AS MAZELAS DA DEMOCRACIA



 
Não bastam eleições livres para afirmar com segurança o estabelecimento da democracia no país. A constitucionalidade democrática requer respeito às leis, às instituições, à cidadania e ao Estado de direito. E no sentido da indispensável legalidade imperam, absolutas, as cláusulas pétreas, imutáveis e indiscutíveis, que impossibilitam mudanças ou emendas no texto da Carta Magna, restando intocáveis a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais (artigo 60, parágrafo 4º da Constituição).

Uma democracia forte não se institui da noite para o dia. Fazem-se necessários obstáculos e desafios, opiniões e ideias, fundamentos e razões, bem como observância rigorosa do cumprimento dos deveres, posto que, para cada direito, surge uma obrigação. Daí o rigor das exigências com a função pública, de obediência aos princípios de legalidade, moralidade e eficiência.

A polarização política entre Haddad e Bolsonaro dos últimos meses não desqualifica nem destrona a democracia. Embora existam uns e outros intolerantes nas ruas e nas redes sociais, isso não equivale dizer que a democracia corre riscos iminentes. Ora, a ordem social é uma questão de responsabilidade de todos, haja vista sua importância como conjunto de normas que regulam a vida dos indivíduos em suas relações de ordem jurídica, social e moral de uns para com os outros e entre eles e o governo em qualquer momento de uma sociedade politicamente organizada.  

A esquerda brasileira, capitaneada pelo PT, governou o país por 13 anos, e não houve retrocessos ou ameaças por parte da direita. A governança operada pela esquerda se desenvolveu sem percalços até para erros imperdoáveis de improbidade, corrupção, lavagem de dinheiro, obstrução da Justiça e outros crimes graves sujeitos ao rigor da lei. Daí não se cogitar crível a versão de que a direita quer tomar o poder na marra, quando na realidade a esquerda deixou escapar as rédeas do governo e abriu mão da lisura necessária na administração pública do país.

Não resta dúvida que a corrupção, o nepotismo, a politicagem e a falta de ética têm desonrado a democracia brasileira. Mas isso não é culpa do cidadão comum, do eleitor ou do contribuinte brasileiro, mas de seus representantes eleitos, que não cumprem suas funções constitucionalmente estabelecidas. Enquanto o Brasil tiver os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário zelando apenas por seus próprios interesses e não pelos interesses da população, as mazelas da democracia permanecerão, independentemente dos fisiologismos e radicalismos partidários, que apenas prestam desserviço e causam vergonha à sociedade.

Partidos políticos frágeis, ídolos de barro, parlamentares subservientes, lideranças corruptas e eleitores de cabresto são as mazelas da democracia que precisam ser afastadas da vida pública brasileira.  

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG). 

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de 25 de outubro de 2018, pág. 25).

  




Comentários

  1. Maria das Dores Caman Cerqueira26 de outubro de 2018 às 16:04

    Concordo com tudo, de cima abaixo. Brilhante!!! Parabéns doutor.

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