"LEGEM HABEMUS".




                           "Temos lei, mas não temos governo".   

A tardia tomada de decisão do governo, aliada ao angustiante tempo para diminuir o preço do diesel nas bombas, não deixou à sociedade organizada outra impressão que não seja a de que temos lei, mas não temos governo suficientemente capaz nem sequer para conciliar a negociação de uma pauta de reivindicações de caminhoneiros.   

Em que pese o direito assegurado à categoria titular do protesto de exigir melhores condições de trabalho, assiste, da mesma forma, à coletividade o direito de ir e vir, a garantia constitucional do Estado de direito e o cumprimento indispensável da legalidade. Com certeza, queiram ou não, “legem habemus”, ou seja, temos lei.

O Estado de direito não é compatível com ambientes extremistas, intolerantes e que admitam o uso de quaisquer meios. O Estado de direito requer a manutenção firme das instituições democráticas, não se podendo olvidar que seja, antes de tudo, um Estado constitucional que tem na dignidade da pessoa humana e na promoção e proteção dos direitos fundamentais seu esteio e seu fim por excelência. Ademais, o Estado de direito é contrário ao arbítrio e, por consequência, próprio da razoabilidade e da justa medida.

Na democracia não há espaço para tratamentos desiguais. De nada serve a tolerância da justiça sumária, típica de um Estado de exceção, apenas porque alguns setores da sociedade assim a desejam. A justiça há que ser igual para todos, imparcial e dentro da lei, no cumprimento harmonioso do postulado constitucional. Portanto, o Estado de direito só pode ser de base democrática, sendo essencial que a sociedade civil e o Estado não se confundam, mas se mantenham como valores distintos e complementares.

A sociedade organizada precisa entender que do Estado de direito nascem mecanismos constitucionais para impedir os abusos de poder ou seu exercício ilegal. Esses mecanismos são garantias de liberdade das pessoas, no sentido de que estas não devem restar submissas aos desmandos de qualquer um que assuma o poder. Mas a melhor visão do Estado de direito é aquela da autonomia e independência dos Poderes, transparente e livre de quaisquer ligações perigosas.

“Legem habemus”, ou temos lei, não significa que façam dela tábula rasa, manejável, ao talante de qualquer administrador. Significa que a lei existe, que ela é justa e é cumprida. Caso contrário, para quem serve a lei? No Estado de direito, a expectativa é a de que o povo seja, efetivamente, o habilitado, o beneficiado, o assistido. A cidadania deve ser a grande destinatária, ultrapassando as dificuldades naturais.

Se, de fato, “legem habemus”, a lição deixada pelos últimos acontecimentos é a de que o direito de uns não pode aniquilar o direito de outros. A atuação do Estado e da sociedade deve ser justa, equilibrada, imparcial e absolutamente dentro da lei, e jamais colocando em risco a ordem jurídica e a respectiva regulação da conduta humana.  

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de quarta-feira, 6 de junho de 2018, pág. 17).


 

Comentários

  1. Disse tudo. Temos leis, mas não temos governo. Tanto no Brasil, como em Minas Gerais, como em BH, temos leis, mas não temos governos, nem federal, nem estadual e nem municipal. Tudo uma porcaria, sem preocupação com a população e todos dos governos só pensando nos seus salários, nos seus benefícios e nos seus amigos e parentes. Parabéns, Doutor Wilson Campos, por este belo artigo. Eu sou mineiro, empresário, e estou também muito decepcionado com tudo. Januário J. L. de A.

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