O DIREITO DE CONSTRUIR.

             Outorga onerosa não é imposto.


O legislador quis dotar a administração de instrumento eficaz ao controle da expansão urbana, de forma que se pudesse desestimular a corrida ao crescimento vertical, cujo resultado já se faz sentir em todas as esferas da sociedade, seja pelo trânsito caótico causado por engarrafamentos diários, pelas inundações em época de chuva, pela completa degradação ambiental, pelas 100 mil pessoas morando em áreas consideradas precárias ou pela insuficiência dos serviços de infraestrutura urbana.

Expressiva corrente doutrinária entende que a outorga onerosa do direito de construir não é tributo. A bem da verdade, a referida outorga é um instrumento que flexibiliza as regras construtivas e representa uma concessão da prefeitura para que o proprietário de um terreno possa edificar acima do limite estabelecido pelo coeficiente de aproveitamento básico, mediante o pagamento de contrapartida em favor do município, valendo observar que ela visa arrecadar recursos para investimento em áreas de interesse social, com destinação da receita para habitações populares e melhorias na cidade. A população precisa fiscalizar.

Cumpre informar que a jurisprudência firmada pelo STF em julgamento de ação que questionava a constitucionalidade da outorga onerosa, "verbi gratia", é no seguinte sentido: “Recurso Extraordinário. Solo criado é o solo artificialmente criado pelo homem (sobre ou sob o solo natural), resultado da construção praticada em volume superior ao permitido nos limites de um coeficiente único de aproveitamento. Não há, na hipótese, obrigação. Não se trata de tributo. Não se trata de imposto. Faculdade atribuível ao proprietário de imóvel, mercê da qual se lhe permite o exercício do direito de construir acima do coeficiente único de aproveitamento adotado em determinada área, desde que satisfeita prestação de dar que consubstancia ônus. Onde não há obrigação não pode haver tributo. Distinção entre ônus, dever e obrigação e entre ato devido e ato necessário. Instrumento próprio à política de desenvolvimento urbano, cuja execução incumbe ao Poder Público municipal, nos termos do disposto no artigo 182 da Constituição do Brasil. Instrumento voltado à correção de distorções que o crescimento urbano desordenado acarreta, à promoção do pleno desenvolvimento das funções da cidade e a dar concreção ao princípio da função social da propriedade (art. 170, III da CB). (RE 387.047, Rel. Min. Eros Grau, Plenário, DJe 6.3.2008).

Data venia dos contrários, a outorga onerosa não é um tributo simplesmente porque é uma opção do proprietário, e o seu pagamento não é compulsório, ou seja, não é obrigatório. A outorga não representa a criação de mais um imposto. Contudo, a regra precisa ser igual para todos, sem distinção ou favores, visando garantir uma cidade descentralizada, menos adensada e que seja justa, prazerosa, respirável e inclusiva.

Wilson Campos (Advogado/Delegado Titular do Setor Técnico na 4ª Conferência de Política Urbana/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Assessor e Consultor Jurídico do MAMBH).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de terça-feira, 21 de maio de 2019, pág. 19).


Comentários

  1. Messias Nolasco V. G,24 de maio de 2019 às 14:37

    Esses empresários da construção civil que falam contra a outorga deveriam ser mais solidários com a cidade. Cidade que eles arrebentam com suas obras que impermeabilizam o solo, verticalizam e adensam causando o caos do trânsito, etc, etc. Resumindo, pelo que entendi a outorga onerosa do direito de construir só será paga se construir acima do espaço do lote, então qualquer pessoa que tem um lote de 360 metros pode construir até 360 metros. Pra que mais? Está de bom tamanho e olha que uma casa de 360 metros é uma baita casa. Quem quiser construir acima disso tem de pagar a outorga que reverterá para obras na cidade. Muito justo. Olha, gostei do texto do Dr. Wilson Campos e concordo com ele, em tudo por tudo. Messias Nolasco V.

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  2. Nas minhas viagens pela Europa não vi em lugar nenhum empresários reclamando porque a cidade é mais horizontalizada do que verticalizada. Os empresários vivem e convivem com as obras menores e não tem esse apego todo a prédios enormes que geram lucros para empresas e despesas para o poder público. Quanto maior o prédio, maior será a sua demanda por serviços públicos - lixo, água, esgoto, energia, etc...etc.
    Essa outorga cobrada não é imposto de jeito nenhum, porque o empreendedor só paga se exceder ao limite básico da lei. Ora, está claro que até o limite do coeficiente da construção não se paga nada à prefeitura, mas se ultrapassar esse limite é preciso pagar. Justíssimo e não é imposto, mas uma opção do empreendedor. Sorte a todos e parabéns ao Dr. Wilson Campos, que é autor desse blog super interessante e justo nas suas causas. Débora N.L.S.

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