TAPETÃO, RUPTURA E DESEQUILÍBRIO TOTAL ENTRE OS PODERES.

 

Se alguém tinha dúvida, o Supremo Tribunal Federal (STF) acaba de saná-la. De fato, Lula tem forte poder de mando no STF, que vira seu aliado, declaradamente, ao derrubar o chamado Orçamento Secreto e ao abrir a caixa de Pandora para o gasto com o Bolsa Família, e ao deixar o Congresso de cara no chão.

Mas não pensem que isso é novidade para a população brasileira. Não é. Os cidadãos já perceberam há muito tempo que o STF está legislando no lugar do Congresso. E os cidadãos também enxergaram que o Congresso é fraco, sem personalidade, sem coragem e sem apego às suas funções institucionais e constitucionais. A Câmara e o Senado quase sempre tergiversam, não cumprem com suas obrigações legais e não legislam com efetividade. Ao contrário, gostam de criar dificuldades para vender facilidades.

Deputados e senadores foram derrotados nas suas intenções, e até mesmo o Centrão foi surpreendido. Os presidentes da Câmara e do Senado estão sob pressão, mas permanecem como antes, ajoelhados diante do STF e acovardados aos olhos do povo. Aliás, o povo está tão decepcionado com a covardia do Congresso, que não mais considera que o país tenha um Poder Legislativo, tamanha sua insignificância.

O Poder Judiciário, via STF, volta a tomar para si as competências de outros poderes e o faz de forma bastante acintosa e leiga, ignorando preceitos básicos da economia em nome da necessidade (real, não se pode negar) de garantir renda aos brasileiros mais vulneráveis.

O Supremo derrubou o Orçamento Secreto por 6 votos a 5. A decisão representa mais uma derrota para o Congresso. Rosa Weber, Fachin, Barroso, Fux, Lewandowski e Cármen Lúcia defenderam a extinção do mecanismo. Já Alexandre de Moraes, Nunes Marques, Mendonça, Dias Toffoli e Gilmar Mendes consideraram legais as emendas do relator, embora tenham sugerido a adoção de medidas de transparência. Em suma, a decisão é a de que o Orçamento Secreto é inconstitucional.

Para quem não sabe ainda os pormenores do imbróglio e do que se trata, a explicação é simples. O plenário do STF formou maioria pela inconstitucionalidade das emendas de relator, também chamadas de emendas de RP9 e conhecidas como Orçamento Secreto. A decisão aconteceu nesta segunda-feira, 19, com voto do ministro Ricardo Lewandowski, que destacou que, apesar dos recentes esforços, com a aprovação da resolução 3/2022, o “Congresso Nacional não conseguiu se adequar no que tange os parâmetros constitucionais”.

Citando texto aprovado no último dia 16, que criou novas regras para distribuição e transparência para as emendas, o magistrado defendeu que, apesar de representar um significativo avanço, “não foram adotadas todas as providencias necessárias para adequada transparência”, o que torna o modelo inconstitucional.

“Embora a distribuição seja menos arbitrária, ela não será equânime como ocorre nas emendas individuais, alguns continuarão recebendo mais ou menos e o líder poderá distribuir os recursos, abrindo espaços para barganhas políticas”, defendeu o ministro. E como já informado logo acima, o julgamento foi encerrado com placar de 6 votos contrários ao Orçamento Secreto e 5 favoráveis, impondo uma derrota ao Congresso Nacional, que defendia a constitucionalidade e manutenção do modelo.

Não bastasse essa pernada, o STF preparou outra jogada de mestre e acertou em cheio, de novo, o Congresso, esse elefante branco, paquidérmico, caro, preguiçoso, incompetente e inservível. Desta vez, o ministro Gilmar Mendes abriu espaço para o futuro governo de Lula ultrapassar o teto de gasto no pagamento do Bolsa Família. Com isso, percebeu-se que há um cheiro de ação coordenada entre a decisão de Gilmar e a decisão do pleno do STF que considerou inconstitucional o Orçamento Secreto.

Segundo a imprensa, na véspera, Gilmar Mendes preparou o terreno para diminuir o espaço de chantagem do Congresso - leia-se especialmente o presidente da Câmara, Arthur Lira. No dia seguinte, a Corte derrubou o principal instrumento de poder do mesmo Lira. A tabelinha ficou clara. A ação coordenada dos pares do STF funcionou. O Congresso perdeu, mais uma vez.  

Voltando alguns minutinhos no tempo, a PEC Fura Teto, que havia passado pelo Senado com bastante folga, não estava recebendo o mesmo tratamento na Câmara dos Deputados, onde alguns parlamentares estavam colocando óbices interesseiros. Mas a resistência não era pelo teor da proposta, que exige um cheque acima do razoável por um período também acima do razoável. Os motivos que empacavam a tramitação eram bem mais sórdidos, como a vergonhosa briga por cargos no futuro governo Lula e o destino - agora definido - do Orçamento Secreto. Percebendo que a PEC corria risco, a Rede Sustentabilidade (partido político nanico de esquerda) fez o que sabe fazer de melhor: no fim da semana passada, pediu ao Supremo que simplesmente retirasse o Auxílio Brasil (ou Bolsa Família, como voltará a ser chamado) do teto de gastos, o que o ministro Gilmar Mendes atendeu, dando a Lula um enorme presente de Natal antecipado. A gastança pública foi liberada.

Como visto, um partido nanico, incapaz de conquistar uma parcela decente do voto popular para ter representatividade relevante no Congresso, segue buscando o Supremo Tribunal Federal para conquistar na canetada o que não consegue pela via legislativa. Isso é uma vergonha para o Congresso, para o STF e para o partido político nanico. Todos na contramão do que é certo e necessário para o país.

Lamentavelmente, sempre existirão ministros do Judiciário dispostos a atender tais pedidos de parlamentares de partidos nanicos de esquerda, fazendo-se de legisladores e atropelando os 513 deputados e os 81 senadores eleitos pelo povo, definindo políticas públicas, de questões sanitárias a política migratória, e passando, como de fato passaram, pelos dois casos retrocitados, o do Orçamento Secreto (agora inconstitucional) e o do Bolsa Família (agora de porteira aberta para gastar).

O controle fiscal foi para o espaço. A partir de agora o dinheiro para o Bolsa Família pode brotar por meio de medida provisória - uma solução que o petismo chegou a considerar, mas que hesitava em colocar em prática por não ter segurança jurídica sobre essa possibilidade –, mesmo que a PEC Fura Teto acabe naufragando.

Para permitir que Lula pague o Bolsa Família de R$ 600, o ministro Gilmar Mendes deu caráter absoluto ao artigo 6º da Constituição Federal, segundo o qual “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”, e cujo parágrafo único determina que “todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária”.

Diante desse entendimento, a segurança jurídica deixou de ser um princípio de previsibilidade e estabilidade. A legislação fiscal e orçamentária já não precisa mais ser observada. Basta a vontade de um ministro do Supremo para que ela se torne nula. O teto de gastos pode até não ser “um fim em si mesmo”, como argumentou Gilmar Mendes, mas é lei, é norma constitucional, cuja finalidade é trazer racionalidade ao gasto público, criando o clima de confiança que incentiva investimentos que geram emprego e renda para o brasileiro.

Se na decisão o ministro quisesse levar a sério a legislação fiscal e orçamentária, ele teria determinado que o Congresso encontrasse meios de bancar o benefício dentro do atual arcabouço fiscal, cortando outros gastos - e mesmo assim ele já estaria extrapolando suas funções, pois não cabe ao Judiciário elaborar o Orçamento da União. No entanto, ao simplesmente tirar o Bolsa Família do teto de gastos, o ministro atestou que a legislação fiscal de nada vale para ele.

Imaginem se essa liberalidade caminha para além do Bolsa Família e alcança outros benefícios ou outros programas sociais que se encaixam no caput do artigo 6º? Já pensaram no tamanho do rombo fiscal?

Preparem os bolsos, porque a boiada petista está solta e o pasto verde deixado pelo governo atual será consumido em poucos dias. A gastança já começou bem antes de Lula tomar posse, se é que subirá a rampa do Planalto.

Além do dinheiro já previsto, seriam necessários cerca de R$ 80 bilhões para viabilizar o Bolsa Família de R$ 600, enquanto a PEC Fura Teto liberaria cerca de R$ 150 bilhões ou mais. O volume de bilhões e bilhões vai depender do que vai acontecer depois de 1º de janeiro de 2023. E, por enquanto, só Deus sabe.

O tapetão, a ruptura e o desequilíbrio entre os Poderes são fatos incontestáveis, porquanto as decisões do Judiciário (leia-se STF) se dão na contramão das normas e das regras até então respeitadas. A insegurança jurídica é total. Ora, não tem como entender ou aceitar que grupos políticos sem força parlamentar busquem fazer valer suas vontades no âmbito do Judiciário e ganhem no tapetão; que o Judiciário tome para si as competências de outros Poderes, causando a ruptura, e o faça de forma acintosa e inescrupulosa, seja usurpando funções, desrespeitando os limites impostos pela Constituição ou ignorando preceitos básicos da economia, como se deu no caso concreto debatido.

A continuar assim, com esse Congresso de cócoras e com o queixo nos joelhos, as normas sociais, profissionais, econômicas, fiscais e constitucionais serão cada vez mais violadas. Os gastos públicos imensos e ilimitados, sem parâmetros e sem controles de responsabilidade, ressurgirão e resultarão em recessão, como é do conhecimento dos brasileiros, uma vez que desastres semelhantes aconteceram e não tem muito tempo.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Noel e Sheila Castilho20 de dezembro de 2022 às 14:57

    O artigo Dr.Wilson é excelente.Estamos assustados com o que pode acontecer, a falta de recursos públicos para obras, o excesso de gastos, a quebradeira de empresas públicas que vão virar cabide de empregos dos petistas, etc, etc.
    Estamos muito preocupados com o que pode acontecer depois de 1º de janeiro. Só Deus para nos proteger. Agradecemos ao senhor Dr. Wilson por mais uma aula de Brasil para nós. Estamos com o senhor e fechados com o Brasil. Abrs. de Noel e Sheila Castilho.

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  2. Tenho vergonha das instituições (todas) que aí estão jogando fora das 4 linhas. Tenho vergonha desse Congresso covarde.
    Tenho vergonha desses deputados e senadores que só votam a favor dos seus bolsos e interesses.
    Tenho vergonha das pessoas que votaram no Lula ex-presidiário.
    Tenho vergonha de ver a mesma turma petista de antes ser perdoada de seus crimes e voltar à cena do crime, como disse certa vez o Alkmin.
    Tenho vergonha de todos que não tem vergonha do que está acontecendo no Brasil.
    Dr. Wilson Campos meus parabéns pelos seus artigos patriotas e corretos sempre defendendo nosso povo e nosso país. Abr. Paulo J.S. Alves.

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