O AFASTAMENTO DA PRESIDENTE DILMA ROUSSEFF.



Governar um país é fácil. Difícil é conciliar as diferenças e atender as reivindicações, por mais díspares que sejam. Difícil é separar o joio do trigo. Difícil é mudar sem causar traumas. A democracia tem isso de parceria com o povo - a irresignação popular é um meio de provocar mudanças. Não há governo que permita fraudes, erros crassos e atos de irresponsabilidade que dure para sempre, assim como não é crível que exista uma sociedade que admita ad aeternum a espoliação da dignidade e a retirada da cidadania.

Tudo tem limites. Recentemente, ainda agora, o povo brasileiro teve mostras de mudanças e de alternância de poder, haja vista que a admissibilidade do processo de impeachment da presidente da República Dilma Rousseff foi votada e aprovada por 55 votos favoráveis no Senado Federal.

O afastamento de membros do poder é doloroso para uns e necessário para outros. O impedimento de um ou de uma presidente da nação sempre traz ganhos e perdas, para não dizer ganhadores e perdedores. O impeachment é um emaranhado de interpretações legais e a sequência do impedimento da presidente Dilma passa agora para uma segunda fase, uma vez que, daqui em diante, o processo seguirá presidido pelo atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski.

As iniciativas quase sempre começam com a insatisfação do povo, passam pelo Legislativo e terminam nas mãos do Judiciário. As decisões da Câmara e do Senado já fizeram-se valer. A presidente Dilma, a partir de 12 de maio de 2016 está afastada do cargo por até 180 dias - o máximo que poderá durar o processo de julgamento - período em que um novo parecer será elaborado, debatido e votado no Senado, buscando-se provas, ouvindo-se testemunhas e permitindo que a defesa e a acusação manifestem-se no processo.

Os procedimentos governamentais mudam rapidamente. A mudança de cadeira já se estabeleceu. No lugar da presidente Dilma assume, de imediato, interinamente, o vice-presidente Michel Temer. Será a 41ª pessoa a assumir a presidência da República.

A burocracia do impedimento é extensa. Veja-se que, ainda na fase processual, o processo volta para a Comissão Especial do Impeachment, instalada no Senado, quando deverá começar a fase de instrução, coleta de provas e oitiva de testemunhas de defesa e de acusação.

Dilma Rousseff é acusada de crime de responsabilidade, principalmente por editar decretos com créditos suplementares após enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei para revisão da meta fiscal, e alterar a previsão de superávit para déficit. A presidente afastada também é acusada das chamadas "pedaladas fiscais", com manobras do orçamento da União de forma que este orçamento mostrasse resultados diferentes dos aprovados, por meio de empréstimos travestidos de "adiantamentos" em instituições financeiras oficiais.

O processo de afastamento da presidente se transforma numa ciranda de egos e súbitas inflamações de políticos duvidosos. A correria parlamentar se verifica em todos os cantos do sistema bicameral. Os deputados e senadores procuram um lugar ao sol ou quiçá um lugar sob os holofotes da televisão. Os nobres senadores, agora julgadores, apresentam-se perfilados na formação de uma Comissão Especial que deverá elaborar um novo parecer no prazo de 10 dias. Este novo parecer será votado na Comissão e seguirá para votação em plenário. Caso seja rejeitado, Dilma reassumirá a presidência. Mas, em caso da aprovação do parecer, o processo continuará até a votação e julgamento final.

Entretanto, não há que se esquecer o contraditório da acusada. A presidente Dilma tem direito à ampla defesa e poderá apresentá-la em até 20 dias. A Comissão Especial poderá interrogá-la, mas ela terá a prerrogativa de comparecer ou não para responder às perguntas que lhe serão dirigidas.

A justiça é a mola mestra do julgamento. Os critérios devem obedecer a escrita rígida da lei. A decisão do Senado de submeter a presidente Dilma a um julgamento político é apenas o primeiro passo de um complicado trâmite processual que pode durar meses até que seja definido se ela será destituída de vez ou se recuperará o cargo executivo.

O governo interino precisa manter a máquina estatal ativa, a serviço da população. O lapso temporal de Michel Temer no poder pode terminar se Dilma for absolvida, mas no caso de sua destituição, o atual vice-presidente ou presidente em exercício completará o mandato que vence em 1º de janeiro de 2019. 

Nem sempre governar um país tão grande como o Brasil é tarefa simples. É fácil, mas não é simples. Exige seriedade. A vigilância e o cuidado com a coisa pública devem ser constantes. O imbróglio em que se meteu a presidente Dilma é grande e tem um trâmite processual que promete ser tumultuado. No entanto, o que importa é que, de fato, a Constituição da República seja respeitada.

Portanto, resumidamente, cumpre reiterar que, antes desses fatos derradeiros para Dilma no comando do país, a partir da próxima semana, a Comissão Especial integrada por 21 senadores que analisou os méritos jurídicos das acusações se reunirá para definir um calendário de trabalho para o julgamento político, no qual serão ouvidos os depoimentos da defesa e da parte acusadora. Poderão ser convocadas testemunhas que possam contribuir para a produção de provas, tanto a favor como contra Dilma, e será elaborado um relatório final com as conclusões do caso. Esse relatório será votado na Comissão e, em caso de aprovação por uma maioria simples, será encaminhado ao plenário do Senado, que em uma única sessão decidirá se a presidente será por fim destituída. Essa última sessão do processo, como acima informado, será dirigida a princípio pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski, mas como seu mandato termina em setembro, e se até lá o processo não tiver sido concluído, a condução ficará a cargo de sua sucessora, a ministra Cármen Lúcia.

Por fim, para aprovar o impeachment definitivo de Dilma é preciso maioria qualificada (dois terços dos senadores), ou seja, 54 dos 81 possíveis votos.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).




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