GREVE NO SETOR PÚBLICO



Passados 27 anos da promulgação da Constituição Federal, não se registrou nesse imenso lapso temporal a regulamentação legislativa do texto constitucional, no que concerne ao direito de greve dos servidores públicos, o que revela um retardamento abusivo do dever estatal, deixando o Congresso de editar o ato legislativo essencial ao desenvolvimento da plena eficácia jurídica desse preceito legal. 

A legitimidade do direito em debate está prevista no artigo 37, incisos VI e VII da Carta Magna, reconhecendo a greve como um direito dos servidores públicos civis e ainda garantindo o direito à livre associação sindical, restando a expectativa de uma legislação definitiva que regulamente de vez essa questão tão polêmica no direito brasileiro. 

Uma sociedade livre e democrática não pode conviver com o desrespeito à Constituição, tanto por ação quanto por omissão estatal. O poder público que suscita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição ofende os preceitos e os princípios do Estado democrático de direito. Da mesma forma, o Estado que deixa de adotar medidas necessárias à realização concreta dos dispositivos constitucionais, de forma a torná-los efetivos e aplicáveis, viola negativamente o texto constitucional.

Enquanto o Poder Legislativo negligenciar na sua função, principalmente no que diz respeito à postergação infindável da não regulamentação de determinados artigos de lei, a Constituição continuará apresentando situação sui generis, pois, apesar de tantas emendas constitucionais, há dispositivos ainda carentes de aplicabilidade imediata.  

O paradigma constitucional democrático, que exige a vinculação dos atos estatais e do legislador ao texto constitucional, veda qualquer ato abusivo perpetrado pelo aparelho estatal. Contudo, a Constituição, como um intertexto aberto, e a ser interpretado por todos, impõe a afirmação plena dos direitos fundamentais de segunda geração, especificamente os direitos e garantias sociais, dos quais o direito de greve é parte.

Embora o STF, em 25.10.2007, tenha reconhecido o direito de greve aos servidores públicos, determinando a aplicação da Lei 7.783/1989 e, com isso, legitimando plenamente os direitos coletivos da categoria, contendo aí a absoluta liberdade sindical, a abertura de conflitos coletivos e a negociação coletiva, o Congresso Nacional e a Presidência da República não podem se furtar ao dever de editar lei especial regulamentando a lacuna normativa existente.

Mister que qualquer lei que venha a disciplinar o direito de greve do servidor público não deve tratá-lo como análogo ao direito de greve da iniciativa privada. A situação não é a mesma, nem as consequências sofridas pela sociedade. Além do mais, não se deve pensar que a solução repousa em conferir tratamento mais rígido e considerar todo serviço público atividade essencial. É preciso, preliminarmente, legitimar o real direito de greve do servidor público para uma reflexão sobre o tema, que, data venia, deverá se pautar de maneira mais ou menos rígida, mas jamais suprimindo qualquer direito do trabalhador.

Wilson Campos (Advogado).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de domingo, 09/08/2015, pág. 17).

Comentários

Postagens mais visitadas