O VOTO TÉCNICO DO MINISTRO LUIZ FUX.
Cuidarei de falar com isenção e assertividade sobre o voto do ministro Luiz Fux, que, em julgamento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), na quarta-feira (10/09), abriu pontos importantes de divergência que podem ser usados pelas defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros réus julgados por suposta tentativa de golpe de Estado para pedir a anulação do julgamento na Justiça brasileira e em tribunais superiores e organismos internacionais.
O voto do ministro Fux foi longo, mas absolutamente técnico, bem argumentado e fundamentado. Ao se manifestar, Fux não apenas pediu a absolvição do ex-presidente e outros cinco dos oito réus do Núcleo 1, como reconheceu a existência de nulidade absoluta do processo por entender que o Supremo, e em especial a Primeira Turma, não teria competência para julgar a ação ou o caso, pois Bolsonaro e outros investigados não têm mais foro privilegiado.
A meu ver, os quesitos que mais pesam e que foram defendidos por Fux passam pela avaliação segura de que o julgamento não é de competência do STF e, se o fosse, deveria ser levado ao plenário; cerceamento ao direito da defesa diante do imenso volume de materiais apreendidos e tempo limitado para analisá-lo e a falta de provas que configurassem os crimes imputados aos réus; desrespeito às prerrogativas dos advogados; a primeira instância seria competente para julgar as ações contra os oito réus e mais ainda contra os manifestantes do 8 de janeiro de 2023; incompetência absoluta do foro adotado; e não existência de crimes atribuíveis ao ex-presidente e aos demais réus.
O voto divergente do ministro Fux não muda o resultado agora, mas cria uma brecha jurídica que pode, sim, ser usada pela defesa em um recurso ao próprio STF logo após o fim do julgamento ou mesmo no futuro, com possibilidade de anulação.
A questão mais relevante levantada por Fux foi a falta de provas que confirmassem os crimes imputados ao grupo. Como dito antes, o ministro Fux reconhece que houve cerceamento da defesa com milhões de páginas e arquivos para serem analisados em pouco tempo (70 terabytes; um Tsunami de dados), além de não se mostrarem provados elementos capazes de sustentar a acusação. Ou seja, o voto pode ser amplamente conhecido e usado para recursos futuros, uma vez que se trata de um voto que fica para a história do STF e do Brasil.
Fux ainda sustentou e repisou que as defesas dos réus foram penalizadas em razão da quantidade enorme de informações e excesso de documentos no processo, com muito pouco tempo para analisá-los. Ele chamou a prática de “data dump”, que ocorre quando há um acúmulo tão significativo de provas que pode comprometer a capacidade da defesa de realizar uma análise adequada dos documentos, potencialmente prejudicando o princípio do contraditório e da ampla defesa.
Afora o excelente voto do ministro Fux, os demais ministros da Primeira Turma votaram com o relator, ou seja, nem se deram ao trabalho de justificar suas decisões, fizeram citações filosóficas, críticas aleatórias, comentários pessoais e disseram: “acompanho o relator”. Um ministro chegou ao ponto de rir e dizer que iria propor o aumento da multa para dois salários mínimos/dia, o que o relator prontamente aceitou e incorporou na sentença.
Lamentavelmente, o que se viu foram cenas deprimentes de decadência moral do país, de arranhões na imagem do Judiciário e de julgamentos conduzidos por juízes políticos e de viés ideológico. Sinceramente, eu vi com tristeza a institucionalização da violação do devido processo legal e o máximo da radicalização de um tribunal, que deveria ser guardião da Constituição da República e das garantias fundamentais, mas que se transformou em palco de justiçamento político e demonstração de desprezo pelo ordenamento jurídico pátrio.
Encerro dizendo que o julgamento foi medonho, com exceção do voto técnico e das pontuações acertadas do ministro Luiz Fux, inclusive em relação à extravagante dosimetria das penas e à condenação de homens inocentes.
Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).
Clique aqui e continue lendo sobre temas do Direito e da Justiça, além de outros temas relativos a cidadania, política, meio ambiente e garantias sociais.
Comentários
Postar um comentário