RECRUDESCE O AUTORITARISMO MUNICIPAL.



A face dura do autoritarismo ressurge em Belo Horizonte, lamentavelmente, através de atos de representantes do Executivo municipal, numa demonstração típica do regime totalitário que se instala e recrudesce no seio do Estado democrático de direito.

A nossa cidade, berço por extensão da Inconfidência Mineira, movimento que lutou pela liberdade do povo e contra a opressão do governo estrangeiro, não merece mais passar por abusos políticos.

Os tratores travestidos de agentes públicos manipulam acintosamente a fugaz realização da IV Conferência Municipal de Política Urbana, que, aliás, deveria ter acontecido no ano passado, dentro do prazo legal. Não o foi por desobediência da administração municipal à legislação que define a data correta como sendo de quatro em quatro anos e sempre no primeiro ano de mandato do prefeito.

Na eleição de delegados para a Conferência, que aconteceu de 03 a 26 de fevereiro, em vez de plenárias democráticas e transparentes, o que mais se viu foi um contingente invejável de agentes públicos se destacando no meio dos cidadãos, fazendo o jogo do Executivo municipal, descumprindo o regimento interno, conduzindo eleitores em ônibus fretados, direcionando votos e praticando os mais condenáveis atos de abuso de poder e falta de decoro.

A maioria das Associações de Moradores foi alijada do processo eleitoral, tanto pela falta de divulgação e transparência, quanto pela interferência da administração municipal verticista que contribuiu para o desrespeito à liberdade de voto.

Nunca se viu uma farsa de tal vulto, montada para descaracterizar a verdadeira vontade de participação das comunidades que, de fato, se importam com os destinos dessa cidade, que não pode ser entregue à gestão autoritária e unilateral do alcaide.

Os infaustos acontecimentos transformaram as plenárias populares das nove regiões abraçadas pelo cronograma, em circos de espetáculos marcados por arrogância e truculência, longe das expectativas cívicas, éticas e transparentes. A utilização afrontosa de dezenas de agentes públicos e tantas outras do aparato da guarda municipal, regiamente a postos e na defesa dos encaminhamentos da administração, causou estranheza, indignação e decepção com a frágil democracia vigente.

Da forma como transcorreu e continua a Conferência, os prejuízos impingidos à coletividade serão incontáveis, seja pela demonstração autocrática de força dos representantes do Executivo ou pela omissão do responsável direto pelos destinos dessa cidade. 

Permissa venia, diante da quebra de normas e regras basilares do Estado de direito, configurado o descumprimento do regimento e constatada a indignação dos cidadãos nas votações dos delegados dos setores populares, cumpre, por analogia, invocar o Art. 222 do Código Eleitoral que leciona: “É também anulável a votação, quando viciada de falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o artigo 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedados por lei”. Já o citado Art. 237 dispõe com clareza solar que: “A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso de poder de autoridade em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos”.

Embora a existência de testemunhas e filmagens seja farta, comprovadamente, o que mais assusta os cidadãos irresignados é o recrudescimento do autoritarismo. Temos, com certeza, muito a aprender e praticar para alcançarmos a tão falada democracia ampla, geral e irrestrita.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

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