A CRISE PENITENCIÁRIA NO PAÍS
O
artigo 144 da Constituição Federal assegura que a segurança pública é dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos e é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.
Muito
bonito no texto constitucional. No entanto, a eficácia desses termos deixa
muitíssimo a desejar, porquanto os cidadãos não estejam incólumes ou isentos de
perigo. Ao contrário, os cidadãos se encontram diariamente entregues à própria
sorte, desprotegidos e inseguros, uma vez que a criminalidade anda solta e
impune. Os cidadãos se trancam em casa, e os bandidos tomam as ruas e se
apossam de bens morais e materiais que não lhes pertencem.
O
dever da segurança pública é do Estado, embora o direito e a responsabilidade
sejam de todos. Ora, não é razoável que o Estado queira transferir para os
cidadãos a obrigação de manter a ordem. Essa atribuição é do Estado e das
respectivas polícias nomeadas no referido artigo 144.
As
recentes cenas de selvageria e mortes nas penitenciárias brasileiras têm
causado estarrecimento à população, tamanhas as atrocidades cometidas pelos
presos de determinadas facções criminosas, umas contra as outras. O Estado
perde o controle dos presídios. O horror ultrapassa as fronteiras nacionais. As
opiniões internas se dividem entre os brasileiros menos e mais informados. A
indiferença de uns se contrapõe à preocupação de outros. A sociedade, que já
enfrenta as crises política e econômica, agora se depara com a crise
penitenciária, que provoca um enorme corre-corre das incompetentes autoridades,
até então inertes e alheias.
O
caos se espalha país afora. Uma parcela da sociedade se indigna com as mortes
dos presos. A outra se indigna com as promessas governamentais de indenização
das famílias dos detentos mortos, sob a alegação de que as famílias das vítimas
não foram indenizadas e nem receberam pedidos de perdão do Estado ou dos
criminosos.
A
sociedade se divide no entendimento da presente situação, mas cosmopolita e
globalizada que é, diz nada ter a ver com o problema do país dos presídios
lotados, das milícias e do tráfico infiltrado no aparelho de segurança dos
Estados.
As
desculpas do governo, responsável direto, são indesculpáveis. A administração
prisional é dever do Estado e ponto final. Que se utilizem, então, os meios e
os rigores necessários na reeducação e na ressocialização dos presos, mas
também na indispensável estruturação e organização do sistema prisional. O
trabalho é uma forma de ocupar o tempo ocioso de quem muito tempo tem.
Trabalhar é reeducar, é ressocializar, é possibilitar a reintegração futura do
indivíduo na sociedade. Essa obrigação é estatal e não se fala mais nisso.
Enquanto
a solução adequada e humanamente necessária não chega, o governo federal manda
publicar decreto que autoriza uso das Forças Armadas em penitenciárias, diante
do agravamento da crise no sistema prisional no país, com a preliminar intenção
de executar varreduras em busca de armas, drogas e celulares. Depois, no estilo
lento costumeiro, o governo pretende estudar uma reforma que satisfaça o
sistema. Nesse ínterim, para operação das Forças Armadas nas prisões, os
governos estaduais devem fazer a solicitação. Nesse caso, a integração dos
órgãos de inteligência é fundamental para eficácia operacional do sistema de
segurança.
Em
que pese o esforço de última hora, a única certeza que se tem é a de que a
segurança pública desafia os Poderes do Estado. O que se vê é a extensão da
crise endêmica que o país assiste, há muito tempo, no devastado território dos
cárceres. Espaços com conhecidas limitações, esses depósitos de presos não dão
suporte efetivo à segurança pública. Suas populações são superdimensionadas. Transformaram-se
em escritórios regionais dos chefões e chefinhos de facções. O diagnóstico da
violência já é sabido por todos. Resta separar os participantes. Apagar a chama
econômica dos grupos marginais atuantes. Julgar 250 mil presos que esperam sentença
do Poder Judiciário. Cobrar com severidade uma efetiva ação estatal, sem mais
delongas ou desculpas esfarrapadas de autoridades afeitas aos holofotes.
A
rigor, não são apenas recursos financeiros que estão no cerne do problema. As
nuances existem e vão mais além, requerendo atitude e vontade do governo
federal. Evidente, as prisões precisam ser mais seguras, resistentes, estruturadas,
tecnologicamente equipadas. Mas falta um elo de comando e coordenação entre as polícias,
os agentes administrativos, as forças de segurança e as equipes de
inteligência. O que temos, hoje, é uma panela de pressão sob elevada
temperatura. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como entidades
da sociedade organizada devem manter permanente vigilância e procurar modelos de
administração carcerária em países que detenham experiência exitosa e
civilizada nesse sentido. Isso, sim, pode funcionar regular e adequadamente.
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Wilson
Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses
Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Especialista em Direito Tributário,
Trabalhista e Ambiental).
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