SAQUE DO FGTS EM RAZÃO DA PANDEMIA.

Os trabalhadores, as famílias e a sociedade têm enfrentado tempos muito difíceis. O coronavírus virou o Brasil e o mundo de ponta-cabeça. Em razão disso e da falta de perspectivas de extermínio breve e definitivo da doença, algumas medidas judiciais têm sido tomadas para aliviar a pressão sobre o cidadão. A liberação de saque do FGTS é uma delas. 

Vejamos:     

A juíza Federal Fernanda Carone Sborgia, do Juizado Especial Federal da 3ª região, autorizou trabalhador a sacar seu FGTS em razão da pandemia do coronavírus.

O autor da ação visava obter autorização judicial para o levantamento de saldo existente em conta vinculada ao FGTS. Afirmou que, em razão do estado de calamidade pública decorrente da pandemia, faz jus à liberação de seus depósitos fundiários.

Na sentença, a magistrada explicou que o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço tem como finalidade a constituição de um patrimônio mínimo para o trabalhador, formado por contribuições recolhidas pelo empregador e outros recursos eventualmente agregados. Pela sua natureza, o trabalhador somente poderá movimentar a sua conta nas hipóteses previstas no artigo 20 da Lei nº 8.036/90.

“Ocorre que, a despeito de a situação pretendida pela parte autora - calamidade pública em razão de pandemia - não ter sido contemplada nas hipóteses acima, é entendimento assente no STJ de que o rol do artigo 20 não é taxativo, sendo possível o levantamento dos saldos em outras situações”.

A juíza afirmou que além da dor em razão da perda de entes queridos, muitos brasileiros perderam o emprego, tiveram as suas empresas ou estabelecimentos fechados ou então abrupta redução de renda, com graves repercussões sociais.

“Ainda que não previsto taxativamente, a presente situação de calamidade pública autoriza e justifica, a nosso ver, e em plena sintonia com a jurisprudência acima colacionada, a possibilidade de saque de valores depositados a título do FGTS para o fim de não somente recompor o patrimônio perdido ou reduzido, como também possibilitar a própria subsistência do trabalhador brasileiro em tempos tão difíceis”.

Sendo assim, julgou o pedido procedente e determinou expedição de ofício à Caixa Econômica Federal para imediato levantamento dos valores depositados na conta de FGTS do autor. (Processo nº 0006611-55.2020.4.03.6302).

A SENTENÇA:

Trata-se de pedido formulado por ________________visando obter autorização judicial para o levantamento de saldo existente em conta vinculada ao FGTS. Afirma que, em razão do estado de calamidade pública decorrente da pandemia da COVID-19, faz jus à liberação de seus depósitos fundiários. Em sua manifestação, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL pugnou pela improcedência do pedido, vez que o autor não preenche as hipóteses para saque.

É o breve relatório. DECIDO.

O pedido do autor é procedente, pelas razões que passo a expor.

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço tem por fim a constituição de um patrimônio mínimo para o trabalhador, formado por contribuições recolhidas pelo empregador e outros recursos eventualmente agregados. Pela sua natureza, o trabalhador somente poderá movimentar a sua conta nas hipóteses previstas no artigo 20 da Lei n. 8.036, de 11.05.90.

Ocorre que, a despeito de a situação pretendida pela parte autora - calamidade pública em razão de pandemia - não ter sido contemplada nas hipóteses acima, é entendimento assente no STJ de que o rol do artigo 20 não é taxativo, sendo possível o levantamento dos saldos em outras situações.

Colhem-se julgados:

 ADMINISTRATIVO. FGTS. ART. 20 DA LEI N. 8.036/90. HIPÓTESES DE LEVANTAMENTO DOS VALORES DEPOSITADOS NA CONTA VINCULADA AO FUNDO. ROL EXEMPLIFICATIVO. POSSIBILIDADE DE SAQUE, EM CASO DE REFORMA DE IMÓVEL, AINDA QUE NÃO FINANCIADO NO ÂMBITO DO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. PRECEDENTES. INTERPRETAÇÃO QUE ATENDE AOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.

(...)

2. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça já assentou que o art. 20 da Lei n. 8.036/90 apresenta rol exemplificativo, por entender que não se poderia exigir do legislador a previsão de todas as situações fáticas ensejadoras de proteção ao trabalhador, mediante a autorização para levantar o saldo de FGTS. Precedentes. (...)” (Grifei) - (STJ, SEGUNDA TURMA, REsp 1251566/SC, REL. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 14/06/2011) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. FGTS. UTILIZAÇÃO DO SALDO PARA SITUAÇÃO NÃO PREVISTA NO ART. 20 DA LEI Nº 20.039/90. POSSIBILIDADE .

1. Não há violação do art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem resolve a controvérsia de maneira sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese do recorrente.

2. É possível o saque do FGTS mesmo nos casos não previstos no art. 20 da Lei 8.036/90, tendo em vista que o rol de hipóteses ali apresentadas não é taxativo, devendo prevalecer o fim social da norma.

3. Agravo regimental não provido. (Grifei) (STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no AREsp 10486/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, DJe 30/08/2011).

ACÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE PASSIVA. UNIÃO. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. DEFESA DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. POSSIBILIDADE. FGTS. CEF. SAQUE. CALAMIDADE PÚBLICA. FINALIDADE SOCIAL. ROL NÃO TAXATIVO. (...). 4. As hipóteses de saque previstas na Lei nº 8.036/90 não são exaustivas, mas meramente exemplificativas, devendo ser dada prevalência ao caráter social da norma quando em jogo o direito individual à vida, à saúde e à dignidade humana. Precedentes TRF 4ª Região. 5. Embora a situação dos autos não esteja elencada no inciso XVI do art. 20 da Lei nº 8.036/90, porquanto a situação de calamidade decretada pelo Município de Alvorada não foi reconhecida pelo Governo Federal, entendo que decorrem implicações de ordem constitucional que não podem ser afastadas, face ao comprometimento do Estado perante à sociedade, ao ser humano, quando se trata de direito assegurado pela lei ao trabalhador. 6. Apelações improvidas.

(TRF4, AC 5064563-86.2012.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 25/09/2014). (g.n.). O estado de calamidade pública, reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, em razão da pandemia da Covid-19, é uma realidade no país, já tendo gerado mais de 100 mil mortos, com sérios impactos pessoais, familiares e econômicos nas vidas de centenas de milhares de brasileiros. Ou seja, além da dor em razão da perda de entes queridos, muitos brasileiros perderam o emprego, tiveram as suas empresas ou estabelecimentos fechados ou então abrupta redução de renda, com graves repercussões sociais.

Ainda que não previsto taxativamente, a presente situação de calamidade pública autoriza e justifica, a nosso ver, e em plena sintonia com a jurisprudência acima colacionada, a possibilidade de saque de valores depositados a título do FGTS para o fim de não somente recompor o patrimônio perdido ou reduzido, como também possibilitara própria subsistência do trabalhador brasileiro em tempos tão difíceis. 

Por oportuno, invoca-se não somente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1, inc. III), princípio fundante da República brasileira, para o qual convergem todos os demais princípios e normas da CF/88, como também os próprios ditames do art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, a dispor que “(...) na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”

Em razão disso tudo, diante do estado de calamidade pública em razão da pandemia pela COVID-19, e atentando-se ao princípio da dignidade humana, bem como à finalidade social da norma, entendo que o requerente faz jus ao levantamento pleiteado.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO e decreto a extinção do feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, com a antecipação da tutela, determinando a expedição de ofício à Caixa Econômica Federal para imediato levantamento dos valores depositados na conta de FGTS do autor (CPF _______________). 

DEFIRO os benefícios da assistência judiciária gratuita. Sem custas e sem honorários (art. 55 da Lei n. 9.099/95). P.I. Sentença registrada eletronicamente. Fernanda Carone Sborgia - Juiz(a) Federal.  

Assim, diante dos fatos do caso acima exposto, a magistrada federal entendeu que o saque do FGTS possibilita a subsistência do trabalhador em tempos tão difíceis.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas tributária, trabalhista, cível e ambiental/Presidente da Comissão de defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).

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Comentários

  1. José Carlos M.Silva5 de março de 2021 às 16:14

    Já que é assim eu vou tentar o meu FGTS porque devo ter uns 8.000,00 e isso ajuda bastante. Vou verificar com um advogado e tomara que dê tudo certo porque estou precisando aliviar as contas Dr. Wilson. Posso ligar para o senhor para esclarecer umas dúvidas? O senhor trabalha com essa área? Posso ligar para o senhor na semana que vem? Abraço e obrigado mesmo. José CarlosM.S.

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  2. Clara Maria P.Souza Leal5 de março de 2021 às 16:19

    Eu já sou MEI e não tenho direito a FGTS e para piorar tenho que ficar com minha lojinha fechada ou meio fechada porque os decretos não me deixam trabalhar. É fiscal de prefeitura, é guarda municipal, é gente que denuncia, e o coitado do MEI que se vire com suas contas de aluguel, funcionário, imposto, etc, etc. Ah e tem o banco que não perdoa o saldo devedor e cobra juros de matar. E já tem um ano que isso acontece.Meu Deus do céu até quando? Obrigada Dr. Wilson pela informação e eu vou informar para meus colaboradores, parentes, amigos, e para meus vizinhos de comércio no bairro. Gratidão. Clara Maria.

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