IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS EM RAZÃO DA PANDEMIA.

 

            “Uma visão político-social emergente”

 

Haja vista que, no Brasil, o imposto sobre grandes fortunas é um tributo que está previsto na Constituição da República, desde a sua promulgação, mas ainda sem a devida e sistemática regulamentação, vez ou outra o tema volta à tona e o Congresso se adianta na proposição de projetos para taxar as grandes fortunas. No entanto, esse ímpeto tributador se arrefece em poucos dias.

 

A população brasileira sabe muito bem que o Congresso tem o chamado “fogo de palha”, cuja duração é curta. Ou seja, os nobres congressistas surtam de repente e começam a querer tributar tudo que encontram pela frente, principalmente quando a esquerda sai do casulo, mas essa empolgação é passageira e tudo volta a ser como dantes no quartel de Abrantes.

 

Se, por um lado, a tributação das grandes fortunas pode ser uma saída emergencial para amenizar a crise econômica e servir de combate à pandemia do novo coronavírus (Covid-19), por outro, a fuga de capitais, de dinheiro e de investimentos é uma medida que pode ser adotada pelos banqueiros, empresários ricos e milionários de maneira geral. Ora, quem tem dinheiro, algo acima de R$50 milhões, não vai se sujeitar a pagar impostos aqui se ali em outro país vizinho ou bem próximo não existe a taxação.

 

Um sujeito bem típico por aqui, com trânsito livre nos gabinetes e nos corredores do Congresso, de fala coloquial e sempre bem vestido, é o conhecido lobista. O sistema financeiro usa essa pessoa na defesa dos seus interesses sem o menor pudor, valendo dizer que, entre tantos outros, o lobby dos bancos é o maior. Daí a explicação da forte resistência de banqueiros e grandes empresários à criação de tributo sobre fortunas.

 

A influência de certos setores no Congresso é uma verdade indiscutível, lamentavelmente, posto que os parlamentares se tornam submissos e simples realizadores das vontades de grupos poderosos. Os líderes do sistema bicameral sequer se propõem a discutir avanços dos projetos de tributação das grandes fortunas, e o medo está deliberadamente incrustrado no vil metal, que financia suas campanhas e faz se concretizar o sonho de serem reeleitos para deputados ou senadores.

 

A percepção popular, até dos mais acomodados, é no sentido de que, nesta hora difícil, em razão da pandemia, a contribuição de quem tem mais dinheiro e bens disponíveis poderia ser a solução para reduzir o déficit bilionário que mergulhará cada vez mais o Brasil no abismo até a chegada da vacina e o fim do coronavírus. Mas tudo indica que os mais ricos e os congressistas não estão se comovendo com o trágico panorama. Alguns pensam que, quanto pior, melhor.

 

No entanto, cumpre registrar, em nome da urbanidade mundial ainda existente, que alguns grupos de bilionários internacionais já se sensibilizam com os níveis de desigualdade e concentração de riqueza e admitem a necessidade de maior tributação de grandes fortunas. Essa ideia surgiu no Fórum Econômico de Davos, na Suíça, e ganha corpo mundo afora, mas sem a concretização indispensável. Portanto, faz-se necessário um esforço global dos governantes para que a cobrança de impostos dos muito ricos seja uma realidade e não uma utopia.  

 

No caso concreto do Brasil, ao meu sentir, talvez a solução adequada não seja a de tributar as grandes fortunas, simplesmente por tributar. Outras medidas menos polêmicas podem ser adotadas, como uma tributação maior sobre ganhos elevados de capital, heranças de grande porte e ricas propriedades, uma vez que se mostram menos nocivas e podem diminuir a concentração de renda e reduzir as desigualdades, em que pese já serem tributadas e não justificar mais incidência de impostos nessas três categorias de bens. Assim, ao que parece, a tributação de fluxo se apresenta mais aceitável do que a taxação de riqueza, aos olhos da solução emergente. Todavia, deixo bem claro que sou contra a criação ou o aumento de tributos, posto que a carga tributária que nos sobrecarrega é uma das maiores do mundo, sem a contrapartida do serviço público adequado. 

 

Para os esquerdistas, sempre intolerantes quando não estão no poder, cobrar impostos sobre as grandes fortunas é uma premissa social. Entretanto, quando governam, não se preocupam e tocam o barco sem dar solução para um caso tão emblemático. Falar é fácil, mas o difícil é fazer bem feito, dentro da legalidade e de forma transparente. Essa é a lição que a esquerda precisa aprender, pois, nem sempre a demagogia supera a falácia, embora ambos sejam deploráveis para a sociedade.

 

De sorte que, o recomendável, sem esgotar o assunto e sem entrar nas nuanças tributárias do tema, passa pelo recomeço dos trabalhos do Congresso, sem mais delongas, com a tarefa e a missão de emplacar as reformas tributária e administrativa, acabando com a burocracia festiva de centenas de tributos e com os privilégios do funcionalismo público, respectivamente. Para aquele que possui menor renda, o correto é cortar imposto. Para o equilíbrio fiscal do país, o correto é começar pelo fim das mordomias de seletos grupos de funcionários públicos que estão no topo da pirâmide.

 

Enfim, o remédio é não piorar o quadro clínico do paciente. Adotar um tributo que poderá causar a fuga de patrimônio do país é um tiro no pé. O momento agora, diante da insistência dramática da pandemia, é de fazer as reformas tributária e administrativa e conclamar energicamente os maiores setores empresariais a colaborar no combate à miséria, à fome, à pobreza, ao desemprego e à crise econômica instalada. Não é hora de afugentar ativos valiosos, em razão de que a fuga de capitais e de patrimônios não trará benefício algum à população brasileira.

 

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).

 

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Comentários

  1. Marcelo Mascarenhas F.6 de novembro de 2020 às 17:49

    Pensando bem é isso mesmo. Permitir a fuga de capitais é péssimo para o país e não ajuda em nada os mais necessitados e nem gera empregos. As reformas trib. e adm. são pra ontem. No mais assino embaixo com o senhor Dr. Wilson Campos. Ótimo raciocínio e muito bom artigo tributário da sua excelente lavra. Informo que eu estou mais na roça, na fazenda e vejo a dificuldade da produção de grãos, é muito trabalhoso, mas gosto muito e só vou voltar para a construção assim que passar a pandemia, e assim vou levando os dois negócios e pagando impostos. Precisamos Dr. Wilson da reforma tributária depressa, já. Esse Congresso precisa trabalhar mais e falar menos. Abraço fraternal. Marcelo Mascarenhas.

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  2. Ótimo texto. Melhor reflexão.
    Impostos sobre herança já eexistemo estado cobra o seu quinhão.
    Impostos sobre trabalho, salário e ganhos de capital também já existem.
    Probidade, retidão, ética, eficiência, eficácia, responsabilidade, capacidade, espírito público?! Ah! Estes "insumos" faltam, principalmente onde abundam as cuecas.
    Antônio Ermírio de Moraes era um dos homens mais ricos do Brasil. Sábio, de hábitos humildades, tinha sua fortuna investida na indústria de transformação, papel e celulose e na filantropia.
    No Brasil, o problema não é falta de dinheiro, o que falta eu já citei acima: Competência e vergonha na cara, hoje extensível às cortes superiores do judiciário.

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  3. Também acho que cobrar tributo sobre as fortunas pode ser um erro porque esses milionários retiram seu dinheiro e patrimônio daqui e levam para outro país. O que ganhamos com isso? Nada e ainda perdemos investimentos dos que partiram. O problema é complexo. A reforma administrativa é uma saída mais correta porque pode acabar com super salários, despesas gigantes e improbidades de funcionários públicos desonestos.
    Meu jeito de pensar é esse e assim concordo com a sua opinião no artigo.
    Parabéns pelo tema e pela explicação Dr. Wilson. Att: Mirna Vaz.

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