A DOLOROSA INTERPRETAÇÃO DO ABORTO.

 

Com certeza, a questão do aborto não pode ser tratada com leviandade, desumanidade ou sob o crítico olhar ideológico, de quem quer que seja.

Trata-se de uma questão delicada, que requer análise pontual e concreta, haja vista as peculiaridades de cada caso específico.

Numa situação em que a mãe esteja sofrendo de forte depressão, podendo colocar em risco sua vida e a do bebê, a ajuda psicológica e psiquiátrica deve ser buscada, antes de qualquer medida precipitada de aborto. Nos casos de riscos iminentes à vida da gestante, atestados pelos médicos responsáveis, o aborto deve ser considerado. Nos casos de anencefalia do feto, também o aborto deve ser adotado, após laudos médicos críveis. Já nos casos de estupro, a lei é clara e deve ser interpretada, validada e seguida pelos juízos competentes. Mas no caso de aborto generalizado, sem precedentes criminais e sem riscos para a mãe ou para o bebê, não se justifica adotar o aborto como solução.

Essa história das feministas militantes, tomadas de pura teoria ideológica, de que “o corpo é meu e faço dele o que quiser”, não merece acolhida social nem judicial quando trata da questão em debate. Trata-se de demência e egocentrismo. Essas feministas e esses grupos defensores do aborto em qualquer situação, não podem ignorar a vida de um inocente que não pediu para estar naquela condição. Se essas pessoas não respeitam a concepção da vida, no mínimo, deveriam tomar precauções e usar camisinha.

No caso de estupro de vulnerável ou criança, a história é outra. Vejamos o recente caso que abalou os alicerces da sociedade brasileira, que se deu de forma lamentável e da seguinte maneira:

Uma menina de 11 anos estava sendo mantida pela Justiça em um abrigo, longe da família, há mais de um mês, para evitar a realização de um aborto legal. O caso, divulgado pelo The Intercept nessa segunda-feira (20/06/2022), mostrou a questionável postura de uma juíza e de uma promotora de Justiça, que durante a audiência tentaram induzir a garota a não realizar o aborto, embora ela tenha sido vítima de estupro.

O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) informou que assim que tomou conhecimento da situação, a 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Tijucas ajuizou ação “pleiteando autorização judicial para interrupção de gravidez assistida, segundo critérios definidos pela equipe médica responsável”.

O MPSC disse ainda acompanhar o caso visando a proteção da vítima. “Por fim, lembramos que o processo segue protegido por sigilo previsto em lei. Sigilo, aliás, que visa unicamente proteger a imagem e a integridade de uma criança vítima de crimes sexuais, indevidamente exposta à opinião pública”, afirmou o parquet.

A menina, uma criança, sofreu estupro e engravidou antes de completar seus 11 anos de vida. Quando a mãe descobriu a gestação, já com 22 semanas, procurou ajuda médica. Mas o hospital se negou a realizar o procedimento porque, por normas internas, após a 20ª semana é exigida autorização judicial.

O caso chegou à juíza da comarca. A promotora, do MPSC, ajuizou ação cautelar pedindo o acolhimento institucional da menina. A juíza atendeu ao pedido e comparou a proteção da saúde da criança com a proteção do feto, dizendo que a situação deve ser avaliada não só como forma de proteger a criança, mas também o bebê em gestação.

A menina foi levada a um abrigo, longe da família, e já se encontra com 29 semanas de gestação. 

Em algumas cenas da audiência, conforme vídeos divulgados na mídia é possível ver que mãe e criança foram induzidas a desistir do aborto. Juíza e promotora insistiram que seria homicídio, que o bebê nasceria chorando e iria agonizar até morrer, e pediram que a menina aguentasse mais um pouco até que fosse possível manter o bebê vivo e entregá-lo para adoção.

O caso tramita sob segredo de Justiça, mas as informações e imagens da audiência foram vazadas e divulgadas pelo site The Intercept.

A audiência entre a juíza e a criança que sofreu estupro ocorreu dias antes de a menina completar 11 anos. À criança, a magistrada pergunta se quer pedir algo, um presente de aniversário. A menina diz que não. A juíza, então, questiona: “queres escolher algum nome pro bebê? Não? Tá”. Os questionamentos continuam. Ela pergunta se a menina sente o bebê mexer, e se quer vê-lo nascer.

Em toda a conversa, a juíza parece querer induzir a criança a manter a gestação, e chama o estuprador de “pai do bebê”. Pergunta quanto tempo a menina aceitaria ficar com o bebê até o “pulmãozinho dele ficar maduro”, para entregar à adoção. “Tu suportaria ficar mais um pouquinho? Mais duas semanas, três semanas?”. A menina responde que não sabe. E ela segue: “e tu consegue se imaginar ficar até o final da gestação? Você acha que o pai do bebê concordaria com a entrega pra adoção?”

A promotora de Justiça, por sua vez, fala à criança: “Em vez de deixar ele morrer, porque ele já é um bebê, já é uma criança, em vez de tirar da tua barriga e ele morrer agonizando, porque é isso que acontece (...) ele vai nascer chorando, e vai ficar agoniando, a gente dar todos os suportes médicos pra que ele sobreviva, e a gente entrega pra adoção”.

A magistrada e a promotora também usam palavras como “bebezinho” e insistem que, em uma interrupção, o bebê nasce, e precisariam esperá-lo morrer. “É uma crueldade imensa”. E a mãe da menina responde: “mais crueldade do que ela tá passando? Do que eu estou passando ao ver a minha filha nessa situação?”. A juíza diz que a tristeza que ela está passando é a felicidade de um casal que quer adotar.

“Deixa eu cuidar dela? (...) Vocês fazem esse monte de pergunta, mas ela nem sabe o que responder”. Aos prantos, a mãe da menina só pede que a filha possa ser levada para casa.

A juíza e a promotora talvez desconheçam o artigo 128 do Código Penal Brasileiro:

Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário

I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

O caso é, de fato, revoltante, e exige providências urgentes e enérgicas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que deve aplicar reprimendas severas à juíza e à promotora, pois ambas causaram sofrimento à menina estuprada e desconsideraram que a maternidade infantil não é compatível com o princípio da proteção integral assegurado na Constituição Federal, no ECA e na legislação protetiva dos direitos das crianças. 

Mas, enfim, neste caso, a menina voltou para sua casa, e na quarta-feira, 22/06/2022, o hospital procedeu à retirada do feto, depois de recomendação oficial do Ministério Público Federal.

Todavia, como eu disse no princípio deste artigo, existem casos e casos. Vejamos este ocorrido há pouco mais de um mês:

Em maio, o juiz do Tribunal do Júri de Florianópolis/SC, chegou a autorizar o aborto. “A negativa de pretensão pelo Judiciário sujeitaria não só a criança, mas toda a família da paciente ao sofrimento psicológico intenso, inclusive diante dos riscos que a gravidez representa à própria vida da infante, conforme anotações médicas juntadas”.

Contudo, o alvará foi cassado no dia seguinte após petição do Ministério Público, sob alegação de que o caso já era acompanhado pelas varas de Infância e Criminal. No mesmo dia, foi autorizada uma cesariana antecipada, “de modo a salvaguardar a sua vida (da menina) e do concepto”.

A advogada da criança teria entrado com novo pedido para o aborto, mas foi negado por uma desembargadora, que argumentou que, embora houvesse o “risco geral de uma gravidez em tenra idade”, a menina não se encontrava em “risco imediato”.

Como visto, os casos são tratados aos moldes dos entendimentos dos doutos juízos competentes. No entanto, há que se considerar os riscos que uma gravidez gera à vida da criança, que vai ficar marcada para sempre, impondo a ela sequelas graves, além dos traumas já sofridos.  

Faz-se necessária a intervenção do Congresso, editando uma lei que seja clara, eficaz e efetiva, e não admita duplas interpretações no caso do aborto. Aliás, o Código Penal precisa urgentemente de reforma total. 

Encerrando, permitam um exemplo que requer pensar, sopesar e avaliar humanamente:

Um certo médico declarou ter realizado inúmeros abortos, em país que legalizou o procedimento, por entender que haveria, nessa ação, benefício à "causa em prol das mulheres", que acolhe principais argumentos de grupos “pro aborto”. O médico em questão mudou seu posicionamento quando recebeu uma paciente que procurava o serviço por ter planejado viagem à Europa e constatar que a gravidez inviabilizaria a viagem, naquele momento. Essa paciente decidiu abortar, viajar, para depois engravidar novamente. Diante de tamanha banalização da vida, o médico ponderou que não estava agindo em prol de mulher nenhuma.

Ou seja, o que retira os direitos são as atitudes bestiais de certas pessoas. Daí que os “grupos pro-aborto” estão cada vez mais afastados da sociedade cidadã, porquanto não aceitem limites legais às suas sandices e más intenções.

A sociedade não pode perder sua sensibilidade moral. Os riscos estão aí – achar comum e sem importância o ato de causar sofrimento e morte ao feto em gestação. Mas volto a insistir que cada caso é um caso, posto que as peculiaridades exijam interpretação justa e equilibrada.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Excelente artigo dr Wilson Campos. O senhor é craque em levar conhecimento a todos. Gostaria de ver o senhor como governador, senador ou Prés da República. Quem sabe? Tomara!!! Att Wagner Honesto.

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  2. Clara M. S. Albuquerque28 de junho de 2022 às 10:29

    Concordo com Dr. Wilson Campos. Cada caso é um caso e temos de ter equilíbrio e senso de justiça na hora de decidir sobre tal tema tão complexo e importante na vida humana. Parabéns Dr Wilson pela consciência e pela seriedade noi debate. Att: Clara M.S. Albuquerque.

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  3. Thelma P. Oliveria Santos28 de junho de 2022 às 10:38

    Tem mulheres que fazem aborto como se estivesse fazendo uma aplicação de botox - porque são irresponsáveis e não pensam nas consequências do ato. As feministas chatas e esquerdistas por natureza não sabem criar família e deixam filhos jogados por aí com escolhas erradas e mal vistas pela sociedade e até pela família, pelos avós. Como bem disse dr. Wilson o caso precisa ser bem discutido mas a lei está aí e deve ser cumprida por todos e quem não quer ter filho não engravida e usa camisinha. A exceção como disse adv dr Wilson é no caso de estupro, risco à mãe e anencefalia do feto. Abortar por abortar é crime e precisa ser punido isso aí. A mulher é divina e precisa manter sua imagem ao mundo e ser mãe é maravilhoso mas precisa ter responsabilidade e ser exemplo de vida para o filho ou filha. Parabéns doutor Wilson por seus excelente artigos sempre nota 10 e na defesa do bem. Abrs. Thelma P. Oliveira Santos.

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