O JOGO DE INTERESSES - A VERTICALIZAÇÃO DA CIDADE.



A respeito do editorial intitulado “Cartas Marcadas” (Opinião, 1º de fevereiro), peço venia para pontuar as seguintes questões:

Não se pode discutir verticalização ou expansão urbana sem definir, preliminarmente, de forma criteriosa, densidades demográficas e impactos que afetem diretamente a vida humana. A discussão passa pela sociedade. Nenhum outro fórum tem essa prerrogativa.

Nesse sentido é o Art. 32, parágrafo único, da Lei Federal 10.257/2001, que define a operação urbana consorciada como o conjunto de intervenções que precisam da participação dos moradores, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas, melhorias sociais e a valorização ambiental.

A convivência harmoniosa da população  é mais do que importante por  pressupor um bom relacionamento entre os moradores e os espaços públicos, e isso implica construções de até cinco ou seis pavimentos, como ocorre nas cidades europeias e em outros marcos do urbanismo contemporâneo. Ou seja, a família pensada em primeiro lugar.

A verticalização irracional e indiscriminada se deve à especulação imobiliária, à violência urbana e à falta de controle da sociedade sobre as cidades. Uma constatação óbvia em Belo Horizonte é o distanciamento da qualidade de vida do ser humano.

Nos Estados Unidos, onde o capital é posto acima de tudo, a cidadania de Miami não permitiu a destruição do distrito Art Déco, constituído por pequenos hotéis e condomínios de quatro andares, apesar da alta valorização do solo diante da praia. 

Nessa mesma linha, quando Margareth Thatcher desregulou praticamente tudo na Inglaterra, surgiram alguns espigões na cidade londrina. No entanto, diante da reação do público, a pressão fez a primeira-ministra do Reino Unido voltar atrás nas suas pretensões interventivas urbanas, no que foi acompanhada pelos administradores municipais.

É sabido que não é verdade que a verticalização preserva o verde. Muito menos quando se preparam operações urbanas de grande vulto sem escutar as comunidades. Os espigões causam calor, impedem a ventilação, o verde, e andam na contramão dos bairros de gabarito mais baixo que preservam o verde em seus quintais e o ar puro para toda a comunidade. A qualidade de vida do ser humano tem de ser pensada, antes de tudo.

Pergunto: o que será de Belo Horizonte se esse crescimento sem planejamento passar sem a participação ampla e democrática da população?

A Operação Urbana Consorciada de Belo Horizonte está mais para Operação Urbana do Prefeito ou Operação Urbana (Des)consorciada.

A participação da população na discussão das políticas urbanas do município não vem sendo respeitada pela prefeitura. Até as votações nos órgãos colegiados são viciadas, de cartas marcadas e sempre favoráveis à iniciativa privada, ao poder público e aos jogos de interesses, mas sempre em detrimento das reais necessidades da população.

Wilson Campos (Advogado / Assessor e Consultor Jurídico do Movimento das Associações de Moradores de Belo Horizonte - MAMBH / Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de domingo, 09/02/2014, pág. 19).


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