AUTONOMIA MUNICIPAL.



  
Causa estranheza o fato de os prefeitos, de norte a sul do país, interferirem na escolha dos presidentes das câmaras municipais. Enquanto alguns disfarçam, outros agem acintosamente no processo eleitoral, demonstrando de forma lamentável o predomínio do Executivo sobre o Legislativo. Além do que, muitos presidentes de casas legislativas não se elegem por merecimento, mas por meio de articulações políticas engendradas pelos alcaides, que rompem com a autonomia municipal.

As necessárias harmonia e independência entre os Poderes são questionadas pela população, mas ela, simples coadjuvante, nem sequer é consultada, uma vez que o jogo político se estabelece entre os protagonistas, entre os quais se torna comum a luta para formar uma bancada forte, de preferência com maioria absoluta, para que se possa aprovar o que é do agrado e barrar o que desagrada o gestor municipal. Um jogo de parcimônia e dualismo, ao mesmo tempo.

Uma controvérsia recorrente é o endeusamento de determinados parlamentares e governantes, incapazes de legislações e administrações arrojadas, proativas e contemporâneas, mas portadores de um pertencimento desconectado com a realidade. A popularidade que alegam possuir resta mascarada por reações e atitudes, levando a crer que a população, que tanto reclama das injustiças, também utiliza o sistema baseado em dois pesos e duas medidas, agindo por paixão e rejeitando a razão. A arte de legislar e administrar a coisa pública exige conhecimento do que sejam legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência.

A cidade não é uma empresa ou um time de futebol. A cidade não é propriedade de vereadores e prefeitos. A cidade é um excelente espaço para a convivência da autonomia política, caracterizada pela capacidade de autogoverno; para o exercício da autonomia normativa, esmerada na capacidade de elaborar as próprias leis sobre matérias de interesse municipal, mas desde que constitucionalmente permitidas; para a competência gestora da autonomia administrativa, que diz respeito ao poder de gerir e de organizar os próprios serviços; e para a percuciência da exata autonomia financeira, que revela a perícia para arrecadar os tributos e aplicar as receitas.

A rigor, o que a sociedade deseja é o cumprimento das atribuições legais por parte de vereadores e prefeitos, seja organizando, legislando, deliberando, fiscalizando, administrando ou executando, por atos privativos ou independentes, mas que denotem excelência nos controles financeiro, orçamentário, patrimonial e operacional do município.

Cabe, portanto, às câmaras municipais abandonar o triste papel de causadoras de problemas e exercer a digna função de encontrar soluções, elaborar boas leis e fiscalizar e controlar os atos e as contas do Poder Executivo municipal. 

Assim como cabe às prefeituras administrar os interesses da cidade, trabalhar pelo bem-estar dos cidadãos e não exceder ao que a lei não autoriza.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de segunda-feira, 24 de dezembro de 2018, pág. 15). 


Comentários

  1. Eu tinha lido o seu artigo Dr. Wilson, no jornal, antes. Mas agora me manifesto por achar que o artigo reflete o que ocorreu em BH, com o prefeito influenciando a eleição da nova presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte. Ora, isso é uma ingerência de um Poder no outro, descaradamente. E os vereadores fazem de conta que trabalham, legislam e fiscalizam, enquanto o Executivo dá as cartas e manda deitar, rolar e pegar o pau que atira longe. Bando de obedientes e cabeças baixas, com exceções, claro, raríssimas. Esses vereadores precisam se libertar do prefeito e fazer o seu papel correto e ético, encontrando soluções, sim, como disse o ilustre advogado que assina o artigo. Meus pêsames aos vereadores e prefeito de BH pelo mau comportamento e meus parabéns ao Dr. Wilson Campos por mais um brilhante artigo na defesa da coisa pública, dos interesses coletivos e de BH e de Minas. Evandro MRSP Nobre - historiador, professor e microempresário na área do ensino universitário em MG.

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  2. Gostaria que os vereadores olhassem mais pela cidade e não para seus interesses próprios e da mesma maneira o prefeito. São pagos para trabalhar para o povo e não para eles ou para pessoas de influência. Que papelão isso que acontece, de uns submissos aos outros. Essa história de poderes autônomos é conversa mole, porque não funciona em BH e nem no país. A Câmara dos Deputados e o Senado são outros que fazem o que o chefão do executivo manda, e ponto final. Vergonha isso. Alice Pedrosa - cidadã comum de BH. Ah!!! Parabéns Dr. Wilson Campos pelo magnífico artigo que mostra a verdade das cidades e do Brasil.

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