CASAMENTO DE PESSOAS COM IDADE ACIMA DE 70 ANOS.

 

O que valia antes, não vale mais. O artigo 1.641, inciso II, do Código Civil Brasileiro, que dispõe que é obrigatório o regime de separação de bens no casamento da pessoa maior de 70 (setenta) anos, passa a receber, a partir de agora, nova interpretação legal em razão da recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Vejamos o que dispõe o citado artigo de lei sobre o Regime de Bens entre os Cônjuges:

Artigo 1.641 - É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: [...] II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.344, de 2010).

A discussão sobre este tema suscitou reflexões de advogados e juízes sobre o limite da proteção jurídico-social assegurada ao idoso pela legislação. Não resta dúvida quanto à importância da autonomia, inclusive, no âmbito patrimonial, para a construção de uma vida plena, por meio da qual será assegurada a efetivação do direito à liberdade e à dignidade da pessoa idosa, sem qualquer discriminação ou presunção de incapacidade.

No entanto, vale ressaltar que não se está a dizer que não existam pessoas oportunistas que procuram tirar proveito econômico de casamento com o idoso. Ora, pessoas que se aproveitam da situação e ludibriam pessoas mais idosas são encontradas por toda parte. Porém, se ele pode vender, doar e dar a destinação que entender melhor ao seu patrimônio, o legislador não pode interferir e partir do pressuposto de que ele será sempre vítima de golpes a serem dados pela via do matrimônio.

Independentemente das situações possíveis de ocorrerem, o entendimento é no sentido de se preservar a liberdade individual do idoso. Portanto, o dispositivo do Código Civil sofreu mudança, mas existem algumas condições a serem observadas.

Daí a decisão do STF a respeito do assunto, divulgada no portal da Corte, a saber:

O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, nessa quinta-feira (1º de fevereiro de 2024), que o regime obrigatório de separação de bens nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoas com mais de 70 anos pode ser alterado pela vontade das partes. Por unanimidade, o Plenário entendeu que manter a obrigatoriedade da separação de bens, prevista no Código Civil, desrespeita o direito de autodeterminação das pessoas idosas.

Segundo a decisão, para afastar a obrigatoriedade, é necessário manifestar esse desejo por meio de escritura pública, firmada em cartório. Também ficou definido que pessoas acima dessa idade que já estejam casadas ou em união estável podem alterar o regime de bens, mas para isso é necessário autorização judicial (no caso do casamento) ou manifestação em escritura pública (no caso da união estável).

Nesses casos, a alteração produzirá efeitos patrimoniais apenas para o futuro.

Vedação à discriminação

Relator do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1309642, com repercussão geral, o ministro Luís Roberto Barroso (presidente do STF) afirmou que a obrigatoriedade da separação de bens impede, apenas em função da idade, que pessoas capazes para praticar atos da vida civil, ou seja, em pleno gozo de suas faculdades mentais, definam qual o regime de casamento ou união estável mais adequado. Ele destacou que a discriminação por idade, entre outras, é expressamente proibida pela Constituição Federal (artigo 4º).

No processo em análise, a companheira de um homem com quem constituiu união estável quando ele tinha mais de 70 anos recorreu de decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que negou a ela o direito de fazer parte do inventário ao aplicar à união estável o regime da separação de bens.

Segurança jurídica

No caso concreto, o Supremo negou o recurso e manteve decisão do TJ-SP. O ministro Barroso explicou que, como não houve manifestação prévia sobre o regime de bens, deve ser ao caso concreto aplicada a regra do Código Civil. O ministro salientou que a solução dada pelo STF à controvérsia só pode ser aplicada para casos futuros, ou haveria o risco de reabertura de processos de sucessão já ocorridos, produzindo insegurança jurídica.

Modulação

Para casamentos ou uniões estáveis firmadas antes do julgamento do STF, o casal pode manifestar a partir de agora ao juiz ou ao cartório o desejo de mudança no atual modelo de união, para comunhão parcial ou total, por exemplo. Nesses casos, no entanto, só haverá impacto na divisão do patrimônio a partir da mudança, não afetando o período anterior do relacionamento, quando havia separação de bens.

A proposta de modulação foi feita pelo ministro Cristiano Zanin em respeito ao princípio da segurança jurídica, para que a mudança passe a valer somente nos casos futuros, sem afetar processos de herança ou divisão de bens que já estejam em andamento. O ministro Barroso, então, incluiu em seu voto que “a presente decisão tem efeitos prospectivos, não afetando as situações jurídicas já definitivamente constituídas”.

A tese de repercussão geral fixada para Tema 1.236 da repercussão geral, é a seguinte:

“Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no artigo 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes mediante escritura pública”.

DATA VENIA, ao meu sentir, o Judiciário está adentrando competência do Legislativo. Ora, o Congresso deveria ser ouvido antes e se manifestar a respeito de tema tão complexo e polêmico.

Alguém poderia questionar: Essa mudança não estaria atendendo a interesses de certas pessoas, pontualmente? Lula se casou com Janja aos 76 anos de idade. A cerimônia de casamento foi em 18 de maio de 2022; ela com 55 anos e ele com 76. Não parece muita coincidência a situação do casal e o possível interesse em mudar a norma legal?      

ENFIM, diante do exposto, conforme a mudança determinada pelo STF, a regra passou a ser outra, embora as condições devam ser observadas. O Supremo decidiu que a separação de bens deve ser facultativa, aplicável apenas quando não for manifestada a vontade dos noivos. Ou seja, privilegiou-se a liberdade e a vontade da pessoa idosa, sem discriminação pela idade.

De fato, é inadmissível qualquer intervenção do Estado no âmbito da vida privada, de cunho prevalecente patrimonial, disponível, determinando-se uma restrição injusta e antidemocrática ao idoso, impedindo-o de gerir livremente seu patrimônio. Mas reitero que as condições da nova regra devem ser obedecidas.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021). 

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Comentários

  1. Obrigado doutor Wilson Campos advogado, pois meu pai quer casar de novo aos 75 anos e essa mudança vai colocar meu pai mais consciente do que pode vir por aí. Eu acho que o idoso de 75 anos ainda está muito bem das suas faculdades mentais e pode sim decidir o que fazer dos seus bens mas as exceções da nova norma deve sim ser respeitada. A família do idoso é a melhor conselheira e com a ajuda da lei as atitudes podem ser bem tomadas. Valeu doutor Wilson. - Grande e forte abraço meu caro. Flávio Duarte (eng. e empresário).

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  2. Maria Alice Gramont S. R. P.2 de fevereiro de 2024 às 15:46

    Excelente o artigo e acho que o STF errou porque o idoso quando fica apaixonado por uma novinha ainda tinha essa trava nos seus bens, da separação, mas agora ele podendo decidir sozinho, muitos idosos vão servir de enriquecimento de muita mulher interesseira que só quer viver as custas do idoso e esperar para curtir depois que ele morrer ainda mais se a diferença de idade for grande de 70 x 25 por exemplo. Já pensou? Dr. Wilson seu artigo me ajudou muito e entendi facinho tudo e espero que a exceção da regra seja uma barreira para as oportunistas. Abraços professor e mestre Dr. Wilson. Att: Maria Alice Gramont

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  3. Matheus P. D. de Almeida2 de fevereiro de 2024 às 15:49

    A nova regra determinada pelo STF está correta e a pessoa com 70 anos ou mais pode decidir o que fazer com seu patrimônio e casar sim de novo e viver feliz até quando der. Excelente e tamos juntos. Dr. Wilson gratidão pelas informações sempre excelentes e que atualizam a gente. Matheus P.D. de Almeida.

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    1. Tema bastante interessante, mas, muito delicado. Falta um pouco p/ chegar nesta idade e, c/ isso, terei tempo p/ avaliar as decisões e seus resultados, daqueles que passarão pela experiência. Ótimo artigo!

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  4. Bom, leigo sou, então fica a minha impressão:
    Tem uma lei que determina a separação de bens e não cabe outras interpretações.
    A mudança na lei deve passar pelo parlamento e não pelos desejos de juízes.
    Nada impede que um casamento com separação de bens, que o casal compartilhe esses bens e bem mesmo de deixá-los em herança.

    Aí vem a interpretação de que, se o casal já estava casado em regime de separação de bens e tiver mais de 70 anos, o casal poderá manifestar esse desejo, porém precisa da ordem de um juiz.

    Aqueles que querem casar a partir dessa decisão, simplesmente precisam formalizar esse desejo em cartório.

    Para mim, parafraseando Dr. Wilson, "ao meu sentir", muita interferência na vida dos outros, regras demais, judiciário demais, gastos demais, justiça de menos.

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  5. Cristóvão Albuquerque3 de fevereiro de 2024 às 14:21

    Dr. Wilson, o meu sogro tem 72 anos e vai casar de novo com uma mulher mais nova, mas com separação total de bens, mas agora a cantiga mudou porque ela ficou sabendo na redes sociais obre essa nova lei de poder casar com regime de comunhão de bens mesmo com mais de 70 anos. A coisa vai desandar no meio da família porque os herdeiros não vão querer isso de jeito nenhum. Outra coisa, nas redes sociais eu li que a Janja pode ter mandado esses ministros do STF fazer isso para facilitar o lado dela na comunhão de bens milionários ou bilionários do Lula. O socialista comunista que tem bilhões é o Lula. Vai ter de dividir agora. Dr. Wilson abraços e gratidão pelos ótimos textos. At. Cristóvão A. S. L. Albuquerque.

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