TEMPOS SOMBRIOS: EDITAL DO TJBA VETA HÉTEROS.

 

Por mais inacreditável que pareça, a notícia divulgada pela imprensa é real e verdadeira.   

O Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) abriu um processo seletivo para estágio remunerado que exclui héteros.

Confesso ter ficado estarrecido com o fato, com a notícia, com a bomba. Mas creiam, pois, de acordo com o edital, publicado em 17 de janeiro, a seleção está restrita a candidatos que se autodeclararem LGBTQIA+, no momento da inscrição. “Não haverá contratação, em nenhuma hipótese, de pessoas cisgêneras heterossexuais”, ressalta o documento.

A situação criada pelo TJBA rompe de vez os laços da racionalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, fazendo valer a vontade pessoal de alguém que não pensa nas consequências e nos absurdos. O TJBA demonstra total desconhecimento dos direitos individuais e das garantias fundamentais do cidadão previstos na Constituição da República (artigos 5º e 6º).

Notem que o processo seletivo para estágio que exclui héteros estabelece ainda escala de prioridades para as vagas, com base no tipo de gênero, orientação sexual, cor e “reconhecimento do maior grau de discriminação social negativa” da população LGBTQIA+. Ou seja, primeiro, serão privilegiadas pessoas trans e não binárias, de preferência pretas. Depois, gays e lésbicas declarados.

O veto integral a heterossexuais e as diferentes cotas instituídas para candidatos LGBTQIA+ foram atribuídos segundo as disposições previstas na seleção, “ao conjunto de medidas afirmativas voltadas à promoção da diversidade de gênero e orientação sexual no âmbito do Poder Judiciário da Bahia”.

O referido edital foi aberto pelo Juiz de Direito Auxiliar da 12ª Vara de Relações de Consumo, Mário Soares Caymmi Gomes. O estágio remunerado terá a duração de 12 (doze) meses, prorrogáveis, uma única vez, por igual período.

PORÉM, depois da repercussão negativa e de muitas críticas, a Corregedoria do TJBA suspendeu o tal processo seletivo de estágio. Ora, de fato, a revolta é justificável, posto que o edital é excludente, discriminatório e racista.

A decisão de suspender o edital foi tomada no dia 28 de janeiro, ou seja, onze dias depois de publicado. Na decisão, o desembargador José Edivaldo Rocha Rotondano, corregedor-geral do TJBA, disse que as iniciativas para tornar o Poder Judiciário mais inclusivo são absolutamente louváveis”, mas o edital publicado “aparenta ter incorrido em equívocos, tanto na forma em que foi redigido quanto na adoção de regras excludentes em desproporcionalidade”.

O corregedor ainda comentou a exigência de um mês de trabalho voluntário não remunerado: “Já soa contraditório exigir de um candidato que preste estágio voluntário não remunerado”.

O desembargador considera que a proibição para candidatos heterossexuais é “geral e abstrata”; “em uma análise superficial, não parece razoável a vedação imposta”.

Ele ainda comentou que as políticas afirmativas estabelecem algum critério ou cota, mas que isso não justifica a proibição absoluta de candidatos pertencentes a outros grupos, mesmo que majoritários.

A decisão do desembargador e corregedor-geral do TJBA suspende de maneira cautelar o edital e determina também a notificação do juiz responsável pela seleção de candidatos.

Portanto, particularmente, entendo como acertada a decisão do corregedor-geral do TJBA, que suspendeu o edital e tomou outras providências pertinentes ao ato. Entendo também que a seleção aberta pela Corte baiana para preenchimento de três vagas de estágio para estudantes de direito deve ter seu mérito administrativo, mas isso não justifica a atitude do juiz de vetar a participação de candidatos héteros, uma vez que isso configura exclusão, discriminação e racismo (art. 5º, incisos XLI e XLII, da CF).

ENCERRANDO, lembro ainda a afirmação categórica e clara do inciso I do art. 5º da CF: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. Entretanto, ao que parece, o edital tão comentado não seguiu as regras basilares da Constituição, haja vista que ignora o fato de que a igualdade de gênero é um dos pilares para a construção de uma sociedade verdadeiramente igual, justa e democrática. Daí que, efetivamente, excluir os héteros vai na contramão do texto constitucional.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Meu prezado Dr.Wilson Campos eu tive o cuidado de ler seu artigo e fui checar os termos do tal edital. É isso mesmo, o edital é excludente e discriminatório contra os héteros e ainda prestigia certos gêneros, fugindo do que recomenda a lei máxima de igualdade entre todos. Mas quem se importa, se até mesmo o Judiciário comete tamanha gafe proposital??? Estamos meu caríssimo colega em um barco sem timoneiro e sem rumo, só vendo pela frente águas revoltas. Pobre do nosso Brasil. Abração doutor e fique com Deus. José Artur V.S.

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  2. O assunto foi comentado na sala de aula virtual em que eu leciono para uma turma de especialização de direito. Os alunos debateram e o erro do judiciário baiano sofreu revezes e críticas fortes. A grita foi geral porque os héteros são maioria mas os demais gêneros pensam de uma forma bem individualista. Quando mexe com eles, a briga é certa; mas quando eles erram ou alguém erra em favor deles, eles ficam na miúda e acham pouco e bom. A desigualdade no interesse é do tamanho do preconceito desse juiz que não pensou antes de soltar esse edital absurdo e contraditório. Ainda bem que alguém desse tribunal baiano tem bom senso e suspendeu essa joça desse edital racista. Dr. Wilson Campos parabéns pelo BLOG e pelos artigos super equilibrados e lotados de cidadania. Muito bom. At: Vitória MDGóes.

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  3. Esse erro partindo de um tribunal é de chocar mesmo. O absurdo é alguém publicar isso e só depois de 11 dias alguém ver o grave erro cometido, e isso só depois de repercussão na mídia pelo que eu vi. Esse TJBA vai entrar para o folclore do judiciário. Vai ser non sense assim lá longe. Dr. Wilson Campos, dileto colega, estamos contra uma maré de um Judiciário vermelho, lento, atrasado e ativista em excesso. Parabéns pelo artigo. Saudações. Mansur Felício.

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  4. Dr. Wilson eu li o artigo do senhor e procurei o edital para ver as condições, e pelo que vi num site de um jornal, o edital é isso mesmo, discrimina os héteros e dá preferência aos LGBTQIA+. O tribunal recebeu vários comentários contra o edital e críticas de toda forma e mesmo assim não dá nem satisfação à sociedade pelo equívoco praticado em pleno século XXI. Êta justiça brasileira... Abraços doutor e gratidão. Franklin de Franco.

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