POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DE UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO, RETROATIVAMENTE.

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) está analisando e vai decidir se é possível converter uma união estável em casamento de forma retroativa.

A matéria é tema do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1405467, que teve a repercussão geral reconhecida (Tema 1313), ou seja, a tese a ser firmada será aplicada aos demais processos semelhantes em andamento na Justiça.

O caso diz respeito a um casal que, desde 1995, vivia em regime de união estável e teve dois filhos. Em 2006, para que os filhos tivessem direito à cidadania austríaca, eles pediram a conversão da união estável em casamento, mas com efeitos retroativos. A Justiça só deferiu a conversão a partir de 2017, quando saiu a decisão, levando-os a reiterar o pedido de retroatividade em nova ação em 2019, acrescentando, ainda, outro pedido, desta vez para mudança do regime de bens.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) abriu prazo para que o pedido relativo à retroatividade fosse excluído da ação, porque já tinha sido decidido. Como isso não foi feito, extinguiu o processo.

No recurso ao STF, o casal argumenta, entre outros pontos, que, em respeito ao princípio do acesso à Justiça, o TJDFT deveria analisar o outro pedido, que nunca havia sido apreciado em outro processo.

Relator do recurso, o ministro Flávio Dino se manifestou pela repercussão geral dos dois temas tratados no recurso – o momento em que começam os efeitos da conversão da união estável em casamento e a decisão do TJDFT de não examinar todos os pedidos do processo porque um deles já tinha sido resolvido de forma definitiva. Segundo ele, a discussão diz respeito à extensão da proteção devida pelo Estado às famílias formadas inicialmente por meio da união estável, depois convertida em casamento. Para Dino, as duas questões constitucionais vão além do interesse pessoal das partes.

A manifestação do relator foi seguida por maioria em deliberação no Plenário Virtual. Porém, ainda não há data prevista para o julgamento do mérito do recurso.

Como visto, ao que parece, o STF ainda está analisando esse tema de grande relevância para o direito de família e sucessões. Em julgamento com repercussão geral, o Supremo avaliará a possibilidade da conversão da união estável em casamento, retroativamente. Ou seja, deverá ser discutida a extensão dos efeitos da formalização do casamento para períodos anteriores à sua constituição, nos casos em que os cônjuges mantinham união estável anterior.

No caso concreto, como restou explicado logo acima, um casal vivendo em união estável desde 1995 requereu em 2006 a conversão da união estável para o casamento, com efeitos retroativos desde o início do relacionamento. Tanto a Justiça de primeira, quanto de segunda instância, negaram o pedido, entendendo que o casamento e os efeitos do regime de bens passariam a vigorar somente a partir da sentença proferida nos autos.

Acontece que, se uma união estável for convertida retroativamente em casamento com regime de separação total, os bens adquiridos durante a união estável, vigente sob o regime da separação parcial, poderiam deixar de ser considerados comuns. Daí a problemática posta para análise do STF. Sim ou não? Pode ou não pode?  

Também como afirmado alhures, o STF estuda a questão nos autos do ARE 1405467, o que pode trazer mudanças significativas nas regras patrimoniais de casais que formalizaram seu relacionamento após anos de convivência sob união estável.

O tema é relevante, porquanto no caso de permitida a retroatividade, os efeitos do casamento poderão retroagir ao início da união estável, abrindo a possibilidade de alteração do regime de bens adotado desde o início do relacionamento.

Mas como esse tema é tratado atualmente?

Atualmente, as uniões estáveis não formalmente reconhecidas estão submetidas ao regime de comunhão parcial de bens, que considera comuns os bens adquiridos durante a convivência. Quando a união estável é formalizada, as partes podem optar por outro regime, como ocorre no casamento. No entanto, muitos casais que vivem em união estável não regulamentada buscam, posteriormente, formalizar essa união com efeitos retroativos, enfrentando obstáculos, especialmente ao optar pelo regime de separação total de bens.

Vale considerar que a possibilidade de retroatividade causa preocupações quanto à segurança patrimonial. Se, por exemplo, uma união estável for convertida retroativamente em casamento com regime de separação total, os bens adquiridos durante a união estável, vigente sob o regime da separação parcial, poderiam deixar de ser considerados comuns, afetando os direitos já adquiridos de um dos cônjuges.

O atual entendimento jurídico prioriza a segurança patrimonial e a preservação dos direitos adquiridos, evitando mudanças retroativas que possam prejudicar uma das partes. No entanto, há críticas sobre este entendimento, no sentido de que ele não reconhece o interesse e a autonomia privada de casais plenamente capazes, que escolhem gerir seus bens de forma independente, especialmente aqueles que já adotavam a gestão individual de seus patrimônios, durante toda a união estável.

Destarte, enquanto o STF não decide sobre a retroatividade da conversão de união estável em casamento, a expectativa criada é no sentido de que o julgamento esclareça os limites dessa retroatividade, bem como considere o interesse e a autonomia das partes, e não só a proteção estatal sob o patrimônio. Com isso, o entendimento a ser firmado poderá ter ampla repercussão nas ações judiciais em andamento, com força para influenciar, inclusive, o planejamento familiar e patrimonial de muitos casais.

A meu ver, a parte mais complexa do pedido de retroatividade, no caso concreto, se deve à pretensão da mudança do regime de bens. Portanto, a questão requer análise pontual e decisão equilibrada do Plenário do STF. Resta aguardar.  

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Marinalva e Diogo Silveira12 de março de 2025 às 12:01

    Dr. Wilson esse artigo veio a calhar no nosso interesse particular de casal em união estável que pretende transformar em casamento. Caso nosso é parecido ao conferido no artigo pelo senhor. Estamos nessa luta e vamos aguardar a decisão final e definitiva do STF. Valeu doutor. Wilson Campos. Gratidão nossa. Abrs. Marinalva e Diogo Silveira Dourado.

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  2. Renato Luiz F. G.Muniz12 de março de 2025 às 15:53

    Eu penso que o desejo do casal deve prevalecer e o judiciário só homologar essa vontade em juízo. Se o casal da união estável resolver amigavelmente passar para o casamento e mudar o regime que seja feita a vontade de ambos e não a do judiciário. A proteção patrimonial cabe ao casal e eles decidem se é parcial de bens ou separação total de bens. Mas se há conflito a decisão judicial de se dar conforme a lei vigente e ponto final. O judiciário precisa ser mais prático e demorar menos tempo nas decisões. Isso é caso para um mes e nada mais. Justiça rápida e sem lenga lenga e anos e anos para julgar um processo que só atrasa a vida de quem paga o salários dos servidores do Estado. Dr. Wilson é assim que eu penso e no mais concordo com seu ponto de vista e seguimos juntos nessa advocacia penosa e justiça morosa. Abr. Renato Luiz FG Muniz

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