SUPREMOS ENGULHOS, TRISTEZA E DECEPÇÃO.

Não há explicação palpável para o protagonismo exacerbado do Supremo Tribunal Federal (STF), em plena pandemia, com o país mergulhado no caos da saúde pública, encontrando dificuldades para a compra de vacinas eficazes e tendo de enfrentar problemas sociais, políticos e econômicos de toda natureza. Neste momento, de situação tão inusitada e difícil, não há que se permitir estardalhaço judicial do STF, que sirva, premeditadamente, para aumentar o ego e a vaidade dos seus ministros.

O STF quer ser o centro das atenções no Brasil, ao contrário do comportamento de outras Supremas Cortes mundo afora, que são arredias à imprensa e falam unicamente nos autos. É raro o dia que o STF não está na mídia. Anteontem, o ministro Edson Fachin causou furor e estupefação na sociedade brasileira ao anular as condenações de Lula nas ações penais da Lava Jato em Curitiba. Já ontem, os ministros do STF continuaram sendo o centro das atenções no país, notadamente por seus votos pela suspeição do ex-juiz Sérgio Moro e contrários aos bons serviços prestados pela Operação Lava Jato no combate à corrupção.

Mas terminou sem definição a sessão da 2a turma do STF que analisava a suspeição de Moro na sentença contra Lula no caso do triplex. Depois de Fachin votar contra a suspeição, em 2018, o caso agora fica assim configurado: os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski dizem que Moro é suspeito; e o ministro Kassio Nunes Marques pediu vista e vai conhecer melhor dos autos.

Vale esclarecer que, em 2018, a ministra Cármen Lúcia votou por não conhecer do habeas corpus. Entretanto, isso não impede que ela reveja sua posição e, no mérito, tenha outra opinião. Aliás, a ministra ontem deixou claro que quer votar. Ou seja, se fosse para manter a opinião, nada precisaria dizer, o que faz supor que ela deva, diante de tudo que hoje se sabe, rever o seu voto. Resta aguardar.

Já os votos de Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski foram no sentido de duras críticas à Lava Jato e ao ex-juiz Sérgio Moro. Vejamos as considerações: Gilmar Mendes disse: “Esta é a maior crise que já se abateu sobre a Justiça Federal”. Ricardo Lewandowski afirmou: “Não existem maiores dúvidas sobre a fidedignidade do teor das mensagens”.

Gilmar Mendes entendeu que o ex-juiz Sergio Moro perdeu a parcialidade nas decisões da Lava Jato. Durante seu voto, o ministro criticou a Operação Lava Jato em conjunto com a atuação de Moro. Aduziu sobre a suspeição de Moro, dizendo ter-se uma “biografia de um juiz acusador”, e salientou que a história recente do Judiciário ficará marcada por um projeto populista de poder político com a instrumentalização do processo penal.

Achando-se o dono da verdade e colocando-se como se estivesse em um palanque político, Gilmar Mendes falou com a mesma ênfase intolerante contra a 13ª Vara Federal de Curitiba e criticou a Vara Federal do Rio de Janeiro que está aos cuidados do juiz Marcelo Bretas: “cabia tudo na Vara de Curitiba, como também nesta Vara do RJ, porque também ela se tornou algo espiritual, qualquer coisa tem a ver com a 7ª Vara do RJ”.

Ricardo Lewandowski considerou que as mensagens vazadas que demonstram a relação entre Moro e Lava Jato são verdadeiras ao afirmar “não existirem maiores dúvidas sobre a fidedignidade do teor das mensagens divulgadas pela mídia, embora ilicitamente captadas”. Segundo o ministro, Lula não foi submetido a um julgamento justo, “mas a um verdadeiro simulacro de ação penal, cuja nulidade salta aos olhos”.

Também se comportando como se estivesse discursando para uma plateia de militantes, Lewandowski afirmou que os fatos supervenientes - quais sejam, os diálogos vazados - demonstram de forma clara “a incursão heterodoxa do então magistrado na seara político-partidária em detrimento dos cânones que regem a função jurisdicional”. E o ministro afirmou ainda que “claramente” o juiz Sergio Moro incorreu em dispositivos do CP e do CPP e disse mais: “há uma flagrante violação do promotor natural, ou seja, os membros do MP devem se pautar pela absoluta imparcialidade em interesse ao desfecho do caso”.

Independentemente do direito de voto dos dois ministros, a crítica da sociedade não é em relação ao ato em si dos magistrados, mas em relação à forma como fazem suas manifestações públicas, fora dos autos, como se estivessem acima dos demais mortais e, pior, fazem caras e bocas para formar boa imagem na telinha da televisão.

Causam engulhos, tristeza e decepção assistir a tudo isso em uma época de muita intranquilidade social, uma vez que o povo brasileiro enfrenta uma doença invisível que não acaba, um isolamento que causa estresse e depressão e um quadro negativo no cenário nacional, de desemprego e preços altos. Mas, inacreditavelmente, mesmo diante de tanta incerteza e sofrimento, os ministros do STF resolvem abalar e perturbar ainda mais o estado de espírito dos cidadãos comuns com suas decisões tardias e intempestivas, se vistas sob a ótica intransigente do devido processo legal.

Ora, senhores e senhoras, é público e notório que o Código de Processo Penal determina a competência a partir do local do fato. Se é assim o texto da lei, por que o TRF4, o STJ e o STF permitiram que os processos se arrastassem por tantos anos sob a tutela de Curitiba? Por que? Se a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar processos relacionados ao tríplex do Guarujá, do sítio de Atibaia e do Instituto Lula, à míngua de sua relação direta com os crimes cometidos no âmbito da Petrobras, por que não se decretou a incompetência àquela época?

Só falta os doutos juízos determinarem a migração dos processos para Brasília e depois descobrirem daqui a 3 anos que a competência não é de Brasília, mas de São Paulo. Pode isso? Não duvidem, porque quando o STF quer, seus ministros interpretam as leis ao seu modo e fazem parecer que é o certo. Lembram-se do caso recente da prisão do deputado federal, com mandado de prisão em flagrante permanente ou eterno, em razão da postagem de vídeo na internet? Pois é!

Isso, quando eles não demoram, postergam e deixam ad aeternum uma demanda sem deliberação ou sentença e depois passam o facão cortando até a raiz, para parecer que o problema era de difícil solução. Quando querem e sendo de seu interesse, os ministros são rápidos e decidem com assertividade, mas quando não querem, coitado do jurisdicionado, que, em muitos casos, morre sem que aconteça o julgamento da sua ação.

Voltando à competência ou incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, vejamos o dispositivo do Código de Processo Penal (CPP): “Art. 95 - Poderão ser opostas as exceções de: I – suspeição; II – incompetência de juízo; III – litispendência; IV – ilegitimidade de parte; V – coisa julgada”. Note-se que as exceções de suspeição e de incompetência são dilatórias. Não colocam fim ao processo. São processadas em autos apartados e, como regra geral, o processo principal não é suspenso (artigo 111, do CPP). Resolvido o incidente, se julgado improcedente, é arquivado. Se procedente, os autos do processo-crime são enviados ao juiz substituto (no caso de suspeição), ou competente (na hipótese de incompetência), onde retomará seu trâmite normal.

De sorte que Lula está livre de algumas acusações, por enquanto, mas os crimes cometidos por ele continuarão a ser apurados, um a um, posto que assim manda a lei e assim devem proceder os juízos competentes, sejam de Curitiba ou de Brasília. Ademais, o direito ao contraditório e à ampla defesa está aí para ser usado pelo paciente, sem, contudo, isso significar direito à impunidade.

Data venia, diante dos fatos e da pequena erudição dos membros do STF, o sentimento da população brasileira é de: supremos engulhos, tristeza e decepção.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas tributária, trabalhista, cível e ambiental/Presidente da Comissão de defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).

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Comentários

  1. Dr. Wilson o nosso querido Brasil não tem uma Suprema Corte para confiar, como é que pode uma coisa dessa? Todo país decente tem e o nosso país passa esse vexame sempre com ministros dando páginas e páginas de motivos de notícias vergonhosas. Que papelão STF. Que papelão.
    Abraço Dr. Wilson e parabéns pelo seu blog e artigos com esmero e qualidade.

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  2. Eu quero ver Dr. Wilson o dinheiro que foi gasto com essas ações e que agora são anuladas, quem vai pagar e quem vai devolver, os ministros do STF? Anularam o trabalho de vários anos e o dinheiro gasto fica assim? Deve ser cobrado do STF agora esse valor todo sem perdão da dívida. Sem perdão do desperdício do dinheiro público que sai dos impostos do povo - pobre, desempregado, mal remunerado, sobretaxado, sobrecarregado, agoniado com o coronavírus e sem poder voltar as atividades por causa do lockdown. E os excelentíssimos ministros do STF botando terror no país e ferrando coma vida do brasileiro. Que vergonha nacional e internacional. Deveriam pedir para sair e nunca mais voltar. Façam isso. Já. Pelo amor de Deus. Saiam 11 e coloquem outros 11 no lugar. Depressa por que senão o Brasil não aguenta. Isso vai acabar virando uma Venezuela petista, psolista e comunista. Tem base uma coisa dessa? Dr. Wilson obrigado pelo coerente e patriota artigo. Vamos reagindo, sempre, sempre, sempre. Até mais. engenheiro Leôncio M. T. Filho.

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  3. Cândida M. S. Pereira10 de março de 2021 às 17:05

    Minha vida foi trabalho e família e continua sendo mas isso que está acontecendo desses juízes não é trabalho e não podem ter família porque a vergonha que essas famílias deve estar passando com esses pais e mães, meu Jesus. É muita coisa para envergonha uma pessoa. Depois quer que o povo acredita na justiça e que justiça. Obrigada Dr, Wilson eu entendi e aprendi muito aqui e parabéns pro senhor que fala a verdade e defende nosso povo e nosso Brasil. . Agradecida. Cãndida M.S. Pereira.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Os ministros do STF estão se defendendo. Curitiba chegou aos palácios e mansões de Brasília.

    Uma hora a bomba vai explodir e será, primeiramente, no STF.

    Aguardemos.

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  6. Diógenes P. de O. Sobrinho11 de março de 2021 às 10:16

    Demorou 5 anos para descobrir o erro da incompetência. Imagina se fosse um advogado comum, de causas pequenas, o que teria acontecido, no mínimo, inépcia e sermão pelo erro crasso jurídico. Os desembargadores do TRF4 não viram, os ministros do STJ não enxergaram e os ministros do STF desde o princípio não detectaram o erro da competência da ação. Brincadeira isso! Posso parar de advogar agora com esses tribunais ineptos e cegos e esse STF tão ruim de serviço e tão tardio nas suas manifestações. Realmente, doutor Wilson, caro colega, certíssimas suas colocações e palavras e argumentos, pois tudo isso são supremos engulhos, decepção e tristeza, para o Brasil inteiro. Que vergonha nacional para o Judiciário. Abração. Diógenes P.O. Sobrinho.

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