ADVOCACIA PRO BONO.


"Advocacia voluntária e cidadã".

Para uns, a chamada “advocacia para o bem” surgiu nos Estados Unidos, por meio de iniciativas da sociedade e, embora não obrigatória, essa prestação de serviço passou a contar com programas coordenados pelas próprias associações estaduais de advogados. Para outros, foi na Roma antiga que começaram esses trabalhos advocatícios gratuitos aos menos favorecidos. No entanto, o que importa não é onde nasceu a ideia, mas como ela funciona no mundo civilizado.

A advocacia solidária, pro bono, a rigor, se trata de uma medida essencial à consolidação do Estado Democrático de Direito, haja vista a prevalência dos direitos da cidadania sobre os interesses puramente corporativos. A advocacia pro bono, ao ampliar o acesso à Justiça, presta relevante serviço público, resgata a função social da operação do direito e pratica uma justiça mais eficiente, em face de um contexto de exclusão, extremamente desumano e desigual.

No Brasil existem relatos dessa prática desde a época do Império, e o nome mais lembrado nos últimos cem anos é o de Ruy Barbosa, o maior jurista de todos os tempos, que foi o primeiro advogado pro bono, solidário, defendendo escravos subjugados e marinheiros revoltosos, em causas quase impossíveis, mas coroadas de êxito, graças ao desprendimento do ilustre causídico.

Com o passar dos anos, cresce o interesse pela causa cidadã, mas o exercício livre dessa modalidade advocatícia dependia de um posicionamento oficial da OAB Nacional. Os pontos negativos anteriormente levantados pela Turma de Ética e Disciplina da OAB foram superados, ficando entendido que a advocacia pro bono não é imposta, mas voluntária, e não elide e nem se confunde com nenhuma outra área institucional. Ademais, essa assessoria jurídica não se limitaria à representação em Juízo, mas criaria estruturas que permitissem um atendimento preventivo à população carente e às entidades sem fins lucrativos, com objetivos sociais.

Tomando-se por base o grande número de associações comunitárias, entidades filantrópicas e de utilidade pública, todas carentes, e mediante a notória necessidade de se multiplicar o acesso à Justiça para os despossuídos, a advocacia pro bono foi aprovada pelo Conselho Pleno da OAB Federal e regulamentada pelo Novo Código de Ética e Disciplina., em sessões ordinárias realizadas em junho e outubro deste ano. Embora nunca tivesse contado com uma regulamentação nacional, a advocacia pro bono, praticada há mais de cem anos no Brasil é exercida gratuitamente em favor de instituições sociais sem fins lucrativos ou pessoas naturais que não têm recursos para contratar profissionais para consultoria, assessoria ou atuação judicial.

No mínimo, o gesto da OAB pode ser encarado como humanitário, democrático, cidadão e incentivador do exercício da advocacia solidária, gratuita, para os comprovadamente hipossuficientes. De sorte que, o Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei Federal nº 8.906/94), ao dispor no seu artigo 2º, § 1º, que “no seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social”, torna imprescindível que os advogados e as bancas de advocacia exerçam essa função social de elevada importância, valorizando ainda mais a respectiva atividade profissional, considerada “indispensável à administração da justiça”, nos termos do artigo 133, da Constituição da República.

A Ordem dos Advogados do Brasil tem uma história brilhante na construção desse país. Não é crível que a advocacia pro bono estabeleça concorrência desleal ou diminua o espaço de atuação dos advogados. Ao contrário, o trabalho é com expectativas de uma sociedade melhor e de um país que vire a página da desigualdade social, onde os anseios por ganhos materiais não se coloquem acima da cidadania e onde não se neguem a quaisquer do povo o direito e o acesso à Justiça. Da mesma forma, não se negue ao advogado o exercício da liberdade, resguardando a advocacia enquanto instrumento de democratização e de transformação social.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

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