QUEDA DE BRAÇO



Quando a política de interesses ameaça o equilíbrio necessário ao país, providências severas precisam ser tomadas. Veja-se o caso da troca de farpas da reclamada usurpação de poderes entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Senado, que se instala na forma de nova batalha entre o Judiciário e o Legislativo, relativamente à decisão tomada pelo STF que impôs a Aécio Neves (PSDB-MG) afastamento do mandato e recolhimento noturno.

O julgamento da primeira turma do STF, por três votos a dois, provocou reações também no próprio tribunal, que conta com ministros contra e a favor.

Preocupados com o próprio destino, já que muitos são investigados, senadores passaram a cobrar do presidente do Senado Eunício Oliveira (PMDB-CE), que leve o assunto para votação em plenário. Esses senadores afirmam que o afastamento de Aécio Neves não tem respaldo na Constituição e citam o artigo 53 do texto. O dispositivo prevê prisão para parlamentares só em caso de “flagrante delito de crime inafiançável”.

Os senadores acreditam que o STF extrapolou a interpretação da Constituição e que é uma teratologia patente o que se fez, aplicando-se sanções que não estão previstas.

O Palácio do Planalto também monitora o desfecho do caso de Aécio. Por ser um dos principais aliados de Michel Temer no PSDB, a permanência do tucano é vista como essencial para que o governo mantenha o apoio da sigla.

Eunício Oliveira evitou se posicionar sobre o assunto até ser notificado. Logo após ter recebido o oficial de Justiça em sua casa, ele entrou em contato com líderes de partidos, realizou reuniões e disse que a previsão é que o assunto seja submetido ao plenário da Casa.

A votação, contudo, depende de quórum. Bastam 41 votos, entre os 81 senadores, para o Senado não cumprir a decisão.

O próprio PT, adversário do PSDB de Aécio, já se manifestou contra o afastamento.

No encontro, senadores devem ainda discutir o procedimento a ser adotado no plenário. A estratégia de tucanos é submeter simultaneamente tanto o afastamento quanto o recolhimento noturno para análise. Com isso, avaliam, as chances são maiores de que as duas medidas sejam revertidas.
Aécio é alvo de denúncia por corrupção passiva e obstrução da Justiça. Ele foi gravado pelo empresário Joesley Batista, da JBS, a quem pediu R$ 2 milhões. Na conversa, que veio à público após a delação de Joesley, ele fala sobre a necessidade de fazer mudanças na estrutura da Polícia Federal.

Entre os ministros do STF há divergência. Gilmar Mendes defende que o plenário da corte deve rediscutir a punição ao senador tucano. “Quando a turma começa a poetizar, começa a ter um tipo de comportamento, vamos dizer assim, suspeito, certamente seria bom que a matéria viesse para o plenário”.

O ministro Marco Aurélio, voto vencido no julgamento, vê espaço para que o Senado não cumpra o afastamento. “Não estou incitando o Senado a reverter. Se ele pode o mais, que é rever até uma prisão, o que dirá a suspensão do exercício do mandato”.

Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, favoráveis ao afastamento, entendem que não cabe aos senadores descumprir o julgamento.

Na visão de parlamentares, o Legislativo não pode tolerar interferências do Judiciário, pois já concedeu em relação ao Delcídio do Amaral e depois calou-se em relação ao Eduardo Cunha.

O PT soltou uma nota em que, ao mesmo tempo em que culpa Aécio pela crise econômica e política, critica o STF: “A resposta da primeira turma do STF a este anseio de Justiça foi uma condenação esdrúxula, sem previsão constitucional, que não pode ser aceita por um poder soberano como é o Senado”, declarou o partido.

Nos últimos dois anos, Legislativo e Judiciário tiveram queda de braço em pelo menos quatro episódios envolvendo a imposição de medidas contra parlamentares. Em novembro de 2015, o STF determinou a prisão do ex-senador Delcídio do Amaral por tentativa de frear investigações da Lava Jato. Na ocasião, o Senado confirmou a decisão da Justiça, conforme prevê a Constituição. Em 2016, o ex-deputado Eduardo Cunha foi afastado da presidência da Câmara. No mesmo ano, Marco Aurélio afastou Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado, medida que não foi cumprida pela Mesa Diretora. O caso acabou sendo revertido no plenário do próprio Supremo.

Resumo dessa ópera bufa: o Senado decidiu nesta terça-feira, 3 de outubro, em votação no plenário, recuar e adiar para 17 de outubro a votação que poderia barrar o afastamento e o recolhimento noturno do senador Aécio Neves. A maioria dos senadores entendeu que seria melhor aguardar a decisão da Suprema Corte, que está agendada para o dia 11 de outubro próximo.

Enquanto isso: a população sofre os rigores dessa crise político-econômica, os direitos fundamentais do povo não são entregues, os estados ficam à mingua e parcelam até os salários dos servidores públicos civis e militares, a beligerância política se soma à violência urbana, o país se ressente da falta de investimentos e o caos prospera. Tudo isso porque o Estado não tem uma administração séria, competente, honesta, transparente, republicana, voltada para os interesses do povo. O Estado brasileiro, atualmente, não serve ao povo, mas serve-se do povo. A política sórdida praticada arrasa o Estado e indigna o povo.

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Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).



Comentários

  1. Nunca pensei que iria viver para ver uma vergonha dessa, onde os poderes se estranham e o Legislativo ameaça desobediência a uma determinação judicial. Senadores peitando o Judiciário, o STF, a Corte Máxima. Que negócio é esse? Se a moda pega, como vai ficar? Se deputados e senadores não obedecem as decisões do Judiciário, quem vai querer obedecer? Não somos todos iguais perante a lei, como diz a CF/88? Então, cumpra-se para que assim seja. Lei é Lei e decisão judicial se cumpre, e se não concorda, recorre, dentro dos trâmites legais. Parabéns colega Dr. Wilson Campos, pela excelente colaboração com BH, MG e com o Brasil. Adv. Renato G.H.S.Jr.

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