SEGURANÇA JURÍDICA.

Há alguns dias, o ministro da Saúde Alexandre Padilha vem se esmerando na repetição do seguinte discurso para a imprensa: "O governo já ganhou todas as medidas judiciais. Temos muita segurança jurídica do que estamos fazendo. Quem quiser pode fazer sugestões para aprimorar, agora não venham ameaçar a saúde da nossa população que não tem médico".

A preocupação do ministro se revela tardia, quando apenas depois das manifestações de ruas, com milhões de pedidos de saúde, educação, transporte e segurança, vem ele falar em médicos para a população. Ora, esse direito é constitucional, senhor ministro, e a nossa última e vigente Carta Magna foi promulgada em 05 de outubro de1988. Portanto, são, no mínimo, vinte e cinco anos de uma longa espera.

Ademais, a importação de médicos não equivale à solução requerida para o caso, mesmo porque de nada adiantam os médicos de língua estrangeira se aqui nos faltam os itens básicos, principais e urgentes, tais como hospitais, equipamentos, medicamentos, estrutura, investimento, valorização profissional e gestão pública.

Tal exame, segundo o raciocínio popular, leva ao entendimento de que a falta de médicos em determinadas localidades do país se deve ao fato constatável da inexistência de condições adequadas para o exercício da profissão, evidentemente necessárias para o tratamento dos pacientes e para o devido respeito à dignidade da pessoa humana. 

Aos conselhos regionais de medicina cabe sim o direito de contestarem a Medida Provisória do governo, editada para restringir o direito adquirido de provas de revalidação do diploma dos estrangeiros. Embora  o respeito aos direitos adquiridos não vede a sua restrição, a contestação é uma via natural do contraditório.

A segurança jurídica da qual se gaba o ministro, em verdade se apresenta primeiro a favor das pessoas, uma vez que a estas cabe a necessidade da segurança em si mesmas, ou seja, uma espécie de segurança jurídica entre cidadãos, que somente depois alcança a estabilidade na relação entre particulares e o Estado. O fundamental, pois, é a proteção dos direitos para a segurança das relações jurídicas, de forma absoluta, e não simplesmente relativa.

Essa nova concepção defendida pelo ministro está incompleta. A segurança jurídica tem grande importância na proteção destinada aos cidadãos, no sentido de que as ações governamentais somente poderão ocorrer pela obediência às normas vigentes. Mudanças abruptas podem representar um risco para as garantias já consolidadas. A confiança depositada pelo cidadão no Estado não admite rupturas drásticas à segurança jurídica conquistada.

No artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição está disposto que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada". Implica um direito fundamental do cidadão que requer normalidade e proteção contra alterações bruscas numa realidade fático-jurídica, não cabendo ao Estado adotar comportamentos incoerentes e demagógicos.

O zelo pelo patrimônio jurídico dos cidadãos é de competência da Administração Pública, na liturgia dos seus atos administrativos, tal qual a eficácia da prevalência dos interesses dos administrados acima dos da administração. Portanto, a coletividade sempre espera que o Poder Público pratique atos lícitos, que não retirem a confiança, o direito , a garantia e a boa-fé dos cidadãos.  

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

(Este artigo mereceu publicação do jornal HOJE EM DIA, edição de 01/09/2013, domingo, pág. 26).
  

Comentários

Postagens mais visitadas