SERRA DO CURRAL
O escorço histórico do maior
patrimônio turístico, paisagístico, natural e cultural da cidade de Belo
Horizonte começa no ato de grandeza administrativa do governador Bias Fortes,
que, em 17 de dezembro de 1958, solicitou ao ministro da Educação o tombamento
da Serra do Curral.
O ofício nº 2.018/58 do
governador seguiu apenso ao parecer do assistente jurídico José Mesquita Lara,
que fundamentou o pedido manifestando a preocupação do governo do estado com as
atividades mineradoras, consideradas capazes de causar a extinção do monumento
conhecido como Serra do Curral, cuja excelência ambiental mereceu a
argumentação do parecerista, no sentido de que, in verbis: "Não
pairam dúvidas sobre a possibilidade do tombamento da aludida serra; os
monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens são suceptíveis de tal
medida, quando dotadas pela natureza de uma feição notável e inconfundível.
Será desnecessário que nos percamos em considerações estéticas para acentuar a
beleza da Serra do Curral, com sua silhueta inconfundível e bem característica,
tão ligada à nossa capital".
Superadas as diligências de praxe,
ocorridas em 1959, o processo de tombamento nº 591-T-58 seguiu os trâmites
legais. No dia 21 de setembro de 1960, os atos da inscrição nº 29, registrados
às fls. 8, do Livro de Tombo nº 1 (arqueológico, etnográfico e paisagístico),
consagraram o tombamento do conjunto paisagístico do pico e da parte mais
alcantilada da Serra do Curral. A proteção do patrimônio histórico estava
assegurada em âmbito federal.
Em 1969, a Companhia
Urbanizadora da Serra do Curral (Ciurbe), empresa controlada pelo estado de
Minas Gerais, deu início à implantação da chamada "Cidade da Serra".
No entanto, a urbanização foi concluída por sua sucessora, a Companhia de
Desenvolvimento Urbano do Estado de Minas Gerais (Codeurb) e os projetos de
parcelamento foram aprovados pela Prefeitura de Belo Horizonte em 1973, por
meio dos decretos 2.317 e 2.383, sob a denominação de Bairro das Mangabeiras.
Em 1973, o governador Rondon
Pacheco, preocupado com a integridade do bem tombado, determinou a constituição
de uma comissão especial para avaliar as atividades de mineração na Serra do
Curral. A área tombada foi, então, nesse momento, rigorosamente demarcada pelo
Instituto de Geo-Ciências Aplicadas (IGA), sob o acompanhamento da Secretaria
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), que iniciou os
procedimentos de vistoria no Bairro das Mangabeiras e solicitou à Codeurb
que promovesse junto ao estado e à prefeitura algumas alterações nos decretos
de aprovação, visando adequar as normas específicas de edificações às condições
de conveniência e interesse da preservação da paisagem tombada, entre elas, a
de considerar non aedificandi todos os terrenos situados acima do Anel
da Serra (atual Avenida José do Patrocínio Pontes).
Apesar da proibição de
edificar, de todos os cuidados e do extremo zelo das autoridades citadas, que
sempre buscaram a proteção e a preservação da Serra do Curral, a Lei Municipal
nº 10.630, de 5 de julho de 2013, alterou a Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso
do Solo e estabeleceu novos parâmetros urbanísticos, com o intuito de promover
a construção de empreendimentos na cidade, inclusive em zonas de proteção
ambiental. Ou seja, o novel texto legal fere de morte a extensão tombada da
encosta da Serra do Curral e coloca em risco iminente todo o maciço, o paredão,
o entorno, os mirantes, as trilhas ecológicas, a travessia da serra, o Parque
das Mangabeiras, o Parque da Serra do Curral e o corredor ecológico que se
estende da Mata da Baleia até o Parque Estadual da Serra do Rola-Moça, passando
pela área do futuro parque da Lagoa Seca e pela Estação do Cercadinho. Resta
evidente a grave ameaça às montanhas, às nascentes, à flora, à fauna, à
paisagem e ao patrimônio histórico tombado.
Wilson Campos
(Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses
Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).
(Este artigo mereceu
publicação do jornal ESTADO DE MINAS, edição de sábado, 10/01/2015, pág. 7).
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