OS RISCOS DO AMIANTO PARA OS TRABALHADORES.




A exposição de empregados a riscos é um risco também para as empresas que fazem vista grossa ou simplesmente ignoram os danos futuros para todos - para as empresas, financeiros e éticos, e para os empregados, doenças e até mortes. Veja-se o caso a seguir que, entre muitos, país e mundo afora, causam perdas humanas e nem mesmo assim têm uma correção de rumo adequada e exemplar.

A empresa Eternit foi condenada a oferecer tratamento de saúde integral e vitalício a todos os ex-empregados e familiares expostos ao amianto durante as atividades da unidade de Osasco (SP). A substância é reconhecida como cancerígena pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A sentença é da 9ª Vara do Trabalho de São Paulo, em ação do Ministério Público do Trabalho em São Paulo (MPT-SP).

A decisão também prevê o pagamento de R$ 100 milhões a título de danos morais coletivos. O dinheiro deverá ser destinado às instituições que desenvolvem ações relacionadas aos danos ligados ao amianto. Segundo o MPT, numa amostra de 1 mil ex-trabalhadores, avaliados pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Medicina e Segurança do Trabalho (Fundacentro), quase 300 adoeceram por contaminação do amianto. Destes, 90 morreram por graves doenças respiratórias, entre 2000 e 2013, mas o número pode ser muito maior, já que a Eternit ocultou ou dificultou a ocorrência de vários registros.

Vale salientar que a decisão não condiciona a responsabilização pela saúde à prova de que a doença ocorreu pela exposição. “A assistência não será limitada às doenças apontadas pela empresa, pois o conhecimento científico tem demonstrado a possibilidade de rol mais amplo de adoecimento. Assim, não será necessária prova (quanto aos ex-trabalhadores) de que já exista doença relacionada ao amianto, inclusive porque um dos motivos para acompanhamento é a busca de diagnóstico precoce de eventual adoecimento, com vistas ao tratamento mais eficaz”, explicou a magistrada Raquel Gabbai de Oliveira na sentença.

Reparação – Ação semelhante foi ajuizada pela Associação Brasileira de Expostos ao Amianto (Abrea), que como o MPT, também reclamava da atuação irregular da Eternit em Osasco. A entidade foi criada há 21 anos, para defender os direitos e a indenização dos mais de 10 mil trabalhadores prejudicados nos 52 anos de funcionamento da indústria em Osasco.

No processo da Abrea, a Justiça determinou o pagamento de R$ 300 mil a cada trabalhador atingido. Os já doentes recebem mais R$ 80 mil por dano moral existencial – aquele dano permanente que restringe projetos de vida e o convívio social. A indenização também será paga a filhos e viúvas de ex-trabalhadores mortos. Outros R$ 50 mil serão pagos a título de danos morais a cada ex-empregado exposto ao amianto que ainda não tenha sido diagnosticado com doença relacionada à exposição.

Viúvos(as), companheiros(as) e filhos(as) inválidos(as) de trabalhadores falecidos, receberão uma pensão mensal equivalente a cinco salários mínimos devida até a data em que o trabalhador completaria 70 anos ou até os filhos inválidos completarem 25 anos.

"A repercussão pública dos adoecimentos ultrapassa ainda o aspecto financeiro, pois os efeitos atingem também a organização familiar e a convivência de um número de pessoas ainda incerto, de famílias em que filhos perdem seus pais, tem de lidar com a morte precoce e muitas vezes dolorida, como nos casos de câncer, ou ainda com a incapacidade prolongada e progressivamente limitante em situações de graves doenças respiratórios, como o conhecido ‘pulmão de pedra’ " , destacou a juíza Raquel Gabbai de Oliveira, que analisou as duas ações contra a Eternit.

Reincidente – A Eternit também é alvo de outra ação do MPT por fabricar produtos à base de amianto no Rio de Janeiro, na unidade do bairro de Guadalupe. A companhia também é investigada por suspeita de irregularidades nas fábricas de Colombo, região metropolitana de Curitiba, no Paraná, e em Simão Filho, na Bahia.

Em 2013, os empresários da Stephan Schmidheiny e Louis de Cartier – os fundadores da Eternit no Brasil – foram condenados pelo Tribunal de Turim, na Itália, a 16 anos de prisão por crime de homicídio doloso. Eles foram julgados por fabricar produtos de asbesto na cidade de Casale Monferrato (ITA), nos anos de 1976 a 1990. A atividade teria provocado a morte de 258 pessoas por mesotelioma, um tipo de câncer ligado à exposição ao mineral.

O funcionamento da multinacional na Itália também teria causado a morte de 2,1 mil pessoas e o adoecimento de outras 800 em várias localidades do norte do país. Ao final do processo, os dois foram absolvidos pela Corte de Cassação de Roma, sob a defesa de que o delito havia prescrito. (Fonte: MPT).

Destarte, vale esclarecer que, no Brasil, o amianto foi banido apenas parcialmente. A crisótila (amianto branco) ainda é explorada em vários estados do país. Apenas Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Rio Grande do Sul aboliram todas as formas de amianto.

A exploração do amianto do tipo crisótila sofre grande defesa no Senado e na Câmara dos Deputados pela chamada “bancada do amianto”. Este grupo alega que não existem dados científicos que comprovem que esta forma de amianto (crisótila) seja nociva à saúde e, portanto, sua proibição prejudicaria uma indústria que movimenta algo em torno de 2,5 bilhões de reais por ano.

Independentemente disso,  os riscos à vida humana continuam, posto que os fragmentos microscópicos de fibras de amianto são potencialmente perigosos quando inalados e podem provocar doenças respiratórias: Câncer de pulmão, que é o mais comum em pessoas expostas ao amianto; Mesotelioma, uma forma de câncer no peito que praticamente só ocorre em pessoas expostas ao amianto; Asbestose, uma doença que causa falta de ar e pode levar a problemas respiratórios mais graves.

Cumpre atentar para o grave fato de que a asbestose pode surgir em uma década após exposição inicial ao amianto, mas em muitos casos ela demora ainda mais. O mesotelioma pode surgir em 30, 40 ou até 50 anos após a exposição. Médicos dizem que pacientes diagnosticados com mesotelioma têm menos de cinco anos de expectativa de vida.

A recomendação mínima é no sentido de que os trabalhadores devem usar roupas protetoras e máscaras para respiração. Outra medida é reduzir o nível de poeira nas fábricas com ventiladores, aspiradores e água, mantendo o ambiente mais úmido. A recomendação máxima é de proibição do produto.

Por fim, a lição que fica é a de que as vidas humanas são infinitamente superiores aos valores que vertem as condenações a título de indenizações. De nada serve o dinheiro se o trabalhador não tem mais saúde para viver. O trabalhador sofre, agoniza e morre. As empresas causadoras do mal continuam no mercado.

Portanto, urge que surja uma solução definitiva que privilegie a vida do trabalhador e que mantenha as empresas operando e empregando, dentro da segurança necessária e reduzindo gradativamente a aplicação do produto nos mais diversos segmentos do mercado consumidor, ou a substituição do produto por outro que não afete a saúde humana, ou até a proibição definitiva do uso do produto cancerígeno, a exemplo do que já fizeram países da União Europeia, a Austrália e mais de 20 países, onde o amianto branco é proibido, e limitado a quantidades pequenas nos Estados Unidos e no Canadá.

Wilson Campos (Advogado e Ambientalista).

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