2,4 MILHÕES DE EXCLUÍDOS.

O alerta da notícia veiculada no jornal O TEMPO, edição de 05/10 próximo passado, sob o título "Ocupação de avenidas trará impacto a 800 mil moradores" serviu, mais do que nunca, para reafirmar a comprovação óbvia de que a população de Belo Horizonte não é levada em conta na hora da discussão das funções sociais da cidade, mas tão somente no momento de pagar os tributos e a conta salgada do desenvolvimento sem sustentabilidade imposto de cima para baixo.

Embora corretíssima a nota do diário, com percuciência maior são os atingidos em toda a cidade, algo em torno de 2,4 milhões de habitantes, que são ignorados como cidadãos, o que leva à justificada pesquisa do IBGE, de que a capital mineira perdeu o posto de terceira e desabou para a sexta posição entre as maiores capitais brasileiras, donde se conclui que se a população é alijada, também o é a cidade no crescimento do país.   

Mais que isso, precisamente no dia em que a Constituição Federal completa 25 anos, os moradores da capital mineira são surpreendidos com a mácula impingida aos Arts. 182 e 183, regulamentados na Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), quando lhes são retirados os direitos de participação na gestão democrática da cidade. A prefeitura autoriza e projeta obras por toda a cidade, sem, no entanto, consultar as comunidades locais.

Os moradores são sempre os últimos a saberem da "nunciação de obra nova" pretendida pelo executivo municipal, o que reflete absurdamente o tamanho do descaso da administração pública para com o contribuinte que, de fato, acaba por ser obrigado a cumprir os compromissos firmados pela Administração, mesmo que a reboque de sua vontade personalíssima.

A criação de novos polos de comércio e serviços, retirando do grande centro a concentração dos negócios, segundo relatado pela Prefeitura, não contempla com efetividade e transparência os demais equipamentos urgentes e necessários de saneamento básico, infraestrutura, hospitais, escolas, transporte coletivo, preservação do meio ambiente, segurança, mobilidade, áreas de laser e garantia de melhor qualidade de vida.

O planejamento da administração municipal até agora não foi apresentado à população, o que representa, no mínimo, má-fé das secretarias de política e planejamento urbano, que sequer se dispuseram a discutir as metas com a sociedade, de forma ampla, o que deveria ter sido feito muito antes do início dos projetos formatados em gabinetes fechados.

A participação da sociedade se dá, com efeito, principalmente pela aplicação do estatuto legal, através de uma gestão democrática, na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.

As audiências públicas nos conselhos municipais não podem servir de simples anuência da sociedade, posto que os debates hão de ser pela inteira transparência, publicidade, legalidade e efetiva oitiva das comunidades envolvidas, paritariamente.

Os planos de ocupação urbana da Prefeitura, da forma como surgem, autocráticos e obscuros, não podem, sob hipótese alguma, serem admitidos pela sociedade.

Portanto, a exigência social para que impere a cidadania, precisa partir do exemplo do poder público, o que não vem acontecendo, ficando a obrigação apenas para o povo, quando deveria ser de todos, indistintamente. A rigor, para que haja progresso, faz-se necessária a ordem. E para que haja ordem, faz-se necessário o respeito ao povo.
 
Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).  

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