento mercantil de imóveis, bem como nos títulos e valores mobiliários por eles originados, com prazo mínimo de trinta e seis meses, é admitida estipulação de cláusula de reajuste, com periodicidade mensal, por índices de preços setoriais ou gerais ou pelo índice de remuneração básica dos depósitos de poupança.

De sorte que, sendo o seu contrato maior ou igual a esse prazo, a empresa poderá aplicar o reajuste da correção monetária mensalmente.

b) Contrato com prazo de duração menor que 36 meses - em interpretação do mesmo artigo acima citado, caso o contrato seja menor que trinta e seis meses, a empresa não poderá cobrar a correção monetária todo mês. Ela apenas poderá aplicar a correção uma única vez a cada ano.

Caso o seu contrato tenha menos que 36 meses e a empresa cobre essa correção em todos os meses, você poderá pedir, extrajudicialmente, ou através de uma ação judicial, que ela abata os valores cobrados ou lhe devolva a quantia paga indevidamente.

Um alerta é no sentido de que, a pessoa que comprou um imóvel e o financiou direto com uma imobiliária, construtora ou incorporadora, pode estar pagando muito mais juros do que deveria.

Nesse artigo você poderá entender melhor como essas cobranças abusivas acontecem, como elas são quase imperceptíveis e o que você pode fazer para reduzir o valor de juros que te cobram na parcela e no saldo devedor.

É muito importante que você saiba que essas formas de cobranças de juros que aqui serão relatadas não podem ser cobradas por empresas que não sejam bancos, como as imobiliárias, construtoras e incorporadoras, por exemplo.

Ocorre que a lei beneficia de forma indevida e exagerada os bancos, e permite que eles façam a cobrança de juros de forma mais agressiva, o que não é autorizado a quem não é banco.

Muito bem, sendo assim, vejamos então as três formas de cobranças de juros abusivas praticadas pelas empresas do ramo imobiliário:

I) 1ª Cobrança abusiva - Capitalização de juros – juros sobre juros – juros acumulativos ou cumulados – anatocismo.

A capitalização de juros é a cobrança dos juros sobre o valor principal e, também, sobre os próprios juros.

Acontece uma verdadeira dupla cobrança, o que encarece bastante um contrato de compra e venda de um lote, apartamento, casa, etc.

Para as empresas do ramo imobiliário, não é permitida essa forma de cobrança de juros pelo fato de não estarem incluídas entre as entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI, que é restrito aos bancos, cooperativas e associações de poupança.

A capitalização de juros representa uma cobrança indevida entre 40% e 60% de todo o valor que você paga para adquirir um imóvel, e, às vezes, ela vem camuflada nos contratos, em um parágrafo de uma cláusula contratual, tipo assim: “...serão reajustadas mensalmente pela correção do IGPM e acrescidas de juros de 0,7% (zero vírgula sete por cento) ao mês, de forma cumulativa...”

Atenção! A cobrança dos juros de forma cumulativa ou acumulativa, como aparece escrita nos contratos, é um evidente sinal da capitalização dos juros, anatocismo ou juros sobre juros. Lamentavelmente, essa é uma estratégia adotada pelas empresas do ramo imobiliário para esconder a cobrança indevida de juros.

II) 2ª Cobrança abusiva – Tabela Price.

A Tabela Price é um sistema para amortizar o contrato de financiamento, que faz com que ocorra a capitalização dos juros, de forma mensal.

Além de fazer a própria capitalização de juros, como mencionado no primeiro ponto, a Tabela Price faz com que essa capitalização ocorra mensalmente, o que aumenta a dívida do comprador do imóvel perante a imobiliária.

Muitas pessoas começam pagando uma parcela de R$1mil em um contrato imobiliário e, passados dois ou três anos, o valor da parcela vai para R$2mil ou R$3mil.

O sentimento é que o saldo devedor nunca vai acabar. As parcelas aumentam, mas a dívida não diminui. A coisa toda vira uma bola de neve.

Vale notar que muitas pessoas chegam a desistir do contrato e pedem o seu cancelamento, aceitando até mesmo as cobranças de multas altas para não continuar com a dívida, eternamente. Este é um fato terrível, que precisa ser visto, revisto e punido, diante da constatação dos juros abusivos e escorchantes cobrados. E, pior, o consumidor é enganado, achando que tem de pagar aquele valor altíssimo, que aumenta a cada mês, impedindo-o de realizar o sonho da casa própria. De fato, muito triste!

Há caso específico de decisão do Judiciário em que o consumidor pagava quase R$ 1.900,00 de parcela e teve o direito de reduzi-la para R$ 1.100,00. Ou seja, isso foi possível por meio de tutela de urgência em razão de pedido liminar em juízo.

III) 3ª Cobrança abusiva – Tabela Gradiente.

Este é outro problema sério. A Tabela Gradiente é considerada como sinônima da Tabela Price, uma vez que produz o mesmo efeito, isto é, capitalização mensal de juros, o que não é permitido às imobiliárias, incorporadoras e construtoras.

Muitas empresas não colocam no contrato, de forma expressa, o título “Tabela Price”, simplesmente porque sabem que o seu uso é ilegal e que muitos consumidores têm uma noção da sua abusividade. Por isso, essas empresas preferem adotar a “Tabela Gradiente”, de pouco conhecimento das pessoas, mas igualmente perigosa para quem compra o imóvel.

Portanto, quando você ler “Tabela Price” ou “Tabela Gradiente”, fuja do contrato e procure algo mais honesto e razoável.

Essa tal de “Tabela Gradiente” faz com que as parcelas no primeiro ano de contrato sejam baixas, mas a partir do segundo ano, os valores começam a aumentar de forma geométrica, muito além do que o consumidor recebe de reajuste de salário. E, sabendo que esses contratos imobiliários são feitos por 10, 15, 20 e até 35 anos, a empresa receberá, indevidamente, valores por longos anos, cobrindo as parcelas baixas do primeiro ano e obtendo lucro exagerado nos anos seguintes. Ou seja, uma situação inaceitável.

Há caso no Judiciário que dá conta de uma demanda em que a empresa afirmou que os compradores teriam de pagar mais R$150mil para quitarem o contrato de um imóvel, mesmo após 10 anos de pagamento regular das parcelas, que tinham valor médio de R$2mil. Muito bem, os cálculos judiciais foram feitos e chegou-se à conclusão, por meio de uma planilha demonstrativa, que os compradores do imóvel deviam apenas mais R$30mil, ou seja, uma diferença estupenda de R$120mil de juros abusivos.

Assim, diante desses fatos gritantes e inadmissíveis, a Justiça tem entendido que essa artimanha das empresas tem causado prejuízos aos consumidores e, por isso, tem decidido pela exclusão do uso da Tabela Gradiente dos contratos imobiliários. Vejamos:

APELAÇÃO CIVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C CONSIGNATORIA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL A PRESTACAO. APLICABILIDADE DO CDC. JUROS REMUNERATORIOS. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. INCC. IGPM. SUBSTITUICAO PELO INPC. CAPITALIZACAO DE JUROS. TABELA PRICE/ GRADIENTE. [...]

4 - A TABELA PRICE OU MODALIDADE GRADIENTE, POR CAPITALIZAR JUROS SOBRE JUROS, REPRESENTA FATOR DE DESEQUILIBRIO CONTRATUAL, OCASIONANDO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA, DEVENDO SER AFASTADA DO CONTRATO POR RESULTAR ONEROSIDADE EXCESSIVA. [...] (TJGO, APELAÇÃO CIVEL 111397-9/188, Rel. DES. GILBERTO MARQUES FILHO, 2ª CÂMARA CIVEL, julgado em 14/08/2007, DJe 15083 de 13/09/2007).

Novo alerta! As pessoas precisam saber que podem estar pagando o valor de dois ou três imóveis em vez de apenas um.

Pior que isso são aquelas pessoas que acabam perdendo o bem, não recebendo nenhum valor de restituição ou, ainda, pagando mais dinheiro para encerrar o contrato, quando deveriam é pagar menos.

Existem absurdos de todos os tipos e todo cuidado é pouco.

Então, diante disso, o que fazer?

Faz-se necessário que o contrato e a planilha evolutiva (documento que contém o histórico dos pagamentos realizados e o saldo devedor atual) sejam analisados por um advogado, de preferência um especialista da área, que poderá afirmar se é viável entrar com uma ação judicial para revisar o contrato e obter a diminuição da dívida, com a eliminação das citadas cobranças abusivas.

Também é fundamental realizar os cálculos por meio de um perito da área contábil, para saber exatamente qual o valor que a pessoa ainda deve ou se existe a possibilidade de ela ter quitado o contrato.

Na hipótese de a pessoa ter pagado além do valor da dívida, ela poderá pedir a restituição das quantias que foram pagas além do devido.

Nesse sentido é o caso de uma pessoa em que a revisão contratual representou uma economia de quase 90% - o consumidor estava sendo cobrado em R$384 mil, quando já tinha pagado mais de R$220 mil por um apartamento que foi adquirido pelo preço de R$150 mil. Os cálculos foram feitos e a planilha demonstrou que o valor da dívida correta dessa pessoa, na verdade, era de apenas R$50 mil.

No Judiciário existem centenas de decisões mandando corrigir e diminuir os valores abusivos cobrados. As sentenças judiciais geralmente determinam o cálculo de forma contratual, aplicando a correção pelo índice IGPM mais os juros de 1% ao mês de atualização nas parcelas, sem anatocismo, mas de forma capitalizada anual e sem acumular os índices e juros sob forma exponencial.  

Por todo o exposto, a recomendação é para que o comprador, o consumidor, tenha zelo e cautela na hora de assinar o contrato, e mesmo depois disso, principalmente se as parcelas porventura começarem a subir acima do tolerável. E para analisar o contrato, preliminarmente, ou para uma demanda judicial futura, sempre consulte um advogado.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas tributária, cível, trabalhista, empresarial e ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).  

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Comentários

  1. A lei deixa muito solta essa questão e as imobiliárias abusam na hora de vender e fazer o contrato de compra e venda e usam índices do IGPM cumulativos e a Justiça brasileira não toma uma atitude geral que resolva isso de vez evitando que aconteça com outras pessoas e mais vezes. Uma vergonha tudo isso. O cara que vai comprar ainda tem de se preocupar com a honestidade de quem vende e da imobiliária que faz a intermediação. Bando de chupa sangue esse pessoal. Podiam agir com honestidade e até a clientela aumentaria. Mas Meu prezado Dr. Wilson Campos obrigado pelas informações e acho que todos deveriam ler e aprender como se prevenir diante desses abusos e reajustes abusivos contra o consumidor. Abr. Moisés Lucas.

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  2. Eu comprei um apartamento e paguei quase dois depois de 25 anos de financiamento da construtora e da imobiliária no meio e foi umDeus me acuda com todo perrengue que passei pra pagar e só melhorou depos de ler umartigoantigo do Dr.Wilson e eu começei brigar na justiça para parar de pagar juros e mais juro em cima de juro como disse o juiz no dia da decisão dele. Obrigada dr. Wilson por este artigo e agora vou me cuidar mais contra esse tipo de coisa mas é difiícil e dá muit dor de cabeça nagente. Laura Maria.

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