FICHA LIMPA.





              "Os riscos à Lei Complementar 135/2010". 
 

O propósito da Lei Complementar (LC) 135/2010, também chamada Lei da Ficha Limpa, foi alterar a Lei Complementar 64/1990, atendendo o disposto no art. 14, § 9º, da Constituição, que autoriza o legislador infraconstitucional a estabelecer novas hipóteses de inelegibilidade, visando proteger a probidade administrativa e a moralidade para exercício de mandato, considerada a vida pregressa do candidato. 

Embora a questão já tenha sido discutida e definitivamente apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, que inclinou pela constitucionalidade da norma, ainda há na ordem jurídica atual muita controvérsia acerca de sua constitucionalidade.

Existe uma corrente doutrinária que, apoiada no princípio da presunção de inocência, sustenta a inconstitucionalidade da LC 135/2010, porque considera que a inelegibilidade assume caráter sancionatório e que a ausência de previsão do trânsito em julgado da decisão constitui uma violação a direitos fundamentais.

Contudo, há outra corrente que defende a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, sob o espeque de que ela visa impedir o acesso a cargos políticos de candidatos detentores de “ficha suja”, mas ainda não condenados definitivamente. A defesa dessa corrente se dá ainda por considerar que a aplicação do princípio da presunção de inocência restringe-se à seara penal e que os valores tutelados pelos princípios da moralidade e probidade administrativa seriam mais amplos do que a garantia da presunção de inocência, uma vez que resguardam toda a coletividade e, por esse motivo, teriam maior relevância.

Consideradas as nuanças da Lei da Ficha Limpa, eis que surgem polêmicas relativas à aplicação da norma, porquanto algumas pessoas resolvam, de uma hora para outra, subestimar o rigor da regra geral. Estão surgindo reações de todos os lados em razão do desmonte gradativo dos esquemas de corrupção em altos escalões, mediante ações das investigações e da Justiça. Isso se deve ao fato de que o país tem longa história de práticas não republicanas em que ricos e poderosos são ou eram tratados com benevolência na aplicação da lei.

Entretanto, felizmente, essa cultura deletéria vem sendo derrotada por meio da atuação da sociedade civil, da imprensa e das instituições comprometidas com a lisura na gestão. Porém, restam ainda resquícios de preocupação de que, de alguma forma, o princípio da ficha limpa possa ser desmoralizado, o que não é bom para a continuidade da assepsia na política brasileira.

Vale observar que a Lei da Ficha Limpa prevê pedido aos tribunais superiores de suspensão da inelegibilidade, com liminar para que o político possa ser candidato. Essa situação requer análise do caso concreto, embora seja rara a concessão de liminar para autorizar alguém a concorrer. Uma cautelar favorável teria efeito negativo, deixando a Lei da Ficha Limpa sob forte risco de enfraquecimento, o que não é recomendável para o momento atual.  


Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de quinta-feira, 3 de maio de 2018, pág. 19). 


Comentários

  1. Qualquer exceção à regra fere de morte o princípio da lei. Ficha limpa é pessoa sem crimes ou incriminações. Ficha suja é criminoso, incriminado e praticante de fraudes. Eleger ou reeleger ficha suja, por mínimo que seja o crime, é trabalhar contra o povo e contra a futuro da nação. Gostei do artigo e parabenizo o autor Dr. Wilson Campos, mais uma vez comprometido com os interesses do cidadão brasileiro. EU SÓ VOU VOTAR EM FICHA LIMPÍSSIMA!!!! Nelson J. F. Goulart.

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