DESIGUALDADE DE TRATAMENTO EM FÓRUNS PROVOCA REVOLTA DE ADVOGADOS.


O tratamento diferenciado sempre foi motivo de controvérsia, principalmente para aqueles que sofrem na pele a desigualdade praticada. Esse é o pomo da discórdia nos tribunais brasileiros, atualmente, uma vez que a instalação de sistemas de detecção de metais em fóruns tem servido apenas para vistoriar os advogados e o público em geral, liberando dessa “fiscalização” juízes, promotores e serventuários. Ora, isso é um despropósito e fere de morte as prerrogativas dos advogados. Ademais, revela-se inadmissível esse tratamento desigual.

Vejamos o que leciona o artigo 3º da Lei Federal 12.694/2012:

Art. 3º - Os tribunais, no âmbito de suas competências, são autorizados a tomar medidas para reforçar a segurança dos prédios da Justiça, especialmente:
I - controle de acesso, com identificação, aos seus prédios, especialmente aqueles com varas criminais, ou às áreas dos prédios com varas criminais;
II - instalação de câmeras de vigilância nos seus prédios, especialmente nas varas criminais e áreas adjacentes;
III - instalação de aparelhos detectores de metais, aos quais se devem submeter todos que queiram ter acesso aos seus prédios, especialmente às varas criminais ou às respectivas salas de audiência, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública, ressalvados os integrantes de missão policial, a escolta de presos e os agentes ou inspetores de segurança próprios.

Ou seja, a lei que trata de organizações criminosas assegura que os tribunais podem instalar detectores de metais nos fóruns e submeter a eles todos os que queiram acessar os locais, mas faz a seguinte ressalva: “ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública”. De sorte que os juízes, os promotores e os serventuários estão também sujeitos à vistoria, e não apenas os advogados e os cidadãos comuns.

Em razão desse imbróglio criado pelos fóruns e tribunais, cerca de 40 advogados paulistanos realizaram recentemente um protesto em frente ao fórum criminal na Barra Funda, zona oeste de São Paulo, protestando contra a diferenciação na vistoria. Porém, cumpre esclarecer que os advogados não são contrários à revista, mas esta deve ser para todos, inclusive para autoridades e funcionários, sejam eles juízes, promotores ou serventuários. Não é razoável que somente a sociedade e a advocacia sejam obrigadas a passar por revista ou vistoria conforme ocorre hoje pelos procedimentos de segurança nos fóruns. O correto seria todos estarem obrigados ao cumprimento da lei, independentemente do cargo ou função. Mais que isso, a norma constitucional preponderante leciona no sentido de que todos são iguais perante a lei.

A rigor, resta tranquilo o entendimento de que a segurança é importante, mas que seja cumprida por todos, mesmo porque os advogados estão em pé de igualdade com os juízes e com os promotores. Daí a necessidade de uma melhor atuação das diretorias dos fóruns para que esse clima de animosidade não aumente, ainda mais considerando que os advogados são parte da administração da Justiça.

Em Minas Gerais, há algum tempo, o TJMG e a OAB-MG idealizaram o cartão exclusivo para acesso e trânsito nas unidades do Judiciário. A iniciativa partiu da OAB Minas e se deu após estudos para compatibilização da segurança dos usuários dos prédios da Justiça com o devido respeito às prerrogativas dos advogados. O cartão, confeccionado pela seccional mineira, sem ônus para os adimplentes, além de dispensar o cadastramento prévio do advogado na entrada dos fóruns, evita certo incômodo e perda de tempo.

Contudo, ainda assim, aconteceram situações severas de descontentamento, notadamente quando advogados tiveram a entrada cerceada, bolsas revistadas e exigência de que tudo fosse colocado na bandeja em cima da mesa, antes que tentassem passar pelo detector de metais. Vários foram os casos de discussões acirradas de advogados com os seguranças, que continuam acontecendo até hoje, posto que ainda persista a falta de razoabilidade na estipulação de norma igual para todos. A determinação de revista obrigatória somente para os advogados e para o público em geral é discriminatória e desarrazoada. Portanto, questionar e protestar contra o tratamento desigual é um direito do causídico.

No Espírito Santo também existem embates contra a revista e a vistoria dos advogados. O CNJ proferiu há algum tempo, decisão determinando que os advogados têm que se submeter às mesmas normas de segurança dos tribunais aplicadas às demais pessoas, como detector de metais, raios X e revista de bolsas. A decisão é datada de 15/02/2011, quando o CNJ negou provimento ao pedido de providência 0004470-55.2010, impetrado pela OAB-ES contra decisão do TRF da 2ª região. A seção da OAB alegou que o TRF submetia os advogados capixabas a constrangimento, como revista de bolsas, na entrada do tribunal. E argumentava que a identificação profissional deveria dispensar a passagem por equipamentos de segurança.

“A revista de pasta e bolsa não impõe qualquer óbice ao exercício da advocacia”, ressaltou o relator do processo. Ele lembrou que todos os tribunais do país têm adotado medidas de segurança para garantir a integridade física dos magistrados, servidores e dos próprios advogados. Segundo o relator, as medidas foram adotadas depois da ocorrência de vários casos de violência contra magistrados.

Na avaliação da seccional, a Justiça Federal no Espirito Santo está discriminando os advogados. Eles fizeram visita ao tribunal e constataram que só os advogados são revistados. Servidores, magistrados e promotores e até mesmo alguns visitantes não são submetidos à revista. “É uma questão discriminatória”, reclamam os advogados capixabas.

Embora o CNJ estabeleça que todos devem se submeter ao detector de metais, não é isso, de fato, que vem ocorrendo, haja vista que juízes, promotores e serventuários não obedecem as regras, em que pese os magistrados devessem dar o exemplo, submetendo-se às normas de segurança.   

Em várias seccionais da OAB as Comissões de Prerrogativas vêm enfrentando a mesma batalha, com pedidos e mais pedidos de providências contra o tratamento desigual. As manifestações variam de lugar para lugar, mas o contexto quase sempre é o mesmo: os advogados ficam sujeitos à revista, à vistoria e à inspeção dos seguranças e do detector de metais enquanto juízes, promotores e funcionários públicos não se prestam a essas obrigações, configurando o tratamento diferenciado.

A pergunta que não quer calar: por que o advogado fica refém dessa discriminação?

Aliás, vale lembrar as notícias que reportam ao caso do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que afirmou em setembro passado que entrou uma vez no STF armado com uma pistola com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes, por causa de insinuações que ele teria feito sobre sua filha em 2017. Também vale lembrar que, em outubro passado, o procurador da Fazenda Nacional Matheus Carneiro Assunção foi preso em flagrante pela Polícia Federal sob suspeita de tentar matar uma juíza com uma faca na sede do Tribunal Regional Federal da 3ª Região em São Paulo.

Diante desses fatos, a constatação é de que nenhum dos episódios citados envolveu um advogado. Portanto, sem esgotar o assunto, a verdade real é que os advogados não são contra o detector de metais nem contra a inspeção, a vistoria ou a revista na entrada dos fóruns. Ao contrário, os advogados brasileiros prezam a segurança e entendem que, todos, indistintamente, devem passar pelo mesmo crivo, sejam juízes, promotores ou serventuários, e não apenas os advogados e o público em geral.

Para arrematar, cumpre observar que a Constituição da República dispõe no seu artigo 133 a garantia de uma inovação de relevante significado, colocando o advogado como partícipe essencial à administração da Justiça. No entanto, essa participação ainda não está bem definida para a convivência equilibrada nos fóruns e nos tribunais e está a merecer análise mais percuciente. Aos operadores jurídicos cabe complementar a norma constitucional por meio de ações, estudos e sugestões. A questão da defesa das prerrogativas dos advogados é uma tarefa árdua, assim como o combate ao tratamento diferenciado nas vistorias nas entradas dos fóruns, mas são lutas justas e defesas necessárias e indispensáveis para o livre exercício da advocacia. O dever é de todos. Ao trabalho!

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG).



Comentários

  1. Os juizes e os promotores não são melhores do que os advogados. Essa forma de vistoria só para advogados e pessoas que vão aos prédios é uma forma discriminatória sim. Os advogados têm toda a razão em protestar contra isso. Meus parabéns Dr. Wilson Campos por este exemplar documentário que mostra como esse Judiciário trata de maneira desigual os iguais. E além de lento, caro, sem prestígio junto à sociedade o Poder Judiciário comete mais essa falha. Vergonha!
    Valdo Assunção.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas