AUMENTO DO BARULHO, NÃO!


Para tristeza dos belo-horizontinos, até o prefeito Alexandre Kalil para quem “a cidade do não pode acabou”, ou seja, agora é o novo tempo do “tudo pode”, está acomodado, mesmo sabendo que o aumento do barulho vai transformar a vida dos moradores num inferno, pois o respeito aos vizinhos, aos residentes em casas e prédios e onde quer que estejam pessoas trabalhando ou descansando, a paz vai ser quase impossível de ser respeitada.

Ocorre que os defensores do barulho voltam a ameaçar a Lei do Silêncio em Belo Horizonte. E isso ocorre em função da iniciativa de alguns vereadores que pretendem flexibilizar a norma para que alguns setores possam aumentar os decibéis e infernizar ainda mais a vida da população.

Os vereadores interessados no aumento do barulho estão na contramão da qualidade de vida requerida pela população. Por um lado, a Câmara Municipal não tem tempo para fiscalizar o Executivo; não tem disposição para trabalhar por uma BH mais limpa, mais iluminada e com melhor trânsito; não apresenta solução para os problemas de limpeza, segurança, transporte, moradia ou desenvolvimento. Mas, por outro lado, tem tempo de sobra para defender o aumento de barulho na capital, que interessa a poucos empreendedores e a eles próprios. 

Constata-se, com essa atitude açodada e atrapalhada, um flagrante antagonismo entre o que deseja a sociedade e o que propõem e votam alguns parlamentares municipais. Lamentavelmente esse desencontro entre o Legislativo municipal e os moradores empobrece ainda mais as relações sociais na capital. 

Há algum tempo está tramitando na Câmara Municipal o indigesto projeto de lei que flexibiliza a Lei do Silêncio em Belo Horizonte. Tal medida, interpretada como inconstitucional e afrontosa às normas regulamentadoras nas esferas federal, estadual e municipal, denota enorme desapreço pela qualidade de vida dos moradores, uma vez que extrapola a práxis recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e coloca em risco o sossego recôndito do lar, à míngua do conforto das famílias. Daí a indignação dos cidadãos e cidadãs que querem simplesmente tocar a vida sem percalços na saúde, no horário de descanso e na hora de dormir. 

De autoria dos vereadores Elvis Cortês (PSDC) e Autair Gomes (PSC), o Projeto de Lei nº 751/2013 propõe aumentar o limite de ruído permitido em dias úteis, fins de semana e feriados, favorecendo certas atividades locais. Enquanto a Lei Municipal nº 9.505/2008, mais conhecida como Lei do Silêncio, prevê nível máximo de emissão de ruídos de 70 decibéis (dB), o inusitado e novel texto legal, se assim podemos chamar, aumenta bastante os decibéis, beneficiando interesses de determinados segmentos empresariais. A rigor, mostra-se inadmissível o retrocesso projetado contra a população, que restará sujeita aos crescentes barulho e desgaste, ao adoecimento e ao estresse, ferindo de morte os princípios da inviolabilidade, da autonomia e da dignidade da pessoa humana. Daí, vale repetir - esse desencontro entre o Legislativo municipal e os moradores empobrece ainda mais as relações sociais na capital.  

Não se está aqui retirando o valor socioeconômico dos setores comerciais envolvidos no polêmico aumento de barulho na cidade. Ora, em que pese a importância dos estabelecimentos comerciais e outros que querem a mudança da lei, o apelo da sociedade organizada é pelo bom senso dos vereadores, de forma que eles saibam respeitar a opinião, a vontade e o sossego da maior parte dos moradores da cidade. Simples de resolver - basta os empresários investirem na proteção acústica, no revestimento interno contra expansão de barulho, e não perturbarem demasiadamente a paz alheia.

Os vereadores que defendem o barulho e os empresários dos setores envolvidos alegam que as mudanças na lei do silêncio resultarão em geração de renda e empregos, por exemplo, na contratação de cumins, garçons, seguranças e artistas. Segundo eles, “essa atividade complementar atua de maneira acessória em bares e restaurantes e vai dar novo impulso a uma das vocações da cidade”. Mas a sociedade não quer mais barulho do que normalmente gera a cidade, e vários movimentos sociais, associações de moradores e pessoas ligadas ao meio ambiente resistirão à ideia, porque a flexibilização vai se transformar em abuso e mesmo a música alta vai piorar a qualidade de vida dos cidadãos e cidadãs, que, depois de um dia cansativo de trabalho precisam descansar, dormir e estarem prontos para o dia seguinte. Aliás, nada mais justo que os empresários desses setores respeitarem a qualidade de vida dos moradores, porque são eles os seus clientes do dia a dia. Ora, são os moradores os frequentadores de bares, restaurantes, casas de shows e outros lugares que teimam em aumentar o barulho e projetar a poluição sonora. 

Alguns representantes de órgãos municipais acreditam no mote do prefeito e dizem: “é tão bom ouvir que hoje tudo pode”. Acontece que essa afirmativa não condiz com o que pensa a maioria esmagadora dos moradores da cidade. Ora, não se pode confundir barulho ensurdecedor com manifestações culturais. Essa conversa de se criar uma capital mais alegre poderia começar por limpeza, mobilidade urbana, segurança, iluminação, cuidados com praças e parques, acolhimento de mendigos que moram nas ruas e debaixo de viadutos, tapação de buracos das ruas e avenidas, sinalização das vias, desobstrução de bueiros e prevenção de enchentes, e não com aumento de barulho. Aliás, o mínimo exigível do prefeito é que ele aja com equilíbrio, para que a sociedade se comporte com harmonia e parcimônia.

Existem milhares de pessoas que não suportam mais tanto barulho na capital, uma vez que a cidade já é barulhenta durante o dia e agora será também à noite. Ou seja, a tranquilidade e o sossego no aconchego do lar estão sendo retirados por alguns apreciadores do “barulhaço”, porque alguns vereadores e o senhor prefeito entendem que agora "tudo pode" na cidade, inclusive retirar a paz daqueles que querem descansar e dormir.

Até pouco tempo o alvará da atividade de bares e restaurantes não contemplava a execução de música de nenhum tipo. Se fosse descumprida essa determinação legal, a fiscalização notificava o estabelecimento e aplicava a multa. Agora com a instrução normativa da Secretaria Municipal de Regulação Urbana, a fiscalização passa a aceitar a música nos bares e restaurantes, desde que existam os alvarás de licença e funcionamento, e obedeçam os limites de emissão de ruídos estabelecidos pela Lei 9.505/2008.

No entanto, embora a prefeitura prometa fiscalização rigorosa, os moradores reclamam que os fiscais nunca aparecem quando chamados, e o barulho é crescente, muito acima do permitido, contribuindo para a exaustão e o sofrimento das pessoas vizinhas. Imaginem os moradores se a tal flexibilização pretendida por alguns vereadores for implantada, o que acontecerá? Tudo pode? Terra de ninguém?

Os novos tempos de muito barulho não podem acontecer, mesmo que isso contrarie interesses dos proprietários de bares e restaurantes e de outros setores equiparados, que são importantes para a cidade, mas os moradores são também muito importantes e não podem ficar à mercê da poluição sonora que é causadora de muitos males à saúde do indivíduo.

Os médicos sempre avisam que a exposição prolongada a ruídos excessivos pode causar de estresse e depressão a infarto e acidente vascular cerebral (AVC). Segundo a OMS, todo e qualquer ruído que ultrapasse a casa dos 55 decibéis (unidade de medida do som) já pode ser considerado prejudicial à saúde.

Enquanto a população se manifesta, se revolta e espera por uma decisão humanamente aceitável, os nobres vereadores que fazem parte da defesa do aumento de barulho, da flexibilização da lei do silêncio e da liberação dos decibéis confortam-se em seus gabinetes e pouco se importam com o caos em que está se transformando a cidade. Aliás, o que mais se vê atualmente é gente reclamando de lixo espalhado, de buracos nas ruas e avenidas, de mendigos nas calçadas e canteiros e sob os viadutos, de vias escuras ou mal iluminadas, de transporte público ineficiente e obsoleto. Ou seja, a cidade está feia, suja, pobre, mal iluminada e descuidada. A cidade precisa de atenção e cuidados emergenciais e não de aumento da poluição sonora. 

Enfim, o grande desafio para a prefeitura de BH será controlar os 60 decibéis nos bares e restaurantes. Os estabelecimentos vão, com certeza, exceder esse limite, e a fiscalização municipal não estará presente para autuar. E se autuar, os proprietários não levarão em conta, ou recorrerão, e a atividade barulhenta continuará, para desespero dos vizinhos e dos moradores da outrora Cidade Jardim, hoje com cara de cidade abandonada, barulhenta, escura e desumana, que, brevemente, completará 120 anos. Portanto, no aniversário da nossa amada e querida Belo Horizonte, vamos todos celebrar com equilíbrio e de forma que a população seja escutada nas suas reivindicações cotidianas. 

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Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/ Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).



Comentários

  1. TENHO PENA DE QUEM MORA PERTO DE BUTECOS ONDE TUDO PODE COMO DISSE O PREFEITO KALIL NA IMPRENSA ALGUM TEMPO ATRÁS. TUDO PODE É BOM PARA QUEM TEM RESPEITO PELAS NORMAS, PELO DIREITO E CUMPRE COM A SUA OBRIGAÇÃO. MAS TUDO PODE PARA QUEM NÃO RESPEITA O SILÊNCIO DO OUTRO QUE QUER DORMIR OU DESCANSAR É UMA SACANAGEM MUITO GRANDE. HORA DE SILÊNCIO É HORA DE RESPEITAR O DIREITO DO OUTRO DE FICAR EM PAZ, NA TRANQUILIDADE DA CASA OU DE QUALQUER LUGAR URBANO. A LEI É PARA SER CUMPRIDA E DE FORMA QUE OS MORADORES SEJAM RESPEITADOS NAS SUAS HORAS DE DESCANSO. MÚSICA ALTA EM BARES, EM IGREJAS, EM SHOWS, ETC, NÃO É POSSÍVEL DE TOLERAR PORQUE O DIREITO DE UM VAI ONDE COMEÇA O DO OUTRO. SE QUEREM BARULHO NOS SEUS ESTABELECIMENTOS QUE INSTALEM, ENTÃO, CABINES ACÚSTICAS OU FAÇAM PROTEÇÃO PARA NÃO INCOMODAR OU INFERNIZAR A VIDA DO OUTRO. PARABÉNS DR. WILSON PELO BELO ARTIGO E PELA CONSCIÊNCIA SEGURA NO TEXTO. EMANUEL G. Q. P. OLIVETTO.

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