O INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR).

 

O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) não se trata de uma ação autônoma ou um recurso, mas de um incidente processual dirigido aos Tribunais de Segunda Instância (Estaduais ou Regionais), que tem como objetivo suspender o andamento de ações que compulsem uma questão específica de direito, em casos em que fique evidenciada a repetição de processos e o risco de ofensa aos princípios da isonomia e da segurança jurídica. Ou seja, a ideia é unificar a jurisprudência e conferir coerência no tratamento do direito.  

 

O artigo 976 do CPC/2015 dispõe que é cabível a instauração do IRDR quando, simultaneamente, existirem repetitivos processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e houver risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

 

“O instituto quer viabilizar uma verdadeira concentração de processos que versem sobre uma mesma questão de direito no âmbito dos tribunais e permitir que a decisão a ser proferida nele vincule todos os demais casos que estejam sob a competência territorial do tribunal competente para julgá-lo. Pode até ocorrer de haver recurso especial e/ou extraordinário para o STJ e/ou para o STF, respectivamente, viabilizando que o mérito do incidente alcance todo o território nacional”, afirma o professor Cássio Scarpinella Bueno.

 

Já a doutrina de Tereza Arruda Alvim leciona que: “A nova lei exige que haja efetiva repetição de processos e não mera potencialidade de que os processos se multipliquem. Parece, todavia, que os objetivos do instituto ficariam inteiramente frustrados, se se exigisse, para a instauração do incidente, que já se tivesse instalado o caos na jurisprudência de primeiro grau, com milhares de sentenças resolvendo de modos diferentes a mesma questão de direito. Não. Se a lei exige que já haja processos "repetidos" em curso, é razoável que se entenda que bastem duas ou três dezenas, antevendo-se a inexorabilidade de a multiplicação destas ações passarem a ser muito maior”.

 

Quanto à possibilidade ou não do IRDR, resta sabido que, conforme previsto no parágrafo 4º do artigo 976 do CPC/2015, esse é incabível quando um dos tribunais superiores, dentro de sua competência, já houver determinado a afetação de recurso para definição de tese quanto à matéria repetitiva. Caso o IRDR não seja admitido por ausência dos requisitos previstos no artigo em comento, é certo que, nos termos do parágrafo 3º, desde que os requisitos sejam futuramente preenchidos, o incidente poderá novamente ser suscitado.

 

No âmbito do IRDR, o Ministério Público, quando não for o requerente, deve intervir de forma obrigatória no incidente e assumir sua titularidade em caso de desistência ou abandono por parte de quem o suscitou originalmente. Isso significa que, de acordo com o previsto no parágrafo 1º do art. 976, uma vez admitido o incidente de resolução de demandas repetitivas, o seu exame de mérito passa a ser o grande objetivo do julgador, de modo que a desistência ou abandono do processo que o originou não impede o seu almejado exame de mérito.

 

Segundo o artigo 977 do CPC/2015, o pedido de instauração do incidente deve ser dirigido ao presidente do tribunal, sendo que tal pedido será feito por ofício quando realizado pelo juiz ou relator; e por petição quando realizado pelas partes, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública. De sorte que o ofício ou a petição será instruído com todos os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente.

 

O artigo 978 do CPC/2015 dispõe que o julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal. Já o parágrafo único desse artigo dispõe que o órgão colegiado que será designado para julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas, e fixar a respectiva tese jurídica, também deverá julgar igualmente o recurso, a remessa necessária, ou o processo de competência originária do qual se originou o incidente.

 

Vale observar que o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas é tratado pelo CPC, do artigo 976 ao 987, cabendo ao interessado a leitura e a interpretação dos dispositivos, de modo que sejam enfrentadas as controvérsias que o mundo jurídico destacou até então, haja vista a concordância de uns e a discordância de outros em relação à aplicabilidade justa e célere do IRDR nos autos dos processos.

 

Não resta dúvida que o IRDR se mostra como uma inovação para o direito processual, mas como toda e qualquer novidade, a discussão no campo doutrinário rende opiniões divergentes e não há consenso se haverá um avanço ou um retrocesso. Contudo, o instituto representa importante ferramenta de evolução para a tutela coletiva, posto que, além de tornar mais viável a efetivação de princípios constitucionais basilares, como a segurança jurídica e a duração razoável do processo, também significará avanço na seara da tutela coletiva, uma vez que serão possíveis ações na defesa de interesses metaindividuais relativas a variadas matérias e não somente de acordo com o estabelecido na legislação atual, calcada em Ação Civil Pública, Ação Popular e Direito do Consumidor.

 

Também não resta dúvida no sentido de que se fazem urgentes soluções para a lentidão do Poder Judiciário e para a uniformização de jurisprudências no que respeita a demandas idênticas da lide, sem, contudo, colocar em risco o devido processo legal e o Estado democrático de direito.

 

Portanto, embora o tema seja polêmico e não seja possível esgotá-lo em um só artigo, cumpre ressaltar que a novidade trazida pelo incidente vem acompanhada de divergências por parte dos juristas e magistrados, mormente quando se pergunta, por exemplo:

1) É possível instaurar o IRDR no âmbito de qualquer tribunal, inclusive dos tribunais superiores, ou haveria restrição pontual nesse sentido?

2) Cabe instauração de IRDR mesmo se já encerrado o julgamento da causa?

3) E se ainda estiver pendente a análise de Embargos de Declaração?

4) Afinal, o objetivo do IRDR é a formação de uma tese de direito somente dentro dos limites territoriais do tribunal, com seus respectivos juízes seguindo a jurisprudência do tribunal de uma maneira uniforme ou vale para outros tribunais estaduais e regionais pátrios?

5) É prudente julgar apenas um caso e o transformar em um modelo para que a tese definida seja adotada em todos os demais casos semelhantes?

6) A litigiosidade em massa na sociedade contemporânea justifica por si só a uniformização de teses ou o direito processual requer equilíbrio dos órgãos julgadores para que não sejam injustiçados os jurisdicionados em seus casos concretos?

 

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).

 

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Comentários

  1. Dr. Wilson as suas perguntas no final do artigo geraram em mim muitas dúvidas porque eu entendia que a uniformização das decisões em casos parecidos e repetitivos seria rápida e atenderia o jurisdicionado, mas agora percebo que pode não ser assim, pois cada caso é um caso e o IRDR não veio dar celeridade como esperado pois o Judiciário continua lento e moroso como sempre foi. Isso é que é triste e causa a desconfiança do cidadão quanto à Justiça brasileira. Nas causas coletivas é uma coisa, mas nemsemp5e os interesses são os mesmos ainda mais se diante do Estado e da proteção singular que tem do Judiciário, o que não se verifica em relação ao jurisdicionado comum. Gostei muito do artigo e vou estudar mais a respeito e vou reler o artigo para compreender melhor as entrelinhas do caso IRDR. Obrigado colega e nobre causídico Dr. Wilson Campos. Excelente trabalho de análise. Sou Luíz C.F.

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