A CRISE É DE CARÁTER
Parece que a vida não nos quer livres da angústia e
da desesperança, nem sequer por pequenos momentos. O alívio que nos chega é tão
passageiro que a aflição não abandona o nosso corpo. Somos reféns da
cretinice e da vergonha alheia, cujas definições exatas são impróprias para este espaço e para a leitura
dos cidadãos de bem.
Causa engulhos e revolta ver o desplante dos sem-caráter que, de forma acintosa, praticam os mais ignóbeis atos de canalhice,
próprios dos energúmenos que não temem a lei e que se safam graças à impunidade
e à impunibilidade que grassam sob a encolha sorrateira dos cúmplices, que facilitam
o cometimento de crimes e dividem o butim.
Enquanto o povo ordeiro e trabalhador dorme o sono
dos justos e inocentes, os delinquentes, travestidos de personalidades, corrompem
o sistema e, madrugada adentro, tecem as mais sórdidas teias para o
aprisionamento da ética, da lisura e da probidade. E deixam livres a
imoralidade, a desonestidade e a vilania.
O cárcere para onde deveriam ir todos os infames
malversadores do Tesouro serve, na maioria das vezes, para retirar a fórceps a
dignidade dos comuns e manter os menos possuídos e os desgraçados a ferros. E assim
caminha a desumanidade, com a população alienada e isolada do que seja, de
fato, o conceito de cidadania.
Os métodos da pusilânime medida retrógrada de
servir-se do povo carregam a máxima popular de que temos leis para tudo, menos
para os criminosos de colarinhos multicolores, quase sempre protegidos pela
carapaça rígida da corrupção irrefreável, acobertada pelos solertes calhordas
de plantão.
O cinismo e a incompetência andam de braços dados
nas terras de ninguém. As promessas e as bravatas pululam antes e depois das
eleições. As promessas em pouquíssimo tempo são varridas para debaixo dos
tapetes. As bravatas, ao contrário, são regozijadas pelos bajuladores, arautos
e servis membros da seleta turma corporativista que bebe, come e dorme a
expensas dos contribuintes, já sopesados pela cruel, escorchante e irreformável
carga tributária.
Traz indignação ler as notícias sobre o
enriquecimento sem causa na política, os desvios na Petrobras, o financiamento
de obras não autorizadas em países estrangeiros, a falta de verbas para
infraestrutura, aeroportos, portos, metrôs, escolas, hospitais e segurança
pública no país, a negligência criminosa com o Anel Rodoviário de Belo
Horizonte e com as rodovias estaduais e federais, o descaso e a arrogância das
autoridades que governam para si, e não para o povo, o extermínio gradual do
meio ambiente, a escassez de água que assusta a todos e, por fim, a degradante
continuação da falta de caráter, que resulta sempre na impunidade, porquanto o
povo tenha memória curta e não exija o efetivo cumprimento da Constituição.
Causa tristeza falar para as paredes, assistir a tudo
isso e muito mais e não poder deletar da vida pública os autores das
ilicitudes, colocar na cadeia os ladrões de vidas e banir da sociedade os
destruidores de sonhos.
Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).
(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de sábado, 26/09/2015, pág. 19).
(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de sábado, 26/09/2015, pág. 19).
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