PACIENTE RECEBE INDENIZAÇÃO POR ATRASO EM EXAME DE URGÊNCIA.
O TJMG noticia o caso
de um paciente da Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora que receberá da
instituição o reembolso do valor pago por um exame (danos materiais) e R$5
mil por danos morais. O homem precisava realizar um exame com urgência,
mas o plano de saúde da Santa Casa demorou 10 dias para agendá-lo e por
isso o procedimento em outro local teve de ser pago.
Segundo o processo, o
paciente chegou ao hospital sentindo fortes dores, incômodos e evacuando
sangue, e precisou fazer um exame de colonoscopia imediatamente, o que foi
negado pela operadora do plano de saúde.
Em função da demora
do atendimento e da urgência para obter um diagnóstico, o homem procurou uma
clínica particular e teve de pagar R$ 1 mil pelo exame.
Em sua defesa, a
Santa Casa alegou que não foi informada acerca da urgência para a realização do
procedimento e que não houve recusa por parte do plano de saúde.
Em primeira
instância, o pedido de indenização por danos materiais, relativos ao valor do
exame, foi aceito, mas os danos morais foram negados. O paciente recorreu
ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), pedindo para ser
indenizado pelos transtornos suportados.
Para o relator,
desembargador Estevão Lucchesi, estava evidente na guia de solicitação que o
procedimento deveria ser realizado imediatamente, e, por se tratar de uma
urgência, o plano de saúde tinha o dever de prestar pronto atendimento.
“Resta
configurada a falha na prestação de serviços da operadora de plano de saúde
pela demora na autorização e marcação do exame”,
afirmou.
Diante disso, foi
mantida a sentença no que diz respeito à devolução integral dos valores pagos
pelo paciente.
Com relação à
compensação pelos danos morais, o magistrado reformou a sentença. Em seu
voto, citou o jurista Sérgio Cavalieri, que define o dano moral como "a lesão a bem integrante da
personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade
psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima".
Para o relator, é
evidente a necessidade de reparar o paciente pelo abalo moral, pois o
comportamento do plano de saúde foi censurável, ao não dar
maior atenção e preferência ao caso de seu cliente.
Os desembargadores
Marco Aurélio Ferenzini e Valdez Leite Machado acompanharam o relator.
Permissa
venia do relator, vale destacar alguns trechos do
respeitável Acórdão. Vejamos:
Vistos etc., acorda, em Turma, a 14ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR
PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E NEGAR PROVIMENTO AO SEGUNDO. DES. ESTEVÃO
LUCCHESI - RELATOR.
V O T O.
Cuida-se de ação
ordinária ajuizada por CELIO GILSON VELHO DA SILVA JUNIOR contra a SANTA CASA
DE MISERICÓRDIA DE JUIZ DE FORA. Em sua inicial o autor disse ser usuário do
plano de saúde gerido pela ré. Aduz que, em maio de 2015, sentiu-se mal, com
dores, incômodos, evacuando sangue, razão pela qual o médico que lhe atendeu
determinou a realização do exame colonoscopia, com urgência, conforme consta na
guia de solicitação do exame. Aduz que encaminhou o pedido no dia 18/05/2015,
todavia, o exame foi marcado apenas para o dia 28/05/2015, mesmo diante da
gravidade do quadro clínico do autor. Alega que em razão da demora na marcação
do exame pelo plano de saúde, o autor custeou o exame, que foi realizado no dia
22/05/2015, pagando o valor total de R$1.000,00 (mil reais) tendo a ré negado a
cobertura da realização de ressonância magnética da coluna cervical. Afirma que
a conduta da requerida em marcar um exame urgente para uma data distante
caracteriza um desrespeito às normas ANS, bem como causou ao autor transtornos
de ordem financeira e moral. Pretendeu o acolhimento da pretensão inicial de
condenação da operadora de plano de saúde ao ressarcimento do valor pago pelo
autor e pagamento de indenização por danos morais.
Após regular
tramitação do feito, sobreveio a sentença que julgou parcialmente procedentes
os pedidos iniciais, condenando a ré ao pagamento de indenização por danos
materiais, no valor de R$1.000,00 (mil reais), com correção a partir do
desembolso e juros de mora de 1% ao mês a partir da citação. De outro norte, o
pedido de indenização por danos morais foi julgado improcedente.
Inconformado, o autor
interpôs recurso de apelação, alegando fazer jus à indenização pelos danos
morais sofridos. Pugnou pela condenação da ré no pagamento de indenização por
danos morais e a redistribuição dos ônus da sucumbência. Espera o provimento do
recurso.
A requerida, por sua
vez, em suas razões recursais, requereu a concessão dos benefícios da justiça
gratuita. No mérito, aduz a inexistência de direito ao reembolso, uma vez que
não foi informado acerca da urgência para a realização do procedimento. Alega
que não houve recusa por parte do plano de saúde, que cumpriu as normas legais.
Requereu a improcedência dos pedidos iniciais.
Em contrarrazões, os
apelados pugnaram pelo desprovimento do recurso da parte contrária.
O pedido de justiça
gratuita da ré/segunda apelante foi indeferido, vindo a recorrente a recolher o
preparo (Documento de ordem nº 28/30). É o relatório. Presentes os pressupostos
de admissibilidade, conheço dos recursos.
Fixa-se,
inicialmente, que a relação jurídica entabulada entre as partes, porquanto
atinente a plano de saúde, caracteriza-se como consumerista, estando submetida
às disposições do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido dispõe a súmula
469 do STJ:
Aplica-se o Código de
Defesa do Consumidor aos contratos de plano de Saúde.
Neste contexto,
deve-se ainda colocar em evidência que o contrato em questão é notoriamente
classificado como de adesão, pois está claro que as cláusulas restritivas de
cobertura foram estabelecidas unilateralmente pela demandada.
Nos tempos modernos
de contratação em massa, infelizes dos contraentes se não tivessem o judiciário
como norte para coibir abusos e desmandos praticados pela parte mais forte em
detrimento da vulnerabilidade do consumidor.
Atualmente, o que se
vê é uma esmagadora oferta de oportunidades para negócios, resultando na
fabricação dos contratos de adesão, que por sua vez atuam como força a
desequilibrar relações dessa natureza. Neste sentido, confira-se o brilhante
voto proferido pela então Juíza Maria Elza: “No
mundo atual, em que a regra é a contratação em massa, via contratos de adesão
ou condições gerais dos contratos, é de todo sabido que tanto a liberdade de
escolha para contratar ou não contratar, como a possibilidade de negociar
livremente as cláusulas contratuais, como a liberdade de escolher o outro
contratante, tornaram-se supridas ou bastante limitados. Fica difícil, pois,
querer se utilizar do paradigma contratual clássico, que se baseava na
aceitação unânime e absoluta dos princípios da autonomia da vontade, da
igualdade contratual, da pacta sunt servanda e da liberdade contratual, para
solucionar os problemas contratuais modernos, pois, sabe-se que, quase sempre,
a aplicação daqueles paradigmas fazem com que as decisões judiciais se tornem
injustas e iníquas para a parte mais fraca, no caso o consumidor”.
Pois bem. No caso dos
autos, o autor procurou um médico credenciado da requerida para realizar uma
consulta em decorrência de um mal estar grave, no dia 18/05/2015, tendo o
profissional determinado a realização de um exame de colonoscopia, com urgência
(Documento de Ordem nº 04, p. 06). Todavia, o exame foi marcado apenas para o
dia 28/05/2015 (Documento de Ordem nº 04, p. 08), razão pela qual o autor pagou
para realizar a colonoscopia no dia 22/05/2015 (Documento de Ordem nº 04, p. 09)
em uma clínica particular.
A requerida, por sua
vez, alega que não foi informada acerca da urgência para a realização do exame,
razão pela qual não seria cabível o reembolso do valor pago pelo autor.
Data
venia, ao contrário do afirmado pela ré, seus
funcionários foram, de fato, informados acerca da urgência no caso do autor. Com
efeito, na guia de solicitação de exame consta expressamente a informação de
que a realização do mesmo era urgente, senão vejamos:
Ora, a referida guia
foi entregue à Ré, uma vez que houve a marcação do exame para o dia 28/05/15,
não sendo crível que o procedimento teria sido marcado sem a apresentação da
guia de solicitação.
Outrossim, é
compreensível que o autor tenha aguardado por quatro dias a autorização da
requerida, pois não se trata de um exame simples, com preço acessivo, não sendo
possível exigir que o mesmo procurando um estabelecimento credenciado pela ré,
quando esta tinha em mãos o pedido de exame e seu estado de saúde era grave.
Logo, se houve uma
situação de emergência/urgência, conclui-se que a ré tinha o dever de prestar
pronto atendimento, autorizando o exame indicado, a fim de garantir a saúde do
beneficiário. Não tendo assim procedido, falhou na prestação dos seus serviços,
devendo ser responsabilizada pelos danos decorrentes de sua omissão/negligência.
[...]
Entretanto, no caso
vislumbro com cristalina clareza a necessidade de reparar o autor/primeiro
apelante, pois, mostrou-se censurável o comportamento da ré em não dar maior
atenção e preferência ao caso do autor, negando-lhe pronto atendimento, mesmo
quando havia indicação de urgência.
De fato, houve a
marcação do exame para apenas dez dias após a solicitação do médico, sendo que
o estado clínico do autor inspirava cuidados imediatos, conforme constava na
guia de solicitação do exame.
Como visto, o atraso
foi excessivo e substancial, sendo inconteste, a nosso aviso, o dano a acervo
personalíssimo em hipóteses com essa.
Portanto, a sentença
deve ser reformada neste ponto.
Sob outro enfoque,
sabe-se que a fixação do valor da indenização por danos morais é questão
tormentosa e constitui tarefa extremamente difícil imposta ao magistrado. Sobre
o dano moral, Sérgio Cavalieri leciona com maestria: “Em suma, a composição do dano moral realizar-se através desse conceito
- compensação - que, além de diverso do de ressarcimento, baseia-se naquilo que
Ripert chamava ' substituição do prazer que desaparece, por um novo'. Por outro
lado, não se pode ignorar a necessidade de se impor uma pena ao causador do
dano moral, para não passar impune a infração e, assim, estimular novas
agressões”. (CAVALIEIRI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil.
2ª edição. Malheiros, página 76).
Nesse diapasão, doutrina
e jurisprudência convergem no sentido de que para a fixação do valor da
compensação pelos danos morais deve-se considerar a extensão do dano
experimentado pela vítima, a repercussão no meio social, a situação econômica
da vítima e do agente causador do dano, para que se chegue a uma justa
composição, evitando-se, sempre, que o ressarcimento se transforme numa fonte
de enriquecimento injustificado ou seja inexpressivo a ponto de não retribuir o
mal causado pela ofensa.
Nesse sentido é a
lição de Sérgio Cavalieri, senão vejamos:
(...) não há valores fixos, nem tabelas preestabelecidas, para o arbitramento do dano moral. Esta tarefa cabe ao juiz no exame de cada caso concreto, atentando para os princípios aqui enunciados e, principalmente, para o seu bom senso prático e a justa medida das coisas. (ob. cit., p. 183).
(...) não há valores fixos, nem tabelas preestabelecidas, para o arbitramento do dano moral. Esta tarefa cabe ao juiz no exame de cada caso concreto, atentando para os princípios aqui enunciados e, principalmente, para o seu bom senso prático e a justa medida das coisas. (ob. cit., p. 183).
Assim, considerando
os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, o grau de culpa da parte Ré
e as circunstâncias que envolveram os fatos, entendo ser razoável e condizente
com as peculiaridades do caso vertente a fixação da indenização em R$5.000,00
(cinco mil reais), valor que, além de compensar a dor moral experimentada, não
constitui fator de enriquecimento ilícito do ofendido, pois, como dito, não é
esse o objetivo do instituto.
Diante do exposto,
DOU PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO, para julgar procedente o pedido de
indenização por danos morais, e condenar a ré a indenizar os danos imateriais
experimentados, no importe de R$5.000,00 (cinco mil reais), com correção
monetária, a partir da publicação do acórdão, e juros de mora de 1% ao mês,
desde a citação.
Por consequência,
redistribuo os ônus sucumbenciais, impondo à parte ré o pagamento integral das
custas processuais, recursais e honorários advocatícios, os quais arbitro em
20% (vinte por cento) do valor da condenação, já observado o disposto no art.
85, §11º, do NCPC/2015.
De outro norte, NEGO
PROVIMENTO AO SEGUNDO RECURSO. Custas recursais pela segunda apelante. DES.
MARCO AURELIO FERENZINI - De acordo com o(a) Relator(a). DES. VALDEZ LEITE
MACHADO - De acordo com o(a) Relator(a). SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO
PRIMEIRO RECURSO E NEGARAM PROVIMENTO AO SEGUNDO". (Apelação Cível 1.0145.15.032799-0/001).
Cumpre evidenciar que
apenas partes do Acórdão foram transcritas acima, uma vez que o inteiro teor do
Acórdão pode ser acessado junto ao sistema do TJMG. De sorte que o paciente teve o reembolso do valor que gastou para realizar o exame em clínica particular (R$1.000,00), mais a indenização por dano moral no valor de R$5.000,00, e ainda obteve a sucumbência de 20% da condenação.
Wilson Campos
(Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses
Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).
Passei por um caso parecido,mas não entrei na justiça e deveria ter feito isso. Depois de ler o caso contado pelo advogado eu entendi que o que o hospital fez comigo foi cruel, porque fiquei mais de 15 dias esperando por um exame que era urgente e eu sentia dores fortes no estômago. Vivendo e aprendendo como diz o ditado popular. Eu agradeço ao Dr. Wilson Campos advogado por essa explicação do que aconteceu e serviu de aprendizado para mim. Obrigada. Maria das Graças D. Fiuza
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