PENSÃO PARA FILHAS DE SERVIDORES



 
A pensão por morte concedida a filhas solteiras maiores de 21 anos de servidores públicos civis volta a causar celeuma no Poder Judiciário, com decisões favoráveis em algum momento e outras nem tanto em situações análogas. A controvérsia coloca em choque desembargadores e ministros de instâncias superiores.

A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, determinou nesse 11/07/2018 a retomada do pagamento de pensão por morte a duas filhas de servidores federais. O caso chegou ao STF após o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar a suspensão do pagamento.

Ao decidir a questão, Cármen Lúcia entendeu que o pagamento deve ser retomado porque uma decisão anterior do ministro Edson Fachin, assinada em maio, derrubou o entendimento do TCU que determinava a revisão e o cancelamento de pensões por morte concedidas a filhas de servidores civis maiores de 21 anos que tenham outras fontes de renda.

“Seu indeferimento poderia conduzir à ineficácia da medida se a providência viesse a ser deferida somente no julgamento de mérito por ter a pensão natureza alimentar, com gravosas consequências do não recebimento pelas impetrantes”, decidiu a ministra.

Pelo entendimento firmado com a decisão de Fachin, o regime para a concessão do benefício deve ser aquele vigente no momento da morte do servidor. “Assim, enquanto a titular da pensão permanece solteira e não ocupa cargo permanente, independentemente da análise da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista em lei, tem ela incorporado ao seu patrimônio jurídico o direito à manutenção dos pagamentos da pensão”, afirmou Fachin.

A Lei 3.373/1958 estipulava que “a filha solteira, maior de 21 anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente”. A norma foi revogada, entretanto, pela Lei 8.112/1990, mas se estima que cerca de 50 mil pensionistas ainda recebam o benefício.

A nova lei não inclui filhas maiores de 21 anos no rol de dependentes habilitados a receber pensão. Com base nessa nova legislação e após uma varredura em mais de 100 órgãos públicos, o TCU identificou 19.520 benefícios com indícios de irregularidade.

Segundo o Tribunal de Contas, a revisão de pensões irregulares poderia proporcionar uma economia de até R$ 2,2 bilhões aos cofres públicos num período de quatro anos.

Com o objetivo de conter gastos públicos com o pagamento de pensões concedidas com fundamento na revogada Lei Federal nº 3.373 de 1958, o TCU editou a súmula 285 em 14 de julho de 2014, cuja redação é a seguinte: A pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990”.

Como se vê, a Corte de Contas passou a exigir a prova de dependência econômica por parte de filhas de ex-servidores públicos, para a manutenção do benefício de pensão previdenciária previsto na Lei Federal 3.373/1958.

Apesar de louvável qualquer esforço que tenha por objetivo diminuir o sangramento diário dos cofres públicos, a súmula em destaque carece de segurança jurídica. Daí a decisão da presidente do STF em entendimento contrário ao abraçado pelo TCU.

Entretanto, o imbróglio é tamanho que repercute a decisão de instância inferior ao STF, que nega a pensão. Ou seja, enquanto o STF concede, o TRF2 nega. Vejamos:

A Quinta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) negou o pedido para que fosse restabelecida a pensão pela morte do pai da demandante. O benefício foi cancelado na esfera administrativa em virtude da não comprovação da dependência econômica da autora em relação ao ex-servidor do Ministério da Saúde, fator condicionante para a manutenção da pensão por morte.

Também na esfera judicial, a dependência não foi demonstrada, levando à confirmação da decisão administrativa. A pensão temporária foi pleiteada com base na Lei 3.373/58, por se tratar da legislação em vigor na data de falecimento do segurado. Mas, da leitura do artigo 5º, II, a, e parágrafo único, da referida lei, extrai-se que, para fazer jus ao benefício, a filha maior de 21 anos de servidor público civil não poderia ser casada e nem ocupar cargo público permanente.

No mesmo sentido, o TCU se pronunciou sobre o tema na Súmula nº 285, segundo a qual: “A pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990”.

Sendo assim, o juiz federal convocado, que atuou na relatoria do processo no TRF2, considerou que, como no caso em julgamento, a autora não ostentava o estado civil de solteira no momento da morte do instituidor do benefício (14/01/87), pois só se divorciou quatro anos depois (10/10/91), não faz jus ao benefício pleiteado.

O magistrado ressaltou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) até admite a equiparação das filhas desquitadas, divorciadas ou separadas às solteiras, desde que seja comprovada a dependência econômica com relação ao instituidor da pensão. “Entretanto, esta possibilidade se restringe à condição de divorciada no momento do óbito, o que não ocorreu no caso concreto”, pontuou.

O relator acrescentou que, além disso, há elementos no processo que desqualificam a alegada dependência econômica, como é o caso do termo da ata de audiência de conciliação do divórcio da autora, no qual consta que “o cônjuge mulher abre mão de pensão alimentícia em seu favor por possuir meios próprios de subsistência”.

Em juízo, a própria autora admitiu que, apesar de pouco ter atuado como advogada, trabalhou como secretária, e ainda, que foi titular de uma firma individual de comércio de material descartável para limpeza. De acordo com o juiz, os depoimentos prestados pelas testemunhas foram uníssonos em afirmar que a autora trabalhava vendendo roupas e outras coisas que se pode vender em casa.

Dessa forma, o magistrado concluiu que “a Lei 3.373/58, ao impor como requisitos para a percepção do referido benefício que a filha maior seja solteira e não ocupante de cargo público, pretende amparar aquelas filhas que dependem economicamente de seus genitores. A partir do momento em que a beneficiária toma posse em cargo público ou contrai matrimônio, pressupõe-se que a dependência financeira cessou, sendo indevido o pagamento de pensão”. Processo 0010812-44.2014.4.02.5101.

Ficam aí as demandas apresentadas para a interpretação do leitor, confusas, de idas e vindas, mas com o crivo maior do STF, que concedeu a pensão, restando entender que a presidente do STF acompanhou a decisão do ministro Fachin, que sentenciou anteriormente da seguinte forma: “Assim, enquanto a titular da pensão permanece solteira e não ocupa cargo permanente, independentemente da análise da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista em lei, tem ela incorporado ao seu patrimônio jurídico o direito à manutenção dos pagamentos da pensão”.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).



Comentários

  1. Este direito de filhas de servidores deveria ser utilizado para todos os brasileirinhos e brasileirinhas que pagam impostos e não têm direito nem sequer a uma aposentadoria respeitável. Essa diferença de tratamento é absurda e inaceitável. Quando será que vamos acabar com tanta sujeira?
    Sócrates G. de S. - aposentado.

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