LIMITES À DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.

 

Nos termos do inteiro teor do Projeto de Lei (PL) nº  3.401/2008, consta ali que se trata de medida de natureza eminentemente adjetiva, que pretende estabelecer regras processuais claras para aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, além de assegurar o prévio exercício do contraditório em hipóteses de responsabilidade pessoal de sócio por débito da pessoa jurídica.

Consta também do PL que não se pretende estabelecer pressupostos materiais ou mesmo limitar as hipóteses em que a desconsideração da personalidade jurídica pode ocorrer, mas, tão somente,  instituir um rito procedimental, aplicável a toda e qualquer situação onde seja necessário “levantar o véu” da pessoa jurídica, de modo a trazer segurança e estabilidade às relações jurídicas empresariais.

De sorte que o referido PL foi enviado à sanção, mas resta evidente que limita o procedimento conhecido como desconsideração da personalidade jurídica, pelo qual se pode cobrar dos sócios ou responsáveis obrigações da empresa. Ademais, segundo o texto aprovado, a desconsideração da personalidade jurídica poderá ser usada quando ficar caracterizada a ocorrência de manobras ilícitas, por parte dos proprietários das empresas, para não pagar os credores, situação na qual seus bens particulares serão usados para pagar os débitos.

De autoria do ex-deputado Bruno Araújo, o projeto já havia sido aprovado pela Câmara em 2014. No último dia 22, os deputados rejeitaram em plenário um substitutivo do Senado para o projeto. A redação da Câmara é um substitutivo do relator pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio, deputado Danilo Forte. Ou seja, o projeto de lei tramita no Congresso há 14 anos e pode vir com lacunas que vão causar confusão na interpretação quando em face de outros dispositivos legais no mesmo sentido.

Todavia, apesar de a possibilidade ser prevista em lei, não há hoje um trâmite específico para ela. O projeto institui um rito procedimental, assegurando o prévio direito ao contraditório em hipóteses de responsabilidade pessoal do sócio por dívida da empresa. Pergunto: o contraditório não é constitucional ou foi negado alguma vez para casos semelhantes?

Dispõe o PL que o prazo para os sócios apresentarem defesa é de 15 dias, contados da intimação. Em requerimento específico, deverão ser detalhados os atos que motivaram a responsabilização do sócio. Portanto, essa indicação deverá ser feita por quem propuser a desconsideração da personalidade jurídica ou pelo Ministério Público. Além disso, o juiz não poderá decidir a questão antes de assegurar o direito amplo de defesa. Nesse ponto entendo ser importante lembrar que já existem o artigo 178, do CPC; o artigo 127, da CF; e a Lei 13.874/2019.

Outrossim, segundo o PL, os sócios ou administradores terão ainda o direito de produzir provas, e o juiz somente poderá decretar a desconsideração depois de ouvir o Ministério Público. Ora, que eu saiba nada disso foi obstado alguma vez, mesmo porque os advogados estão atentos aos detalhes dos direitos de seus clientes. O PL melhorou alguma coisa, mas nem tanto e nem para todos.

Difícil de constatar ou de provar é o fato de que, caso a medida seja decretada, ela não poderá atingir os bens particulares dos membros, instituidores, sócios ou administradores que não tenham praticado ato abusivo em prejuízo dos credores da pessoa jurídica e em proveito próprio. Aqui os advogados terão trabalho dobrado, e isso vai depender do lado que representem.

E como diz o ditado: “pau que dá em Chico dá em Francisco”. Daí que, pelo texto, as decisões da administração pública sobre desconsideração da personalidade jurídica também ficam sujeitas a decisões judiciais. Pela legislação atual, um processo administrativo poderia chegar à desconsideração como ocorre em Juízo, mas sem os procedimentos elaborados na nova proposta.

Em suma, o PL pretende disciplinar o procedimento de declaração judicial de desconsideração da personalidade jurídica e dá outras providências. Contudo, há que se esperar que os Juízos sejam bastantemente equilibrados na hora da decisão, sem danos díspares e obtusos às partes, posto que existem outras leis e outros dispositivos legais em vigor, que tratam da responsabilidade dos sócios.

Note-se, por exemplo, que há a possibilidade de entendimento de que, na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio seja restrita ao valor de suas quotas, mas se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária. Portanto, cada caso é um caso, e o caso concreto deve ser analisado com cuidado pelo Juízo e acompanhado de perto pelos advogados.  

Para os leitores que gostam de conhecer a origem do debate, basta que acessem ou cliquem: PL 3401/2008 Inteiro teor 

Fonte: Informativo de Notícias da Câmara dos Deputados. 

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Mendonça & Associados JKL30 de novembro de 2022 às 16:52

    Brilhante o artigo, em boa hora, e os entendimentos do doutor são pertinentes e despertaram minha curiosidade para leitura dos citados dispositivos legais e leis.
    Excelente, colega causídico Dr. Wilson Campos. Abr. Mendonça e Ass.

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  2. Dr Wilson, no Brasil tem muita empresa com capital pequeno mas os donos são ricos. Empresas entram em falência, mas seus proprietários ficam ricos. Com essa nova lei até provar ilicitude dos sócios o dinheiro some e ninguém acha. Essa lei favorece o devedor PJ e prejudica o credor PF.
    Dr Wilson Campos suas observa são corretas. Parabéns. At: 3S Adv Assoc.

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  3. Esse é o tipo de assunto que requer participação da OAB, mas a OAB fica quieta na sua política de esquerda e não preocupa com a advocacia de fato. Nos últimos anos a OAB só faz política e politicagem vergonhosa na defesa dos camisas vermelhas e se ajoelhando perante esses ministros de pouco saber jurídico do STF. Tudo uma vergonha. Esse PL 3401/2008 é velho demais (14 anos) e não pode vingar desse jeito e vai encontrar adversidades pela frente nas decisões de juízes de fato que detêm saber jurídico na 1ª e 2ª instâncias. Abraços dr. Wilson Campos e parabéns pelo excelente trabalho na advocacia que conhecemos e respeitamos e pelo BLOG de opinião. At: TDKV Advogados.

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