O MEIO AMBIENTE E O PERICULUM IN MORA.



Tornou-se um símbolo de luta cívica em Belo Horizonte a defesa da Mata do Planalto, uma extensa área verde típica do Bioma Mata Atlântica, localizada no bairro Planalto, zona norte da capital, de aproximadamente 120 mil metros quadrados, que conta com exuberantes fauna e flora, além de 16 nascentes, mas que se encontra ameaçada de extinção, dada a licença concedida pela prefeitura para a construção de 16 prédios de 16 andares, 760 apartamentos e 1.016 vagas de estacionamento, nos terrenos da importante área ambiental.

A questão que envolve a Mata do Planalto está judicializada por meio de Ação Civil Pública e Ação Popular, sendo que, em ambas as ações, preliminarmente, a decisão em primeira instância foi de indeferimento dos pedidos de medida liminar inaudita altera pars, por entendimento de que não restou caracterizado o periculum in mora (perigo em razão da demora). Os recursos foram interpostos pelos autores e os processos tramitam na segunda instância, dentro da normalidade, embora com acentuada morosidade, em detrimento da urgência dos julgamentos que as demandas requerem.

A rigor, data maxima venia, posto que as decisões judiciais não devem ser tardias, o periculum in mora, segundo os promoventes, restou demonstrado, consubstanciado na urgência de se conservar as características da Mata do Planalto, sob pena de se perder, de forma irreversível, seus atributos e sua indispensabilidade na manutenção do habitat de diversos seres vivos e na preservação do ambiente saudável para todos os moradores urbanos.

Por essas razões, o que mais importa é evitar a ocorrência de dano irreparável, principalmente nas ações versando sobre meio ambiente natural, mediante o exame das liminares, considerando que os riscos de graves lesões são iminentes e devendo ser orientado pelo brocardo in dubio pro natura (em caso de dúvida, deve-se beneficiar a natureza, o meio ambiente). Ou seja, no caso em debate é de se aplicar o princípio da prevenção, norteador da tutela do meio ambiente natural, cultural e artificial, e segundo o qual deve ser dada prioridade às medidas que evitem o surgimento ou continuidade do dano. Nesse mesmo sentido, a prevalência dos interesses difusos e coletivos deve ser interpretada acima dos interesses econômicos ou particulares.

O periculum in mora, fundado no dano irreparável ou de difícil reparação, mostra-se ainda mais evidente quando enfrentado o dano iminente à área verde em tela, que, se derrubada, jamais retornará ao seu status quo ante (voltar ao estado anterior), independentemente de condicionantes ou medidas mitigadoras, com a agravante irreconciliável de que as 16 nascentes de água pura que contribuem para o abastecimento da cidade, posto que as suas águas correm para o Córrego Bacuraus, que deságua no Ribeirão Isidoro e que integra a Bacia do Rio das Velhas, que, por sua vez, abastece a cidade, justamente quando se enfrenta uma crise hídrica sem precedentes, poderão ser aterradas e destruídas pelas obras.

Afora todos os argumentos retro citados, perfilam ainda os de que para se construir o mega empreendimento imobiliário será preciso impermeabilizar o solo, cujo processo impedirá a drenagem natural de água pluvial que alimenta o lençol freático. Os impactos serão imensos, numa região já adensada, de ruas estreitas, com excesso de veículos, de pouca infraestrutura, com déficit de escolas públicas e postos de saúde, somados aos efeitos negativos sobre os ecossistemas, a biodiversidade, o microclima e a qualidade de vida da população.

Em matéria de meio ambiente, torna-se, portanto, perfeitamente possível a antecipação da tutela pretendida, essencialmente de natureza preventiva, acudindo antes que a ameaça se converta em realidade. O papel do Poder Judiciário é, todavia, insubstituível, sopesando o periculum in mora face ao meio ambiente e mensurando com a régua da lei o direito que merece tutela e proteção.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

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