QUANDO A COPA NÃO PASSA DA SALA.

A sociedade é sem dúvida uma das promotoras e incentivadoras da educação, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Esta é uma manifestação prevista na Constituição Federal, em seu artigo n° 205. Portanto, de relevância social e constitucional.

Destarte, uma forma educada de se receber uma visita em nosso país é fazê-lo de maneira simples, deixando-a confortável, mas que seja por um anfitrião que não queira impor regras aos seus convidados e sim deixá-los o mais à vontade possível e que se preocupe principalmente com o bem-estar de todos. Esta é uma manifestação típica da boa educação.

Ora, se estamos a falar de visita, de sociedade e de educação, a boa lógica do direito e da justiça, nem sempre uniformes é verdade, nos permite imaginar como se dará o evento tão divulgado nos últimos tempos e tão mal preparado para uma boa recepção aos hóspedes que estão por chegar. Claro, falamos da copa do mundo de 2014.

O direito a que nos referimos é aquele que o cidadão tem de receber bem o seu convidado e propiciá-lo na amplitude do que lhe permite a lei. A justiça por sua vez requer o comportamento adequado do anfitrião e do convidado, ambos merecedores da garantia dos direitos culturais assegurada pelo Estado, que ainda disponibiliza o acesso às fontes da cultura nacional, e apoia e incentiva a valorização e a difusão das manifestações culturais. E estas também estão asseguradas na Constituição Federal, em seu artigo n° 215.

A copa do mundo de 2014 é uma atividade do desporto e também é dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um. Esta é mais uma segurança consagrada na Constituição Federal, no artigo n° 217.

Muito bem, dito isto nos resta perguntar ao Estado: Onde estão as garantias de uma boa acolhida aos convidados? Temos bons aeroportos? Oferecemos serviços a preços justos? O nosso transporte é eficiente e confortável para levar os visitantes aos campos e arenas com segurança e rapidez? O nosso meio ambiente está severamente preservado para oferecer sombra àqueles que queiram à moda europeia descansar sob uma frondosa árvore no centro urbano? Os hospitais e postos de saúde estão aparelhados para garantirem urgência no procurado pronto atendimento? Os pontos turísticos têm estrutura organizacional e de pessoal para receberem os convidados? As praças, ruas e avenidas estão conservadas e chamativas ao passeio dos nossos visitantes?

Por certo que não. As propagandas governamentais, em sentido outro, tentam demonstrar efetiva tranquilidade nestas realizações mínimas necessárias para um evento de tal porte. Mas a realidade visual é outra. Por mais anfitrião que seja o brasileiro, a copa não passa da sala, posto que o cidadão foi colocado de lado, sem direito a participar, a opinar, a ser escutado nos quesitos que haverão de precisar de sua participação, pois o Poder Público pensou em obras rápidas, em verticalização em profusão, mas se esqueceu de convidar o povo para a rodada de discussão.

Rios de dinheiro são gastos. Mas os itens acima relacionados deixam muito a desejar, para este e outros eventos que aqui queiram realizar. O povo sabe disso. A sociedade vive esta incerteza, quando sequer sabe se conseguirá pagar o ingresso para ver ao menos um dos jogos. Os preços são abusivos. O cidadão pode até não assistir ao espetáculo, mas vai pagar a conta final, como bom contribuinte que é. Estejam certos.  

Então, como visto a copa não passa da sala, mesmo porque a faxina está sendo feita apenas neste ambiente, e esqueceram dos outros cômodos da casa e a despensa da cozinha está vazia. As cidades carecem de segurança, de mobilidade urbana, de hospitais, de metrô, de controle de preços e de qualidade nos serviços públicos. A continuar assim, lamentavelmente a copa não passa da sala, porque a casa está desarrumada e não convidaram o povo para ajudar na arrumação.

Somente com muito equilíbrio o cidadão brasileiro vai à sua custa ser educado e anfitrião, proporcionando o bem-estar dos convidados e, depois, terminada a copa, se preparando para pagar a salgada fatura do evento relâmpago chamado de copa do mundo de 2014. Fica, no entanto, a torcida para que tudo se realize a bom termo, mas muito incomoda a ideia de que a copa não passa da sala, e isso não é nada educado por parte do poder público responsável.

Wilson Campos (Advogado). 

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