O AVESSO DO AVESSO BRASILEIRO
As ruas tomadas pelo povo quase nada têm a ver
com o que sucede em Brasília. A impunidade dos corruptos ainda é larga. O
antagonismo é grande. A ganância de poder maior ainda. As coisas só acontecem
no Congresso porque desde 2013 a voz rouca das ruas incomodam. Mesmo assim, as
mobilizações estão longe de ser um freio para os desatinos políticos.
Enquanto a política e
a politicagem se tornam o centro das atenções em um país tomado por uma grave
crise financeira, o foco principal e necessário fica relegado a segundo plano,
como é o caso da Medida Provisória instituindo profundas mudanças no ensino
médio no Brasil, que vai ser votada na Câmara
dos Deputados, sem ao menos os leigos parlamentares terem se detido na
importância da discussão.
Não sabem os
"nobres" representantes do povo que os jovens brasileiros estão
regredindo no ranking de leitura, matemática e ciências, segundo divulgação da Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que viabiliza comparação
internacional e avalia o sistema educacional de determinado país em relação aos
outros países. Ou seja, os políticos estão preocupados com os seus umbigos e
seus imediatismos. Esquecem por completo os motivos pelos quais foram eleitos -
cuidar dos interesses, dos desejos e das necessidades do povo.
O Brasil do "berço
esplêndido" e da "igualdade conquistada com braço forte", visto por muitos como
uma república das bananas devastada pela desonestidade e pela incúria, mais do
que nunca precisa do seu povo heroico na defesa da democracia e no combate à
corrupção.
Penso que o Brasil
não é uma república de bananas, mas a oligarquia política e empresarial desnudada
pela Operação Lava Jato quer fazer crer que ele seja.
Resistem por todos os
cantos os movimentos políticos para cercear investigações da Justiça e abrandar
leis que podem punir a corrupção.
Com certeza há muito
choro e ranger de dentes dos empoderados, que agora enfrentam a ameaça da perda
da qualidade de intocáveis.
Aos poucos o país
está mudando. Os escândalos de corrupção e as prisões de agentes públicos e
privados desde o mensalão e mais recentemente com a Operação Lava Jato demonstram
que algo de positivo está sendo feito na defesa de um país melhor para viver. A
busca séria e severa da sociedade organizada é pelo direito igual para todos,
com obediência das leis e cumprimento das obrigações.
No entanto, sempre
retorna à nossa mente o pensamento martirizante de que somos, de fato, uma
república de bananas. E isso se dá pela impressão deixada pela Câmara dos
Deputados que votou o afastamento de uma presidente que maquiou as contas
públicas, mentiu para o eleitorado e conviveu com roubalheiras. Ora, só numa
república de bananas esse processo emblemático poderia ser conduzido por
Eduardo Cunha, réu em processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF),
acusado de corrupção e lavagem de dinheiro. Daí a insistência retórica de que o
país merece a alcunha de república das bananas.
A corrupção endêmica
toma conta, aos poucos, da parte sadia do corpo combalido da nação brasileira.
A doença disseminada não tem cor, partido e nem ideologia. O mal causado requer
medidas drásticas e aplicação de remédio eficaz, que faça efeito sobre todos e
não apenas sobre alguns.
Eduardo Cunha foi
cassado. Dilma Rousseff sofreu impeachment.
Alguns políticos estão presos. Empresários também. Contudo, Renan
Calheiros, presidente do Senado, o mais expert
na arte da politicagem vem se mantendo no cargo, apesar de sabido que o STF
mantém em segredo o processo em que a Procuradoria-Geral da República o acusa
de peculato. Tanto Renan quanto Cunha estão no índice onomástico de acusados de
terem recebido propinas no escândalo exposto pela Lava Jato.
Mais que isso,
note-se que mais de uma centena de parlamentares respondem a processos no STF,
obrigando o cidadão a viver em dois mundos. Foi para a rua pedir a saída de
Dilma e descobriu com surpresa, posteriormente ao afastamento da presidente, que
blindou Eduardo Cunha e Renan Calheiros, por mais alguns meses nos respectivos
cargos.
O susto não para por
aí, uma vez que, estando Eduardo Cunha cassado e preso, resta ainda o outro,
Renan, que desobedece ordem judicial e se mantém na presidência do Senado,
embora decretado o seu afastamento do cargo por decisão do STF, a mais alta
corte do país. Renan se tornou réu por peculato e ministro do STF acatou pedido
para tirar o senador da linha sucessória da presidência da República.
O ainda presidente do
Senado, que se agarra ao cargo com unhas e dentes e por exclusivo
descumprimento da decisão judicial, conta com o apoio da mesa diretora da Casa
Legislativa, que resolveu não acatar a liminar da Suprema Corte e ainda por
cima colocou mais lenha na fogueira.
O crime de
desobediência do senador escandaliza o país. Os políticos da mesma linhagem o
protegem e a crise institucional se amplia. O caos instalado requer uma administração
democrática, mas que não seja de desmoralização do Supremo. Caso contrário, o
sistema político deixará de funcionar, embora este nunca tenha se preocupado
com os verdadeiros problemas da sociedade.
Todavia, configura-se no cenário governamental que o STF exagerou na medida, ou seja, usou de muito rigor com o senador. Parece brincadeira, mas não é. De fato, o STF volta atrás na sua decisão e entende que o senador Renan pode continuar presidente do Senado, desde que não esteja na linha sucessória da presidência da República. Trocando em miúdos, o senador desobedeceu a ordem judicial e ainda foi mantido no cargo. O colegiado do STF resolveu apaziguar os ânimos e fez pouco da decisão do ministro Marco Aurélio, fazendo rir os políticos da turma de Renan. Que coisa triste!
Os riscos no Brasil
são profundos - de perdurar o conturbado ambiente de 2016, abarrotado de crises
leves, graves e gravíssimas e da completa ingovernabilidade por um insanável
desentendimento entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Mais que isso, a PEC dos gastos públicos é aprovada e o congelamento de despesas por vinte anos vai afetar diretamente o povão, mas jamais chegará a incomodar os empoderados. A PEC não vai extinguir as mordomias do governo, porque o sacrifício esperado é somente do povo e não dos políticos. A PEC não congelará as benesses dos Três Poderes, porque os prejuízos morais e materiais serão unicamente do povo e não das autoridades do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário.
República de bananas - ser ou não ser, eis a questão!
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Wilson Campos
(Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).
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