AS CHUVAS SÃO INOCENTES




Muitas são as ruas e avenidas alagadas. Diversos são os veículos arrastados. Várias são as casas e lojas cercadas e invadidas pelas águas barrentas da chuva. Tristes e desoladas estão as pessoas abandonadas à própria sorte, mas com forças suficientes para serem solidárias às famílias que perderam tudo e, pior, perderam entes queridos insubstituíveis.

A inundação causada pela forte tempestade é assombrosa, indesejável, porém, previsível. Sim. Previsível. Porque todos os anos o filme é o mesmo e as autoridades municipais não se emendam, não tomam como lição os tristes acontecimentos e não solucionam os velhos problemas que voltam a rondar a cidade. Entra prefeito e sai prefeito e a situação caótica permanece. Esse caos a que me refiro trata-se do caos absoluto que reina em Belo Horizonte.

Exatamente pela ausência de labor severo do Executivo e pela tolerância do Legislativo municipal, ficamos a nos perguntar se temos, de fato, administração em nossa cidade. Ora, os problemas surgem e nenhuma autoridade vem a público explicar a razão do desastre urbano ou oferecer soluções para as demandas. Nada lhes importa, pois sabem que jogar a culpa na chuva é suficiente para amenizar as suas inteiras responsabilidades.

Alguns milímetros de chuva são suficientes para parar a cidade e colocar medo nos moradores. As obras não são realizadas, prioritariamente, para a prevenção das enchentes. A impermeabilização do solo e a degradação ambiental contribuem fortemente para esse tipo de catástrofe urbana, mas o município ignora esse fator.

Ao final de cada pancada forte de chuva, o que mais se vê são cidadãos desesperados pelas possíveis inundações e desmoronamentos, que seriam perfeitamente evitáveis se houvesse, de fato, alguma vontade política. No entanto, não há. Lamentavelmente, não se percebe nenhum zelo especial com a população.

Enquanto isso, na Câmara Municipal e na prefeitura, fala-se muito em composição para as próximas eleições; formação de chapas para a disputa estadual; trocas de nomes, partidos e cargos bem remunerados; “sucesso” do carnaval, que deixou sujeira, impossibilitou deslocamento de ambulâncias e inaugurou como banheiro as portas das residências e do comércio. O carnaval foi planejado, embora tenha deixado muito a desejar nos quesitos higiene, educação e direito de ir e vir. Já as chuvas não mereceram atenção, foram subestimadas e mostraram que a natureza exige cuidados, mais que o carnaval e mais que as eleições de 2018.

A população, recorrente na condição de excluída, seja das conversas de gabinete ou das firulas administrativas, se vira como pode e, regra geral, paga as contas salgadas e indigestas da frágil gestão executiva e da inexistente fiscalização legislativa. As promessas de campanha dos vereadores e do atual prefeito ficaram no papel. Nada de concreto e de positivo está sendo realizado em prol dos moradores da capital. No entanto, multiplicam-se as reuniões, confabulações e gestos ávidos, com olhos na esfera estadual.   

Não bastassem os estragos das chuvas, que não contaram com serviços de precaução ou prevenção, restam ainda os trabalhos de estabilização das encostas para serem executados e as centenas de edificações com risco de desabamentos que requerem vistorias urgentes. A cidade estava e continua um caos. Faltam limpeza e iluminação pública adequadas. Faltam os projetos de um metrô de verdade, e não de um superado trem metropolitano. Faltam as obras de remodelamento do Anel Rodoviário. Falta o desengavetamento do Plano Diretor, sem definição da prefeitura e da Câmara Municipal, embora aprovado pelo trabalho árduo e gratuito dos setores popular, técnico e empresarial. Falta muito trabalho na capital, a começar pela prevenção de enchentes e inundações, com a adoção de medidas urgentes e necessárias. Chega de omissão. Chega de culpar as chuvas. As chuvas são inocentes. 

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Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental). 

(Este artigo mereceu publicação do jornal ESTADO DE MINAS, edição de segunda-feira, 5 de março de 2018, pág. 7).


 



Comentários

  1. Coitada da chuva não tem culpa nenhuma. A chuva é uma benção para as plantas, para a vegetação, para os plantios de café, milho, soja., cana, arroz, e para os pomares e hortas. Culpar as chuvas é covardia desse poder público incompetente, sem noção, que só pensa em cargos, salários, mordomias, helicópteros, viagens internacionais, além dos empregos para parentes e puxa-sacos. As chuvas como falou o doutor Wilson Campos são inocentes, sim, porque só trazem o bem, enquanto esse poder público coberto de política rasteira não faz a sua parte e a cidade e os moradores pagam o pato, pagam a conta, ficam com os prejuízos materiais de toda sorte. Vergonha para a prefeitura e para essa Cãmara de vereadores que não faz nada. Eu sou Gabriel H. Julles M. de S.

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