NÃO DESEJAMOS O CAOS



Falta-me paciência e estômago para aguentar tanta estultice cometida pelos políticos brasileiros. E vêm-me à lembrança essas sábias palavras de advertência do autor: "Na primeira noite eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada." (Eduardo Alves da Costa).

O governo brasileiro caminha à custa de compra de emendas, pagas com dinheiro público, mas que beneficiam deputados federais que votam a seu favor. Um verdadeiro toma lá, dá cá. Não bastasse isso, o exemplo torna-se uma barganha sem fim, onde o próprio presidente da República se transforma em refém de políticos interesseiros, que apenas são fiéis enquanto durar a verba negociada.

Entretanto, embora a sociedade brasileira não deva pactuar com essa sujeira político-governamental, também não deve se afastar dos princípios constitucionais, que são basilares da democracia. A legalidade inquestionável que se busca é a pedra de toque para os anseios das multidões. E o princípio da legalidade, um dos sustentáculos fundamentais do Estado de direito, em nada surpreende quando conclamado pelos submetidos. A majestade do exercício da legalidade faz com que os indivíduos encontrem o fundamento das suas prerrogativas, bem como a clareza solar de seus direitos e deveres.

O caos anunciado se revela quando as garantias conquistadas são retiradas. A sociedade inerte se inquieta e passa a questionar. Os signatários do plácido poder do “não sou, mas estou”, arregimentam-se na tocaia da madrugada e simplesmente mandam mudar. Trocam o certo pelo duvidoso e o povo, boquiaberto, inquieta-se mais ainda. Mas a clarividência dos falsos poderosos não conta com a insatisfação coletiva, e esta é severa quando muitos querem e fazem acontecer. O povo não quer o caos, mas os criminosos de colarinhos brancos teimam em plantá-lo no seio da sociedade.

A instalação do caos se avoluma na medida em que a impunidade aumenta. A arrogância do desmedido não tem tamanho e cresce cada vez mais, principalmente quando se trata de um povo que se submete. Mas quando este povo sai de sua posição de cócoras, se ergue e se agiganta, as garantias retiradas se reapresentam. O povo não é povo simplesmente por ser. O povo é mais. O povo é cidadão, é soberano, é contribuinte, é aquele que paga a conta.

A insanidade dos pseudo poderosos não os remete à realidade dos dias de hoje. E o hoje a que me refiro é a realidade dos fatos discutidos nas rodas de amigos, nas esquinas, nos clubes, nas reuniões, nas empresas, nos lares e em todos os lugares onde estejam pessoas que já não suportam mais tanta safadeza dos vendilhões do patrimônio público, dos corruptos, dos operadores de propinas, dos praticantes da obstrução da justiça, dos criminosos travestidos de representantes do povo.

A Reforma Trabalhista foi açodada e retirou direitos dos trabalhadores. A Reforma da Previdência ameaça ser radical e também retirar direitos dos beneficiários. A Reforma Política vem sendo transformada numa colcha de retalhos, interminável, por vontade dos políticos e das oligarquias partidárias. A Reforma Tributária é cogitada, especulada, mas sempre adiada, justamente por representar ameaças aos cofres do governo e ser uma alavanca para a tributação das grandes fortunas.

Os brasileiros não desejam o caos. No entanto, as autoridades insistem em dar maus exemplos, em fugir de suas responsabilidades, em empurrar o ônus para os cidadãos comuns e em causar a desesperança na população. Basta ler, assistir e ouvir o que a imprensa nacional divulga diariamente. A realidade é triste e a vergonha alheia não intimida os detentores do poder. Mas as coisas vão mudar. O eleitor vai saber dar o troco na hora certa.   

A esperança é que o fim do caos se dará por certo nas eleições. A retribuição será na mesma moeda. O contribuinte que é o cidadão, que é o eleitor, que é o munícipe, que é o trabalhador, que é o indivíduo alijado, que é o jogo de empurra dos interesseiros travestidos de administradores públicos, e que é uma das peças fundamentais da democracia, com certeza saberá medir os políticos pelos seus atos. As eleições estão próximas e próximo está o direito do povo se manifestar civicamente.

O remédio para o restabelecimento dos direitos e garantias retirados é uma boa dose de indignação popular, misturada à atitude enérgica de que basta de desmandos. Uma boa sacudidela no Poder Judiciário é necessária, para retirá-lo da inércia e para que a Justiça seja aplicada e as leis sejam iguais para todos. 

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Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).



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