ADVOGADO AGREDIDO É INDENIZADO.



O cliente de um advogado deverá indenizá-lo em R$ 10 mil por danos morais, por ter agredido o profissional em seu escritório. A decisão da 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirma sentença da Comarca de Belo Horizonte.

O cliente requereu na Justiça indenização por danos morais relatando que, em meados de 2008, contratou o advogado para a elaboração de um recurso em uma ação de despejo e para o ajuizamento de uma ação de indenização, acertando o pagamento de R$ 1.500. Ele afirmou que apenas uma parte dos serviços foi prestada e, como nada foi feito quanto à ação de indenização, procurou o advogado, que se negou a continuar a prestar os serviços e a devolver o pagamento. Ainda de acordo com o cliente, em uma visita ao escritório do advogado, este se levantou da cadeira ao ser questionado e agrediu-o fisicamente, saindo logo em seguida.

Em sua defesa, o advogado alegou que foi contratado apenas para elaborar o recurso na ação de despejo. Declarou que foi agredido verbalmente pelo cliente e, na iminência de ser agredido fisicamente, ergueu-se para se defender e deu um tapa no rosto dele. Em uma ação de reconvenção – processo em que o réu, simultaneamente a sua defesa, propõe uma ação contra o autor –, requereu que o cliente fosse condenado a pagar indenização por danos morais.

A solicitação do advogado foi aceita em primeira instância. Ao analisar o recurso do cliente, o relator, desembargador Otávio Portes, declarou que o entendimento jurisprudencial não vê a troca de agressões verbais ou físicas recíprocas entre particulares como passível de indenização por dano moral.

Segundo o magistrado, no entanto, a legislação estabelece que o advogado “deve ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho”. Considerando que foi o próprio cliente quem se dirigiu ao escritório do advogado e iniciou a série de agressões verbais, decidiu manter a sentença.

A C Ó R D Ã O.

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

RELATOR: DES. OTÁVIO DE ABREU PORTES. VOTO. RELATÓRIO.

Conforme sentença: "Osmar Pereira da Silva Filho ajuizou ação de indenização em face de Eduardo Fidelis Lopes, todos qualificados nos autos, argumentando, em síntese, que em meados de 2008 contratou os serviços advocatícios do réu, acertando o pagamento de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), para elaboração de um recurso em processo de ação de despejo, na qual figurada como réu juntamente com sua esposa, bem como para o ajuizamento de ação de indenização, tendo sido realizada apenas uma parte dos serviços, referente ao recurso na ação de despejo, mas em relação à ação de indenização nada foi feito, de forma que procurou o réu para saber o que estava acontecendo, momento em que o requerido negou-se a continuar a prestar os serviços advocatícios e que não lhe devolveria parte do dinheiro recebido por meio de cheques.

Consta que no dia 24/04/2008 tentou nova conversa com o demandado para resolver o problema, mas não obteve êxito e, de maneira repentina, ao ser questionado, o réu levantou-se da cadeira e começou a agredir fisicamente o requerente com socos e pontapés, deixando imediatamente o local depois da ofensa física, razão pela qual lavrou dois boletins de ocorrência.

Aduz que o réu deve lhe restituir em dobro os valores recebidos pelos serviços advocatícios, bem como ser condenado na reparação por danos morais.

[...]

O réu foi devidamente citado, apresentando contestação a f. 65/78, instruída com os documentos de f. 79/101, na qual argui prefacial de inépcia da petição inicial e, no mérito, pugna pela improcedência dos pedidos, alegando, em resumo, que foi contratado pelo autor apenas para elaborar o recurso na ação de despejo, e que, na verdade, foi agredido verbalmente pelo requerente, o qual partiu para sua direção e, na iminência de agredir o demandado, levantou-se para se defender e desferiu um tapa no rosto do autor, não havendo socos e pontapés conforme mencionado pelo requerente.

O réu interpôs ação de reconvenção a f. 53/57, instruída com os documentos de f. 58/64, objetivando a condenação do autor/reconvindo, no pagamento de indenização por danos morais, em virtude de agressões verbais realizadas contra o reconvinte."

No referido decisório foi julgado improcedente o pedido inicial e procedente o pedido reconvencional, nos seguintes termos:

"Em relação ao pedido contido na petição inicial da ação de reconvenção (f. 53/57), julgo-o procedente e, por consequência, condeno o autor/reconvindo a pagar ao réu/reconvinte, a título de danos morais, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), o qual será corrigido com base na tabela da Corregedoria de Justiça do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais, a partir da data da sentença (Súmula n.º 362 do STJ), acrescido de juros de mora de 1,0% ao mês, desde a data do evento - 24/04/2008, f. 25/26 -, conforme Súmula n.º 54 do STJ."

Irresignado, apela o autor, reconvindo, em síntese reafirmando os mesmos fatos já descritos na sua narrativa inicial, segundo sua versão, pelo que pretende a reforma da sentença "anulando a condenação de R$ 10.000,00 em danos morais e, se não for esse o entendimento, que o mesmo seja reduzido a patamares justos".

Intimada a parte contrária, prestou contrarrazões nas fl.207/210 pugnando pela manutenção da sentença.

É o relatório.

VOTO DO RELATOR.

Conheço do recurso, visto que reunidos os pressupostos da sua admissibilidade. Como visto, trata-se de ação de indenização por dano moral onde as partes se imputam reciprocamente ofensas verbais e físicas em razão de desentendimento pessoal quanto à prestação de serviços advocatícios do réu/reconvinte ao autor/reconvindo e ora apelante.

De plano destaca-se que o apelado confessou ter agredido o apelante com um tapa no rosto, tendo todavia sido provado durante a instrução que o início do imbróglio foi deflagrado em razão de ter o recorrente injuriado o recorrido com termos pejorativos, "ladrão", "safado", e etc.

É firme o entendimento jurisprudencial no sentido de que a troca de agressões verbais/físicas recíprocas entre particulares não é passível de indenização por dano moral em favor de qualquer deles, exatamente porque neste caso a reciprocidade da culpa e do dano, aliada à imensurabilidade objetiva do prejuízo, impõe(m) à exclusão mútua da responsabilidade civil por razões de política judiciária.

Nesse exato sentido, por exemplo, já me posicionei em demanda similar, mutatis mutandi:

"CIVIL E PROCESSO CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - AGRESSÕES VERBAIS RECÍPROCAS - AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. 1. Para que se configure o ato ilícito que enseja a reparação in casu, é necessário que simultaneamente ocorram as seguintes situações: [1] fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência; [2] ocorrência de um dano patrimonial ou moral; e [3] nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente. 2. Com efeito, comete ato ilícito aquele que causa lesão à integridade física ou psicológica de outrem, devendo responder pelos eventuais danos morais e materiais advindos da agressão. 3. Os danos oriundos de agressões recíprocas não são passíveis de ressarcimento pecuniário." (TJ-MG - AC: 10702110204485001 MG, Relator: Otávio Portes, Data de Julgamento: 06/02/2014, Câmaras Cíveis / 16ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 17/02/2014)

In casu, é de se destacar todavia, que foi o próprio apelante quem se dirigiu até o local de trabalho do advogado, com o objetivo único de ofendê-lo em sua honra subjetiva e objetiva, e bem assim iniciou a série de agressões, motivo pelo qual penso ser maior o grau de reprovabilidade da sua conduta, a desafiar a manutenção da sentença sob combate.

Ora, a legislação pátria estatui que o advogado "deve ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca e apreensão determinada por magistrado e acompanhada de representante da OAB" (artigo 7º, inciso II, da Lei nº 8.906/94).

Pertinente a reação do advogado réu, em que pese ser reprovável toda e qualquer forma de violência entre os particulares, é de ver que até mesmo o ordenamento jurídico penal reconhece hipótese de exclusão da pena quando uma injúria segue-se imediatamente à outra, em caráter de retorsão (artigo 140, inciso II do Código Penal).

Enfim, o trato da relação pessoal que se estabelece entre constituinte-advogado é deveras delicado, porquanto o causídico acaba ficando diretamente responsável pela satisfação da pretensão do cliente, circunstância que sabidamente depende de inúmeras variáveis, dentre elas o próprio funcionamento correto e hábil da máquina judiciária, o que nem sempre acontece.

Muitas das vezes o patrocinado volta sua frustração contra o advogado sem saber que na verdade, outras são as causas da insatisfação do seu interesse subjetivo, não se podendo coadunar todavia, sob nenhuma hipótese, com o vilipêndio do advogado e menos ainda do local onde exerce seu trabalho, essencial à boa administração da justiça, nos termos da própria Constituição Federal.

Pertinente à quantificação do dano, o artigo 944 do Código Civil nos informa que, como regra, a indenização mede-se pela extensão do prejuízo causado. Sabe-se que, quanto ao dano moral, inexistem critérios objetivos nesse mister, tendo a praxe jurisdicional e doutrinária se balizado em elementos como a condição econômica da vítima e do ofensor, buscando ainda uma finalidade pedagógica na medida, capaz de evitar a reiteração da conduta socialmente lesiva.

Atento às peculiaridades do caso, considero que a parcela indenizatória no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais) se mostra condizente com a espécie, vez que servível à compensação do prejuízo moral experimentado em medida razoável e à finalidade pedagógica que deve permear a medida em face do agressor.

Assim sendo, atento à particularidade do caso, penso ser de rigor a manutenção da sentença e o desprovimento deste recurso. 

CONCLUSÃO - Com tais considerações nego provimento à apelação. Custas ao apelante, que fica isentado da condenação do artigo 85, § 11 do CPC (honorários recursais) eis que já estabelecida condenação no máximo legal de 20% (vinte por cento) pela sentença objurgada, observada a gratuidade da justiça. DES. PEDRO ALEIXO - De acordo com o(a) Relator(a). DES. RAMOM TÁCIO - De acordo com o(a) Relator(a). SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO". (Fonte: TJMG).

Como visto na decisão retro proferida, o advogado tem direitos assegurados, porquanto deva-se considerar a inviolabilidade do escritório ou local de trabalho do causídico, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. Tudo nos termos do art. 7º, inciso II, do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994).

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação em Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental).

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Comentários

  1. Excelente, colega advogado. Nós advogados não temos culpa pela decisão do juiz. O cliente precisa aceitar as decisões judiciais contra ou a favor, Assim deve ser. Agredir advogado é crime e pode acontecer como aconteceu no caso explanado no texto. Valeu e vamos adiante com a nossa querida e imprescindível profissão na administração da JUSTIÇA. Nota 10 o artigo e a mensagem. Evandro J. Lima.

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